𝐂𝐚𝐩í𝐭𝐮𝐥𝐨 𝟕: 𝐔𝐦𝐚 𝐂𝐨𝐧𝐯𝐞𝐫𝐬𝐚 𝐃𝐢𝐟í𝐜𝐢𝐥

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Eu estava diante de uma penteadeira agora.

Meus dedos deslizavam por entre meus fios louros, acariciando meu couro cabeludo.

Minha imagem frouxa no reflexo revelava as marcas bem visíveis debaixo de meus olhos, consequências de meu choro recente.

Finalmente eu tinha compreendido.

Finalmente eu percebera a situação que me encontrava, como uma ninguém para mim mesma e para os outros, em outro lugar, vulnerável, solitária.

O encanto havia se quebrado.

Mesmo que meu instinto gritasse, – e eu estava inclinada a ouvi-lo – eu precisava estar prostrada firme na realidade.

"Como uma boa seelie faria, de fato" – sorri com escárnio para o espelho quando esse pensamento atravessou minha mente.

A flor de Oberon reluzia em cima do móvel, frágil e inocente. Seu brilho estava ficando opaco, graças ao tempo em que ela havia sido conjurada.

"A manipulação de glamour" – pensei. Uma tentação unseeliana que eu gostaria de experimentar algum dia. O que era estar plenamente em contato com sua natureza?

Glamour, aquele mesmo que envolvia todo o ambiente onde estava agora. Glamour, aquele que inebriava cada canto da Corte Unseelie sem nenhum pudor. Sem nenhuma moral o reprimindo.

Glamour, o cerne feérico, gerado à partir de todo e qualquer ritual de magia executado por faes.

Manipular o glamour era como manipular o refolegar de nossos pulmões, as batidas de nossos corações, cada pequeno gesto intuitivo e instintivo, movido pela sobrevivência. Era manipular à nós mesmos, em nossa mais pura e crua essência.

Toquei a ponta do lírio sobre a penteadeira, sentindo o esfarelar do glamour arder em meus dedos.

O cocegar que sempre sentia em minha pele, acompanhado do arrepio que subia por minha espinha, eletrizante, invadiu meu ser enquanto eu franzia o cenho, observando a areia fina, azulada e reluzente pouco a pouco se fundir com minha pele.

Quão potencialmente poderosos poderíamos ser, se livres?

Mas o quanto isso iria nos custar, no fim?

Suspirei, fechando os olhos e colocando a escova que se encontrava em minha mão hesitantemente de lado, levantando a palma livre e envolvendo uma nuvem suave de glamour que pairava próxima à mim.

Eu sentia seu cocegar instintivo, o ardor de sua natureza selvagem, do gosto cru da magia em minha pele, eu podia sentir aquele pulsar desenfreado e, metodicamente, tentei me conectar a ele.

Ele rodopiava em minha direção, em direção do meu eu feérico, atraído como uma fera faminta. Despudorado, energético.

Mas algo o impedia.

Maldita ascendência seeliana!

Rosnei de frustração, fechando as mãos em punho e acertando-a com uma violência até mesmo graciosa na madeira da penteadeira. Meus olhos se abrindo em seguida, diante ao bailar cósmico da poeira azulada que quase me soava debochado.

Razão.

Era ela quem me impedia, quem formava uma barreira entre mim e a essência pura do glamour.

Magia era instinto. E, quando se há instinto, não há espaço para a razão.

Arquejei, novamente erguendo meu olhar resignado em direção ao espelho, vendo ali arder, em um tom suave em minha pele, o dourado de meu sangue. O motivo que me incriminava como uma forasteira naquelas terras de rostos pálidos como a lua.

𝐀 𝐒𝐨𝐦𝐛𝐫𝐚 𝐀𝐥é𝐦 𝐝𝐨 𝐕é𝐮Onde histórias criam vida. Descubra agora