Estava quase sendo completamente fisgado e envolvido pela atmosfera de música e ritmo que quase se esqueceu que não podia se demorar ali. Caso Priscilla acordasse e não o encontrasse no hotel, ouviria uma grande bronca da qual não tinha certeza se sairia tão ileso. Aos poucos, deixou seus pés se desprenderem do local e voltou para o hotel, se esforçando para não esquecer o caminho.
Subindo o elevador, encontrou justamente Lisa e Priscilla, sua esposa prestes a ficar furiosa com ele, mas agora, aliviada por encontrá-lo.
-Eu já estava indo atrás de você - ela declarou, chegando a pôr as mãos na cintura para dar ênfase.
-Eu pensei a mesma coisa e voltei o mais rápido que pude - ele se justificou - não se preocupe, ninguém me reconheceu e eu também não falei com ninguém, eu sei que perdi um pouco a noção do tempo, mas foi por uma boa causa.
-E que causa seria essa? - ela o questionou.
-Tem uma banda ótima tocando num restaurante aqui perto, eu queria ter visto o show inteiro - Elvis contou, empolgado - tem algo interessante em acompanhar uma apresentação musical olhando do lado de fora, sabe? Sentir toda energia que a música pode proporcionar é incrível, e não ter a pressão da gravadora ou do público sobre mim deixa tudo ainda mais... aliviante? Aliviador? Não sei a palavra certa, mas é uma sensação muito boa de verdade.
-Entendi, é uma das coisas que mais fez parte da sua vida até agora - Priscilla suspirou, compreensiva - nós podemos ir almoçar nesse lugar, se você quiser, apesar que queria experimentar a comida do hotel.
-Mesmo? Por favor, vamos sair e aproveitar o sol lindo que faz lá fora - ele a incentivou.
-Um sol muito forte por sinal, eu senti o calor daqui de dentro, não é à toa que chamam o Brasil de país tropical - ela apontou, pensando se valeria a pena.
-Talvez seria melhor se fôssemos pro Rio de Janeiro, dizem que a praia lá é linda - Elvis sugeriu com um sorriso ladino, apreciando aquela ideia.
-Ah nem pensar em ir à praia, não há lugar maior pra se expor do que um lugar a céu aberto assim, em que muita gente vai - Priscilla rebateu de braços cruzados.
-Se for assim, não vamos poder sair nunca, pra lugar nenhum - ele argumentou - olha, estamos sendo discretos, estamos em outro país, estou usando um ótimo disfarce, entendo seu receio com a praia, mas talvez há outro lugar aberto que possamos ir.
-Como qual? - ela queria ouvir uma sugestão.
-Não sei, acha que tem parques aqui? - ele deu de ombros, esperando por uma confirmação.
-Eu posso olhar o guia turístico - ela compartilhou sua ideia - uma cidade tão grande assim deve ter algum parque.
-Maravilha! - ele comemorou batendo as mãos - olha, tive uma ideia, podemos ir almoçar no restaurante que eu encontrei e à tarde vamos no parque, o que acha?
-Me parece ótimo - Priscilla sorriu, satisfeita com o plano.
-Combinado - ele beijou o rosto dela, mostrando o quanto estava animado.
Assim, um tempo depois, os Presleys chegaram à pequena descoberta de Elvis, o restaurante com a banda ao vivo. A música realmente era bem animada e diferente de tudo que eles já tinham ouvido antes.
Mesmo enquanto comiam, Priscilla percebeu a mão livre de Elvis tamborilando os dedos por cima da mesa, tentando acompanhar o ritmo diferente. Ela apenas sorriu enquanto observava, e um instante depois ele percebeu, o que o fez sorrir de volta.
Terminando a refeição, se dirigiram para o parque, usando um jeito bem inusitado. Talvez fosse o jeito mais rápido que poderiam chegar ao parque do que enfrentar engarrafamento de carro. O metrô era o meio de transporte mais popular da cidade e, mesmo esperando um amontoado de gente, resolveram experimentar. Era meio amedrontador, mas emocionante ao mesmo tempo. Estar no meio de tanta gente ajudava a se camuflar e passar despercebido. Sentaram-se um ao lado do outro, tentando se manter no lugar, mesmo sentindo o vai e vem do trem. Desceram no seu destino final, vislumbrados em como aquela selva de pedra tinha tanto verde no meio dela.
O parque de nome indígena, Ibirapuera, difícil de ser pronunciado por falantes nativos de inglês, era enorme e tinha muitas coisas que chamavam a atenção dos olhos dos Presleys. Tentaram vasculhar tudo à sua volta enquanto caminhavam. Apesar de cheio, as pessoas estavam espalhadas por ali, tendo o seu próprio momento de lazer, sem se importar com os outros. Por isso, a família conseguiu caminhar tranquilamente. Observaram as árvores e até mesmo a grama que era um pouco diferente do que estavam acostumados em casa. Lembrar de casa fez Elvis suspirar, pensando quando poderia voltar para Graceland.
-Está tudo bem? - Priscilla quis checar ao perceber sua melancolia repentina.
-Sim, eu estou só pensando em algumas coisas, pensando no quintal de casa - ele explicou - faz um longo tempo que não vejo, apesar de estar amando estar aqui, e querer conhecer outros lugares, é como diz o ditado, não há lugar como o lar.
-Entendo, vamos estar lá em breve, prometo - ela se comprometeu mais uma vez, passando um braço ao redor de sua cintura, um gesto de apoio.
Antes que conversassem mais sobre isso, Lisa correu para a frente, o que deixou seus pais atentos à ela, vendo que ela parou em frente a uma enorme estátua. Não sabiam exatamente o que ela significava, mas devia estar relacionada à história do Brasil. O homem de chapéu montando o cavalo na frente, com um bando de outras pessoas atrás dele, e os do fim da fila empurrando uma canoa.
-Isso é curioso - Lisa comentou, quando os pais se aproximaram dela.
-Concordo, não sei exatamente o que quer dizer - Priscilla respondeu a ela - tem algum palpite, meu amor?
-Hã, podem ser conquistadores, desbravadores do desconhecido - Elvis ponderou - ou os povos nativos, seguindo um novo líder.
-Talvez a colonização do Brasil foi parecida com a dos Estados Unidos, os dois países fazem parte da América - apontou Lisa, lembrando de suas aulas de história.
-Muito bem, tão esperta a minha pequena! - seu pai afagou sua cabeça - é muito louco pensar que esses homens saíram da casa deles, sem saber se iria dar certo o que tinham em mente e agora ficaram imortalizados por estátuas? Com seus nomes lembrados até hoje?
-Improvável eles pensarem nisso, talvez quisessem um pouco da fama e da glória, só não achavam que podiam chegar tão longe, provavelmente - Priscilla compartilhou sua opinião sobre o assunto.
Havia um subtexto pessoal naquela conversa sobre fazer algo marcante que seria lembrado muito tempo depois percebido e sentido por Priscilla. À essa altura, Elvis tinha "morrido" a quase um ano e em Graceland, as homenagens não paravam de chegar e aparecer nos portões da mansão. Até mesmo na viagem, longe de tudo aquilo, tinham vistos menções sutis a ele. Seu trabalho podia ter sido algo que Elvis tinha deixado pra trás, mas que com certeza tinha marcado seu tempo. Talvez não como os homens representados na estátua que admiravam, mas com um significado relevante a muitas pessoas, certamente.
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Uma armadilha de memórias
FanfictionUm descanso merecido, uma reconciliação e uma ideia maluca. Tão maluca que funcionou durante muito tempo, até não funcionar mais. O prisioneiro das memórias vai ganhar uma liberdade não sonhada e terá que lidar com as consequências de seus atos.