Iniciativa Burrows

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Saindo dali, coube ao trio conspirador colocar seu plano em prática. Cada um com uma função específica, mas muito importante para que o plano funcionasse de verdade e com toda a eficácia que uma empreitada dessa necessitava.

Jerry e Priscilla providenciaram o boneco, se certificando que ele era muito parecido com o original, de maneira que chegaram a se espantar com a riqueza de detalhes, parecia um trabalho digno de Madame Tussauds. Billy encontrou um conhecido de um conhecido distante que sabia de alguém que podia ajudar com o corpo necessário para manter o convencimento.

Com tudo arranjado, em 16 de agosto, Priscilla foi a primeira a convocar a mídia, ligando para um jornalista específico que tratou de logo espalhar a notícia. Elvis Presley tinha sido encontrado morto em seu banheiro em Graceland. Ainda não se sabia exatamente o motivo para tal, mas os legistas logo iriam averiguar.

Foi como acender a pólvora de um barril, com as coisas se alastrando rapidamente. Todo jornal, rádio e televisão anunciava a morte do grande astro, enquanto que ele mesmo via a repercussão de tudo isso da TV de seu quarto na casa de repouso. Era o sinal que precisava para sair do local. Todo aquele alvoroço deixava as pessoas ocupadas demais para notá-lo. O médico autorizou sua partida e ele se aprontou para sair, esperando por Jerry, seu fiel escudeiro. Schilling observou seu velho amigo e teve que apontar o erro claro da fuga, muito exasperado.

-Você só pode estar de brincadeira comigo, não é? - Jerry o encarou, sem muita paciência - não pode sair por aí vestido assim.

Elvis não entendeu o que ele queria dizer a princípio, inspecionando o próprio conjunto de terno, com a camisa aberta até a altura do peito, como o habitual.

-Você é um homem morto agora, esqueceu? - disse seu velho amigo, apontando o que até então parecia ser óbvio - não pode parecer com você tão obviamente, vai causar desconfiança que é justo o que não queremos.

-Bom, tem muitos imitadores de mim por aí, faz de conta que eu sou um deles - o fugitivo rebateu.

-Não, nada disso, vamos arrumar outras roupas pra você - o amigo o apressou a fazer o que era melhor para o plano.

Jerry o vestiu de forma modesta, de modo que não chamaria atenção. Ele o observou embarcando no avião sozinho, torcendo para que tudo realmente desse certo. Depois de chegar à Argentina, Elvis se hospedou em um hotel também pequeno e que ficava num bairro remoto. Toda aquela adrenalina parecia ter passado quando se deu conta do que tinham feito. Era realmente um fugitivo, e ali naquele lugar, distante de tudo e de todos, dava-se a impressão de que realmente tinha sido bem sucedido. Ninguém ali parecia ter a remota ideia de quem era Elvis Presley. 

Enquanto isso, Priscilla lidava com o que julgava ser o mais difícil de tudo até então, aparecer para as câmeras parecendo realmente triste. Conforme ela foi organizando tudo que dizia respeito ao funeral e se arrumando para atender ao evento infortúnio, uma tristeza genuína foi tomando conta dela, saber que tudo aquilo, todo aquele teatro armado era porque não deixariam o homem que amava em paz caso ele ainda estivesse vivo, a deixava arrasada. Ainda assim, havia a apreensão de serem descobertos a qualquer minuto e ter certeza de que o plano realmente tinha dado certo. 

Ela decidiu por bem não envolver Lisa Marie em nada daquilo, era complexo demais para uma criança entender, além disso, ela pretendia contar a verdade à filha, de modo que ela entendesse que o pai ainda estava vivo, tendo a presença dele em sua vida, só que isso agora era um segredo que a família teria que guardar a partir de então. Segredo esse que tinha sido a decisão final dos Presley.

Agora era tarde demais para voltar atrás, estava tudo pronto, e Priscilla encararia isso de frente, como sempre fez desde que tinha escolhido se casar com Elvis. As multidões em procissão se aproximavam de Graceland, todos tristes e ávidos para prestar o que pensavam ser suas últimas homenagens ao astro do rock. Priscilla decidiu ficar ali por perto do caixão, o rosto falso, mas que se passava por real, estava destacado à luz do sol. Ela olhou para ele por um breve momento, o que a deixou triste outra vez, sua mente brincava com sua percepção, estava vendo Elvis morto, quando ele de fato não estava, escondido pela América do Sul a uma hora dessas. 

Os cumprimentos de pessoas queridas a tiraram um pouco desse tipo de pensamento, não deixando que ela se perdesse e a fizesse se concentrar no momento presente. Uma coisa era certa no meio de toda aquela comoção, seu marido era um homem muito querido, que tinha marcado a vida de muitas pessoas fazendo o que amava. Com esperança, Priscilla deu um suspiro, esperava que ele pudesse se encontrar sendo diferente de tudo isso, se encaixando na vida pacata que tinha escolhido a partir de agora.

Acompanhando o enterro, suas fortes emoções tomaram conta dela e ela deixou se desmanchar em lágrimas, o que comoveria a todos. Mas o que passava em sua mente era muito mais profundo do que apenas convencer uma plateia, pensava se não tinha sido uma tola por ter se apaixonado por um verdadeiro astro, um homem talentoso e charmoso, cobiçado por todas as moças, rodeado de fama e glória, um mundo glamouroso do qual ela nunca teve a intenção de fazer parte e agora fazendo algo completamente arriscado e criminoso pelo bem dele. Havia um amor tão grande assim que justificasse tudo isso? Talvez o dela fosse o único amor verdadeiro que ele poderia encontrar no meio de toda a glória que recebeu. Esse amor, concluiu Priscilla, tinha que ser seu motivador para ir até o fim.

O dia tinha sido longo e melancólico, mas finalmente havia passado. Ela se deixou desabar na sua velha cama, que compartilhava com Elvis, procurando um pouco de sossego, o que era o verdadeiro motivo de tudo aquilo. Paz e sossego.



Uma armadilha de memóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora