Pai, queria poder dizer que sinto muito pela sua partida, mas estaria mentindo.
Pai, queria poder dizer que chorei quando te vi morrer, mas seria falso.
Pai, queria poder dizer que senti dor quando presenciei seu último suspiro, mas estaria me enganando.
Pai, queria poder recontar histórias divertidas de nós, mas então teria de inventar tudo.
Pai, queria poder lembrar de ti como o homem carinhoso que me pegava no colo e cantava cantigas para me acalmar quando acordava assustada de um pesadelo, mas estaria me iludindo.
Pai, queria poder dizer que aprendi a amar contigo, mas seria somente mais uma mentira.
Pai, queria poder dizer que você nunca me feriu, mas como posso esquecer que em seus últimos instantes de vida estava sendo chutada por ti? Como posso esquecer de todas as palavras duras que já usou contra mim?
Pai, queria poder dizer que nunca chorei por sua culpa, mas é impossível ignorar a dor pungente que sinto todas as vezes que penso no quanto você me fez sofrer.
Pai, queria poder dizer que pensar em ti traz um sorriso para meu rosto, mas de mentiras já basta a vida que levei contigo.
Pai, queria poder dizer que sinto sua falta, mas não quero nunca mais desejar um monstro em minha vida.
Pai, sinto muito por ter me livrado de ti, mas foi a única maneira que encontrei de permanecer viva. Numa realidade em que um pai tortura a própria filha não há muita escapatória diante da violência.
Por fim, Icarus, queria poder te chamar de pai sem sentir o amargor da mentira na boca. Mas aqui somente uma verdade resta e é a de que você nunca foi meu pai e nem nunca será.
Até nunca mais.
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Um desafio de escrita perdido pelo tempo e espaço
RandomUma coleção de pequenas histórias não relacionadas dentro de temas de desafios diários que era pra eu ter completado, sei lá, em 2019 e não deu, então cá estou passando a limpo pra ver se encontro ânimo em algum canto perdido em mim pra continuar a...