Capítulo 2

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A menina parou de olhar o céu, acredito que ficamos alguns bons minutos assim, talvez uma meia hora. Ela olhou os carros passando longe e riu

-Ele era vermelho, eu gosto de carros vermelhos

-Eu gosto de carros pretos

-Mas eles são tão comuns!

-E carros vermelhos chamativos!

-Sabe, talvez na vida, não há lugar para o comum, acho que isso a torna sem graça, por isso prefiro carros vermelhos, são lindos!

-E exatamente por serem lindos, são fáceis de serem roubados.

-Você pensa como adulta, credo, ninguém gosta de adultos sem sal, opte pelo vermelho!

Nesse momento ela parecia mais adulta que eu, me permiti rir e ela sorriu com seus olhos brilhantes para mim.

-Sua risada, é bonita

-É estranha!

-Talvez o estranho não seja comum e é isso que torna você uma adulta menos sem sal. Eu gosto da sua risada.

Ela desce do banquinho e sai andando, eu acreditava que ela ia pra casa, mas ela me olhou como se fosse aprontar, então a segui, ela sente o vento passar em seus cabelos e ri, e finalmente começa a correr entre os postes e ir pra um lugar muito além, e com certeza fora do caminho de casa e da minha também, eu só precisava levar ela na delegacia, essa menina com certeza tinha algo de estranho, muito muito estranho, ela olhou vitrines diversas e parava pra ver tudo, tudo, e admirava com maior empolgação, falava de memórias e coisas vagas, falava sobre músicas, e coisas fajutas de lojinhas de centavos, e no fim chegamos aonde ela queria chegar. Um parquinho, não um parque como estávamos, um lugar de adultos, estavamos na zona infantil, perto de um residencial, não sei de quem, mas com certeza não era o dela e nem o meu.

-Amo parquinhos meu pai me levava para um igual esse

-Eu odeio, por esse mesmo motivo, você não disse dos tons azuis do seu pai?

-Eu deveria odiar ele, mas bem, se eu tenho uma memória intacta, por que deixar ela ser arruinada por outra tela? A tela que ele pintou errado foi amor, e não dessa lembrança, essa lembrança ainda deve e vai continuar boa, eu me diverti nela, e nem me lembro dele quando venho aqui, sinto vazio muito vazio, mas ainda amo me balançar.

-Eu te admiro por isso, eu sinto enjoo sempre que penso...

-Admirar é distante, Se quer falar que me admira, fala que SENTE admiração por mim, palavras nunca vão substituir sentimentos, sinta, você disse que queria

-Eu não aprenderia isso em uma hora

-Bom você só aprende tentando, e dentro dessa uma hora, você nem tentou sentir o vento afagar teu cabelo, ou o cheiro das flores, as pessoas só aprendem os perfumes das flores com perfumes, eu assumo que tenho medo de abelhas e por isso nunca chego perto, uma certa vez uma me picou e doeu tanto, que tenho medo, mas eu gostaria de tentar um dia, sinto isso com tantas coisas

-Eu sinto isso também, medo

-É a primeira coisa que todo mundo sente acho, não sei, não acho que a primeira emoção de um bebê vindo ao mundo seja felicidade, acho que é medo, é tudo novo, estranho, medonho, e bem seus pais tem medo de nunca mais dormirem de novo depois que nasce também, o primeiro sentimento vai ser medo, e acho que por isso os outros sentimentos acabam vindo depois, pois tudo tem e deve ser maior que o medo, acho que por isso que o que os pais sentem, ou deveriam, quando a criança é pega no colo é amor, acho que o amor, deve vencer tudo.

-O amor não basta

-Bom o do outro talvez só, não, mas todo tipo de amor salva, eu só acho que tudo que me nomearam com amor é errado

-Eu nunca vivi o amor

-Você nunca viveu, ou não quis viver? Ou melhor não quer ver? Eu sei que o que me deram não foi amor, mas eu juro, eu estou tentando entender qual o tom do amor, acho que você deveria tentar entender comigo!

E nesse momento eu parei de pensar em delegacia, talvez o amor realmente tenha um tom... E ele não seja nem de longe azul. Ou preto. Escuro e nem obscuro, talvez ela tenha razão.O amor TEM que ter um tom. A curiosidade se espalha por mim e um grande foda-se sai de minha boca, ela olha indignada que uma adulta falou algo assim e depois continua andando, entre as árvores que caem, e não entenda errado, as árvores que caem são só as folhas que se desbruçam mais a abaixo que se ficassem presos em galhos, e por algum motivo eu sei que gosto delas, e o vento bate em meu rosto e eu tento sentir, algo, ou alguém, mas sinto só o frio, acredito que talvez, fosse um bom começo.

Qual o Tom do Amor?Onde histórias criam vida. Descubra agora