Qual o Tom do Amor?

Capítulo 4

A garotinha andou muito muito além do que pensei que iríamos, e no final não chegavamos a lugar algum

-Onde vamos?

-A lugar algum

-Não podemos parar ?

-Não!

-Por que?

-Ainda não podemos

Continuávamos andando e olhando as diversas paisagens, no fim ela parou, ainda em lugar nenhum, em lugar indefinido, era uma trilha de trem muito além da cidade

-Eu gosto da paisagem daqui -A garotinha disse sentando-se à beira da trilha

-Eu gosto de trens, mesmo nunca andando em um, sempre adorei fazer metáforas sobre eles, caminhos e fumaça, cargas e passageiros- Sentei-me ao lado dela- Quando pequena eu tenho uma memória, de deitar ao lado de minha mãe e contar a minha primeira analogia, faz tanto tempo que não crio analogias

-Conte

-A vida é como um trem de certa forma, quando pequenos não podemos guiar ele, mas conseguimos encher a carga de memórias e alguns passageiros, e as fases da vida são estações ,com o tempo trocamos a estação e bom, em uma delas, pegamos a guia do trem, e tomamos controle da nossa vida,temos que deixar algumas memórias e pessoas para trás, pois o peso do trem pode sobrecarregar e bom, o caminho do trem não será leve, e o caminho não será o melhor. Não era perfeita, mas eu gostava da analogia, pessoas são passageiras, e memórias cargas, carregadas no fundo do nosso ser, e quem pode e deve tirar elas são apenas nós, ao menos as memórias.

-Você se permitiu refletir e sentir. E o que sentiu quando disse isso?

-Tons marrons, saindo do trem.

Ela sorriu e me fez pensar, quantos tons eu senti bem antes de verde? Quantas memórias deixei escapar entre os dedos com medo de simplesmente ser eu?

-Eu gosto daqui, pois nomearam de lugar nenhum, é vazio-A garotinha disse- Mas em todo lugar sem significado, alguém virá e sentirá que ele significa um universo inteiro, gosto de pensar que tudo pode ser assim, até pessoas, sempre haverá aquelas que todos dirão que não terão significado algum, mas alguém olhará aqueles olhos e sentirá, todas as estrelas brilharem neles e aquela pessoa, virá de uma interrogação perambulante, uma grande exclamação exuberante. Lugares ressaltam memórias, e sentimentos, lugares podem nos fazer sentir distantes e em casa, ou os dois, eu me sinto assim aqui.

-Eu acho que eu também...

A menina sorriu de novo pegou com suas pequenas mãos na minha mão e novamente sorriu seu sorriso banguela e olhou a estrada de novo, e como num passe de mágica um trem passou em nossa frente, e senti um vento e um medo subir a espinha e depois de todo barulho rimos, alto, pois agora, ele já não era mais vazio, não mais. Não para nós.