Capítulo 10

209 13 9
                                    

- Julie -

Encarava o rosto dele.

Dormia com a boca aberta e peito para cima. Ele é espaçoso. Nem parece que vive emburrado por aí.

Segurei o seu maxilar, apertando sua bochecha, forçando seu rosto a virar em minha direção. O Pinscher acordou um pouco desnorteado, piscando de maneira exasperada se acostumando com a claridade.

Dei um tapa leve para ajudá-lo e voltei a apertar as suas bochechas.

— Por que está fazendo isso? — falou com dificuldade porque seus lábios formavam um biquinho com o meu aperto.

— Achei que não acordaria nunca.

Ele segurou o meu pulso e afastou a minha mão. Não entendia aquele olhar dele. Acomodou melhor sua cabeça no travesseiro, franziu o cenho e soltou um sorriso torto, um tanto quanto sugestivo.

— Bom dia, Princesa.

— Alguém teve uma noite boa.

Ficamos nos encarando por alguns segundos. Soltou meu pulso e se virou novamente com a barriga para cima.

— Por que fez tudo isso? — perguntei.

— O quê?

— Foi você quem comprou a bebida da outra festa, né? — ele não respondeu — A festa de ontem foi para mim? — ainda sem resposta, ele apenas encarava o teto com a mão em cima daquele tanquinho ridículo. Ok, ele é gostoso — Espera... o vestido, o sapato, a coroa... o bilhete. Foi você tudo isso. Por quê?

— Me responda uma coisa e eu te digo o porquê — a voz dele era calma, mas firme.

— O quê? — perguntei baixinho, incerta do que viria.

— O que te chateou naquela ligação de ontem a noite?

— Ah... — engoli em seco. Ele se virou de lado e me encarou com cuidado — Era só a governanta me ligando para dar parabéns.

— Não gosta dela ou é pobre demais para telefonar pra você?

O encarei com um certo receio, mordi o lábio e seus olhos caíram para a minha boca. Ergui o queixo dele para que voltasse a atenção em mim.

— Eu perguntei para ela dos meus pais e ela disse que já estavam dormindo. Nenhum dos dois fizeram questão de lembrar o dia que nasci, igual é todo ano — a minha voz embargou, deixei o meu olhar cair para a ponta do meu cabelo em cima do travesseiro — A governanta é legal, um pouco brega mas ela ficava comigo quando eu era pequena... eu não sei porque estou falando tudo isso — balancei a cabeça para afastar alguns pensamentos.

Agora foi ele quem ergueu o meu queixo para alcançar seus olhos, sem prolongar o toque, recuando sua mão para debaixo do travesseiro.

— Dois dias antes do meu aniversário de dez anos, a Emma estava limpa há alguns meses. Ela prometeu comprar um bolo com vela. Eu teria o meu primeiro aniversário de verdade — ele sorriu fraco — Eu fiquei bem ansioso — fez uma pausa — Quando chegou o dia, eu acordei e ela não estava em casa. Achei que a Emma tinha ido comprar o bolo.

Piscou várias vezes, incerto.

— Continue — pedi baixinho.

Respirou fundo.

— Arrumei toda a casa como eu fazia sempre, vesti a melhor roupa que encontrei dentro do armário que na verdade era um lixo. Eu lembro que na época eu guardava para me vestir em ocasiões como a visita trimestral da assistente social e essas merdas. Depois de deixar tudo pronto, sentei no sofá e esperei, esperei, esperei... mas nada. Acabei adormecendo...

SUMMEROnde histórias criam vida. Descubra agora