Capítulo Quatro

61 6 193
                                    

Abro os olhos devagar, a sensação que tenho é de conforto, tem alguma coisa embaixo de mim que me proporciona isso, o que é bem discrepante das dores no meu corpo. Onde estou? Tenho a impressão de que o rosto tem o triplo do tamanho, é fruto dos golpes que recebi nele.

Não posso dizer que fico alegre em saber que sobrevivi, não depois da humilhação que sofri de perder para um humano qualquer. Ao mesmo tempo, parte de mim tenta ver como uma segunda oportunidade de ser relevante na guerra de alguma forma.

Aos poucos, os olhos vão se adaptando à luz forte do ambiente, uma luz natural que entra pela janela do cômodo, trazendo consigo um ar que mistura o frescor com o calor. Só quando ligo os pontos e entendo que não deveria estar num lugar tranquilo é que levo um susto, e junto a isso, o som de uma porta se abrindo me faz pular de onde estou para o chão. Todos os meus ossos protestam em dor, e o estômago dói como se tivesse sido rasgado por dentro. Ao tocar o pé no piso de madeira, sinto a fincada se distribuir por toda a perna, e por isso, perco o equilíbrio, tendo que me agarrar ao colchão. Terei sorte se não tiver pegado uma infecção por conta de toda a lama que entrou em contato com as feridas no meu corpo.

Os passos de alguém ficam mais fortes, eu e uma garota nos entreolhamos, ambas com as órbitas bem expostas com a surpresa. Olho para os lados, em busca de qualquer coisa que me ajude a eliminar a jovem loira. Parando para pensar e julgando por suas roupas casuais, talvez eu seja a invasora, mas não importa. Pego o abajur ao lado da cama e atiro em direção ao seu rosto, e por um triz, ela escapa de ser atingida. A garota grita assustada e corre para a saída. Me levanto com certa dificuldade, mal consigo me equilibrar, porém mesmo assim vou atrás. Reúno toda a minha força enfraquecida para pular em suas costas e derrubá-la no chão usando meu peso. O baque acontece, a dor que sinto é com certeza maior que a dela.

Antes que ela possa tentar qualquer coisa, eu a imobilizo com uma chave de pernas desajeitada e roubo um cobertor nos pés da cama em que estava deitada para envolver em seu pescoço. A moça murmura muitos palavrões, porém não me dou ao trabalho de prestar atenção, já que escuto mais alguém rangendo a madeira com os passos no corredor além do quarto.

– Pai! Me ajuda! – a jovem berra enquanto decido dar um nó que prende seus pulsos e o pescoço à madeira que sustenta a cama.

Sobre uma escrivaninha, visualizo uma faca pequena de cortar pão ao lado de um amontoado de torradas num prato e um copo de leite. Não é adequado para a situação, mas vou apostar nas minhas habilidades de intimidação. Pego a lâmina e coloco sobre o pescoço da adolescente no exato momento em que um velho cruza a porta.

– Não se mexa! Ou ela morre! – ordeno. – Onde estou?

O homem me encara quieto, mas asquiece à minha ordem.

– Não queremos te fazer mal, só queremos ajudar – ele ergue as mãos, pedindo calma.

– Pode começar dizendo onde estou! – Vocifero.

Sinto um sutil movimento da moça na minha frente, o que é suficiente para eu apertar a lâmina contra sua pele.

– Faça isso de novo, e eu cravo essa faca na sua garganta.

– Você está na minha fazenda – o senhor diz, consertando seu chapéu tipo country na cabeça. – Deve estar confusa, mas...

– Não estou confusa, estou furiosa! Vocês me trouxeram pra cá sem meu consentimento! – blefo.

– Você tava quase morta, trouxemos você até aqui e cuidamos dos seus ferimentos. Dizer "obrigada" não vai machucar – a loura na minha frente resmunga.

Não consigo lembrar direito o que houve, tudo que me vem à memória é que depois que caí, acordei e vi que estava sendo levada pelas águas. Nadei para a margem e caminhei floresta adentro por algum tempo. Lembro de ter visto um lago, porém, por estar fraca demais, apaguei novamente.

Império dos Três: Capítulo FinalOnde histórias criam vida. Descubra agora