Capítulo Nove

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"As únicas coisas que podem levar uma Princesa à derrota são seus sentimentos. Prepotência, arrogância. Orgulho. Soberba. Um mal invisível, que nos afasta da pureza, da Singularidade. O maior inimigo de uma Guardiã é ela própria" , o discurso ecoa perturbado na mente e isso me faz repensar as minhas ações desde que cheguei na Terra. Todas, ou a maioria, foram contrárias ao que me foi ensinado. Por essa razão fui tão humilhada.

A cabeça dói, mas é a menor das preocupações, ergo o rosto, abro apenas um olho, e a luz do ambiente fere minha pupila. Escuto vozes embaralhadas, não sei o que está acontecendo. Ao menos, posso respirar, embora o ar esteja impregnado de poeira, que me faz querer tossir. Pouco a pouco, alguns dos ferimentos parecem sumir, mas eles são tantos e tão intensos que o processo é lento. Recordar o momento que me fez chegar aqui tira todo meu ânimo. Como pude perder assim?

"Lute contra você mesma, não deixe que seus desejos a possuam. Lembre-se do que representa", mais uma vez, escuto lições que me foram passadas, quando ainda era uma aprendiz.

Uma tosse – agora profunda e dolorosa – toma a garganta, entretanto é de grande ajuda, pois alguma coisa sólida é expelida através da boca. Ao tocar os dedos no chão, a ardência toma conta, é um sinal de que eles ainda estão em carne viva. Só o que consigo perceber pelo tato são escombros.

– Ben... – é tudo que consigo explanar, na vã expectativa de me conectar de alguma forma.

O chiado no ouvido, junto a sensação de entupimento diminui exponencialmente, menos dores me perturbam. Mesmo fraca, arrisco abrir os olhos de novo. O mundo ao redor é um grande borrão tortuoso, entalhado por silhuetas imperfeitas que falam.

– Deve valer uma boa grana – a audição – agora limpa – entrega a informação do que está sendo dito.

– Não deveríamos acabar com isso? Não ouviram o noticiário? Só pode ser ela – uma voz masculina carrega receio.

Fecho os olhos novamente, percebendo que estou em perigo, concentro toda minha energia para me curar, o coração salta no peito com a urgência, vão me matar. Enquanto imploro minha mente para adotar o foco total, uma conversa acalorada acontece, um lado opta por me pegar viva, confiando que condição social, e consequentemente, financeira, seja elevada. Em dado momento, alguma coisa metálica pressiona minha garganta, depois a testa, ambas sensíveis ao toque. É impossível não reagir, as sobrancelhas franzem.

– É isso. Vamos finalizá-la aqui e entregar seu corpo ao estado.

– Ficou louco? E se eles a quiserem viva? Vamos perder tudo! Podemos ser acusados de traição, Ed, traição! – Ao total, conto três vozes distintas que se manifestam contra a que fala.

Aperto ainda mais os olhos, num esforço extra de dar mais atenção à minha tarefa. A ansiedade se torna cada vez mais palpável conforme o perigo vai escalonando, fica difícil respirar, e dessa vez não é por conta de uma obstrução. Para minha sorte, uma briga se inicia, o que me ajuda a ter mais tempo, as fincadas no peito desaparecem. Aproveito para girar a perna, colocando-a no lugar. A dor é muito forte, mas não o suficiente para me tirar do controle, não grito, solto apenas um gemido, preso às pressas na garganta. Funciona como no meu treinamento de Princesa. Com toda a confusão, passos desordenados, baques e ofensas se elevando de tom, nem vão me ouvir mesmo. Alguém pega algo metálico, e atinge outro, tenho certeza, o som ressonante é inconfundível.

Apesar de não estar cem por cento, concluo que todas as feridas fatais foram minimamente tratadas, e com isso, abro os olhos e me ponho de pé, lutando bastante para não cair, estou zonza. Os três homens, que derrubaram o quarto, direcionam sua atenção para mim, com o pânico espalhando em suas entranhas. Eles congelam alguns instantes, sem saber ao certo como proceder, ou talvez estejam apenas assustados com meu aspecto físico deteriorado, posso perceber que a pele do meu nariz não foi devidamente reconstruída. Um deles segura firme um pé de cabra. Antes que pense em fazer algo, minhas forças esvaem, a mão tem que apoiar no que sobrou da parede do prédio em ruínas.

Império dos Três: Capítulo FinalOnde histórias criam vida. Descubra agora