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Baby, eu vou embora,
E eu nunca vou voltar para casas,
Eu serei seu fantasma pessoal,
Quem assombra seus sonhos,
Porque baby, foi o que você fez comigo.
What You did to Me – Stella and the Storm

Nicoletta

Anos atrás, em todas as férias de verão, eu desejava que o tempo congelasse.

Parecia pouco o tempo que sobrava para aproveitar os dias de sol, então nada mais fazia sentido na cabeça de uma jovem de seis anos do que apertar as mãozinhas uma contra a outra, orando para Deus que permitisse essa benção.

Contudo, o desenrolar era completamente diferente do esperado. Quanto mais implorava aos céus, mais veloz os ponteiros giravam. Com um piscar de olhos, eu já estava dando adeus aos dias quentes, voltando a rotina escolar complexa.

Há muito tempo que essa sensação de suplica não surgia em meu âmago.  Até o período em que uma aliança fora colocada em meu dedo.

Os dois meses seguintes ao anúncio do casório voaram da mesma forma que os dias de verão daquela época. No entanto, diferente de outrora, diversas coisas mudaram no meu cotidiano. Agora, a atenção de toda a famiglia estava voltada para mim; as minhas ações, falas e trejeitos.

Todos os olhares encontravam-se sobre mim. Passei a me sentir como um rato de laboratório, sendo observado pelos pesquisadores após receber uma dose do remédio que supostamente cura o câncer.

Muitos me passavam a sensação de quem esperava a minha falha, outros pareciam observar cada passo que eu dava. Qualquer gesto ou palavra utilizada sem pensar podia gerar uma fofoca desnecessária.

Nunca me esquecerei do dia em que começaram a dizer eu estava grávida e essa era a razão pela qual Matteo casaria comigo. Segundo os burburinhos, o Capo ficou sensibilizado com a pobre criança em meu ventre e decidiu assumir o bebê. Isso tudo só porque, em um evento da Calábria, coloquei a mão na barriga sinalizando a Bordieri que encontrava-me cheia.

Como se não bastasse, por ser a futura esposa do líder da Calábria, qualquer inimigo dos Coppola poderia se achar no direito de enfiar uma bala no meio das minhas costas. Assim, foi comum ter soldados indo e voltando da minha casa, 24 horas por dia.

Dessa forma, me tornei refém de uma rotina bem incômoda.

Só me era permitido sair de casa acompanhada por um dos soldados.

Qualquer pessoa que entrava lá em casa deveria passar por uma inspeção minuciosa. Encomendas estavam incluídas nesse processo.

Ninguém poderia ter acesso a minha agenda de compromissos.

Comidas precisavam ser provadas antes de que eu pudesse comê-las. Nem que se tratasse de um bala Juquinha.

Foi um saco.

Teve até uma determinada semana que Frederico Bordieri ficou encarregado da minha segurança. Prometi três garrafas de Aperol para que me dissesse o motivo por trás daquele alvoroço, porque somente o casamento não podia ser.

Descobri dessa forma o problema que a 'ndrangheta estava tendo com os mexicanos. Pelo visto, Matteo tinha ido pessoalmente a Guadalajara para resolver uma situação não tão legal com nossos fornecedores.

Não sei exatamente o que desenrolou dessa viagem do Capo, mas os soldados ficaram claramente mais tensos nos dias subsequentes, só voltando a relaxar dois dias antes da minha formatura.

E falando na cerimônia, quase tive um surto quando recebi dois arranjos de flores gigantescos, na porta de casa. A vizinhança inteira parou para olhar as duzentas flores sendo espalhadas pela sala de casa enquanto eu lia o cartão do Capo desejando-me sucesso e felicidade.

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