PRÓLOGO

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E assim como amor

É atemporal

São as histórias

Relembradas

No vendaval¹ da vida

Lá estava eu, sentado no mesmo banco, da mesma praça, tentando alimentar alguns pombos e pardais, que batalhavam na conquista de alguns pedaços de pipoca.

Dividia minha atenção entre o céu azul e com acanhadas nuvens, pensando até quando duraria aquela tarde ensolarada em pleno inverno e com as raras pessoas que passeavam por ali.

Estava tão longe de casa e sem vontade alguma de voltar. Queria continuar ali, sentado, deixando que o sentimento de autopiedade e solidão tomasse conta da minha alma.

Eu já não era mais o mesmo. Me sentia dez anos mais velho e a cabeça totalmente vazia.

O que está acontecendo comigo? Por que estou fazendo isto comigo mesmo?

Era o que eu mais repetia. E estas palavras batiam como um martelo contra algo macio dentro da minha cabeça.

Minha atenção se voltou para os pássaros. Os pombos estavam levando a melhor. Eram maiores e mesmo que em número menor, não permitiam que os pequenos pardais se aproximassem do alimento.

Senti um ímpeto de afastá-los e deixar que os passarinhos também se banqueteassem.

Suspirei, olhando o céu num azul brilhante. Tive que usar a mão para proteger meus olhos.

— Um belo dia para escrever...

Foram as únicas palavras que consegui pronunciar, mesmo que tivessem saído meio sem sentido.

— O que aconteceu com minha vontade de escrever?

Baixei os olhos, sentindo aquela velha náusea subir pelo meu esôfago, me consumindo. Eu sabia o que tinha acontecido. Medo.

Um medo incontrolável de sentar em frente ao meu velho e obsoleto notebook e extravasar meus sentimentos e emoções. Elas estavam todas lá. Gritando pela chance de emergir e se deixar voar com uma migalha de mim, no céu de brigadeiro.

Assim como os pardais, totalmente alheios aos meus suspiros, era a minha mente.

Os pardais...

Eles eram tão corajosos. Pensei. Enfrentavam aquele exército de gigantes emplumados, sem arredar o pé.

Que resiliência era aquela que movia estes pequenos e frágeis passarinhos? As pessoas não prestavam muita atenção a eles. Praticamente viviam à margem da sociedade, mas lá estavam eles. Independente de tudo e todos, continuavam com suas vidas passarinheiras, voando e pousando. Pousando e observando.

Assim eu estava, quando o primeiro chegou até mim.

Ele chegou do nada e se sentou do meu lado. Nos olhamos por um momento rápido me vi cumprimentando aquele estranho, que me sorriu.

— Oi, tudo bem?

Ele era um negro alto, com olhos castanhos muito claros e um belo sorriso. Me deu oi, de uma maneira tão gentil e estranhamente familiar, que me vi retribuindo com um sorriso tímido e desajeitado.

— Você é escritor, não é mesmo?

Baixei meus olhos, sentindo as orelhas arderem. Não conseguia me ver como um, mas um estranho, que nunca vi na vida e com sotaque estrangeiro, sentar e me fazer aquela pergunta, me desconcertou.

Eu era? Deveria dizer sim? Mas, eu não me sentia como um. Então, não; eu deveria dizer não, amigo. Você está enganado.

— Você escreve, não?

CONTOS ACRÔNICOSOnde histórias criam vida. Descubra agora