Quarto conto: Ayubu

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AYUBU

Ayubu estava voltando da escola com seus seis irmãos. Era o oitavo de dez filhos de Nala, sua mãe e seu pai Dyami. Os outros dois irmãos mais velhos eram casados e moravam na capital e os três menores não tinham idade para ir até a escola, ficava a 10 km de onde morava, em Kissama¹, Província de Luanda.

O que ele mais adorava fazer era chegar da escola e repassava para a mãe tudo que aprendia, pois sonhava em ver a mãe alfabetizada. Mas, naquele dia, sabia que ela ajudaria seu pai no mercado e sua avó cuidava dos menores.

— Sua benção, minha avó. – Se aproximou, beijando a testa da anciã.

Todos que vieram com o irmão, repetiram seu gesto, tirando os calçados no beiral da porta e largando suas sacolas de pano. Sem que fosse preciso, foram todos para o banheiro, que ficava nos fundos da casa.

— Meu lindo Ayubu! Como foi na escola? – Falou a senhora de cabelos presos num lenço colorido e um bebê adormecido nos braços.

— Foi bem vovó. Vou tirar minhas roupas e banhar-me, para lanchar com a senhora.

— Ajude seus irmãos menores, sim? Faça com que todos lavem bem as mãos, antes de sentar pra comer. – Falou, se levantando da velha cadeira de balanço e indo em direção a cozinha.

— Sim, senhora. Terá história, hoje? – Perguntou com um largo sorriso.

— Terá! E esta, será especial! - Sorria com os olhos.

Assim que todos os netos, inclusive Ayubu, o mais velho presente, estavam limpos e sentados à mesa, ansiosos para ouvir a avó contar-lhes uma história ou lenda africana.

— Vejam! Que crianças limpinhas! Onde estão meus netos carregados de lama? – Ria, enquanto servia matooke¹ nas tigelas – Antes de comer e beber, o que devemos fazer? – Perguntou a eles.

— Louvar a Zambi, pois Zambi² é o princípio e o fim de tudo, vovó! – Falou a pequena Thany, orgulhosa de lembrar.

— Isto mesmo, minha pérola Thany. Agora, agradeçam e comam tudo. Vou contar a história do Ubuntu* – Falou, serenamente.

— Vovó, preciso estudar depois. Quero preparar um exercício novo para mamãe. – Disse Ayubu, terminando sua refeição.

— Está certo, meu menino. Vou contar, então! Estão prontos?

— Estamos vovó! – Disseram em uníssono.

— Essa é uma lenda africana que vai mostrar a vocês, valores sobre cooperação, igualdade e respeito. – Disse, se ajeitando na cadeira de balanço.

Todos, tinham os olhos fixos na avó, que se embalava lentamente e ia desfiando um colar de contas coloridas.

Ayubu, sentado à mesa, ia escrevendo num caderno, os exercícios para sua mãe, quando voltasse. Mas toda a sua atenção estava voltada nas palavras da bondosa senhora. Ele admirava a mulher, que carregava em sua pele enrugada e negra, toda a história de seu povo bantu³. Ele tinha muito orgulho das suas origens e nutria um sonho de entrar na faculdade e se formar em antropologia.

— Vou iniciar, então! – Ela disse, olhando os netos – Conta-se que um homem branco, que estudava sobre o ser humano, foi visitar uma tribo africana. Ele quis saber quais eram os valores morais daquele povo e para isso, ele propôs uma brincadeira às crianças da tribo.

Ela fez um suspense, se embalando, antes de recomeçar:

— Ele então, colocou uma cesta cheia de frutas embaixo de uma árvore e disse para as crianças que a primeira que chegasse até a árvore poderia ficar com toda a cesta para ela.

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