Capítulo 5

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Eu havia cumprido com minha promessa, e ligara para minha mãe assim que cheguei em casa, depois de retornar do mercado. Ela parecera extremamente feliz com meu contato, como se estivesse esperando por isso. Não soube dizer se Julie havia dito a ela ou não, e não importava de qualquer forma. Mamãe havia ficado extasiada com a notícia de eu que iria visitá-las no fim de semana.

Hoje é o dia da minha consulta com a Dra. White, então eu já iria para o trabalho com uma mala pronta para pegar a estrada até Bellevue. O trajeto era curto, e em apenas trinta minutos eu chegava na casa de minha mãe.

Não me sentia muito empolgada com a sessão com a Dra. White, pois não tivera mais alucinações, embora tivesse acordado suando frio do último pesadelo. Dessa vez, o pesadelo fora mais vívido do que normalmente era, e eu pude discernir melhor os arredores e as figuras aladas, que poderiam ser anjos ou demônios. Acho que dependia da perspectiva de cada um.

Eu havia pedido dois dias de folga para poder visitar minha mãe, e como eu quase não tirava folgas, ninguém se opôs. Havia uma enfermeira que disse estar precisando do dinheiro, e que não seria problema trabalhar turnos dobrados, e assim ficou resolvida a questão. Meu turno de hoje estava próximo do fim, e com o movimento tendo normalizado nos últimos dias, tive a sensação de demorar mais para o tempo passar.

Minha última paciente seria a Sra. Humphrey, a senhora ranzinza e solitária. Estava quase chegando em seu quarto quando os apitos começaram a soar, indicando que havia algum problema. Corri o resto do caminho, seguida de perto pela enfermeira chefe, que por acaso estava no mesmo corredor que eu.

Avançamos os últimos passos para ver uma Sra. Humphrey paralisada na cama, sem conseguir respirar. O monitor de batimentos cardíacos marcava 168 batimentos por minuto e subindo, o que indicava que a Sra. Humphrey estava tendo um infarto. Mas o que me fez parar na porta do quarto não foi o que eu vi nos monitores, e sim o vulto preto que pairava acima da idosa, com longas asas descendo pelas costas. Quando ele estava se virando na minha direção, fui tirada do transe, pois a enfermeira chefe estava gritando meu nome, e instigando para que eu agisse.

Minha respiração estava presa na garganta, mas consegui me mexer para além da porta do quarto e auxiliei a enfermeira chefe com os procedimentos, aplicando uma injeção anticoagulante e preparando o desfibrilador, para o caso de haver parada cardíaca. O médico de plantão havia sido bipado e estava adentrando o quarto para continuar o tratamento. Estávamos levando a Sra. Humphrey para a Unidade de Tratamento Intensivo, e eu torci para que ela ficasse bem.

No trajeto, ela conseguiu se mexer o suficiente para agarrar meu braço, com uma força que eu sabia que ela não tinha. Se movida a adrenalina ou algo mais, não sei dizer. O aperto estava me machucando, e ela me encarava com olhos esbugalhados, tentando balbuciar algo que ninguém conseguia entender. Me arrisquei chegar mais perto, para conseguir escutar a mensagem dela, achando que poderia ser para um de seus parentes.

- O fim... – Disse ela, com a respiração arquejada, mal passando de um sussurro. – O fim... se aproxima. Logo... você terá... que decidir.

E com isso, a Sra. Humphrey se foi. O médico fez a declaração do óbito enquanto ainda estávamos no corredor. Demorei um tempo para perceber que o médico que havia feito o atendimento era o Dr. Richards, o mesmo que havia me dado o medicamento para enxaqueca.

- Não havia nada que pudéssemos fazer, enfermeira Russell. – Disse ele, gentilmente, me dando dois tapas leves no braço, que ainda estava no aperto da Sra. Humphrey. Notando isso, ele ajudou a me soltar.

A enfermeira chefe me deu um olhar estranho, mas não disse nada. Principalmente na frente do Dr. Richards. E eu sabia, que em algum momento, uma bronca viria pela minha inércia durante o incidente com a Sra. Humphrey. Porém, algo que ela viu em minha feição abrandou sua expressão, e ela apenas me disse para ir para casa. Apenas assenti, sem confiar em minhas palavras.

A RebeliãoOnde histórias criam vida. Descubra agora