Fire on Fire

Capítulo 5- Natal nos Cuthberts

Era véspera de Natal. Anne acordou tão ansiosa que assim que o galo cantou, ela correu para a janela e observou a paisagem lá fora com animação.

Tinha nevado durante à noite, e pela temperatura extremamente baixa, ela tinha certeza que continuaria a nevar naquele dia, o que indicava que teriam um Natal completamente branco.

Era o quarto Natal que passava em Green Gables, e todos eles foram extremamente especiais. Anne ainda se lembrava do seu primeiro ano naquela fazenda maravilhosa, onde tudo parecia um grande parque de diversões para uma garota de treze anos, que nunca tivera a oportunidade de ter uma ceia de verdade, árvore de Natal enfeitada, e luzes por toda parte.

Também fora a primeira vez que ganhara presentes. Eram coisas singelas e muito úteis para o seu dia a dia, mas nem por isso deixavam de ser maravilhosas. O significado afetivo era que importava, porque em toda sua vida nunca alguém se importara com ela o suficiente para presenteá-la com um par de luvas tricotadas à mão, um vestido feito com todo o carinho em uma máquina de costura antiga, um par de botas grossas que durariam por muitos invernos, e um cartão todo enfeitado pelas mãos de um garoto a quem ensinara com muito orgulho a escrever.

Ela nunca se esqueceria da sensação de pertencer a uma família. Da alegria que sentira ao olhar para Matthew e Marilla, e perceber que eles realmente a tinham aceitado como membro do clã Cuthbert. Ela então tinha um teto sobre sua cabeça, um sobrenome distinto, e pessoas que se importavam com seu bem-estar. O que mais uma garota órfã poderia desejar?

Ela saiu da janela, e começou a se vestir, reclamando baixinho pelo corsete que deveria colocar. Se atrapalhava toda com aquela peça de roupa que começara a usar após seu aniversário de dezessete anos. Marilla a presenteara com ela, pois dissera que moças de família deveriam sempre usar um embaixo de suas roupas, além de deixar a figura feminina mais elegante.

Anne até podia entender essa necessidade de mulheres desejarem ficar mais atraentes e dentro da moda, mas para isso tinham mesmo que passar por aquela tortura diariamente? Por um segundo se sentiu tentada a não colocá-lo naquele dia, mas como nada escapava aos olhos de lince de Marilla Cuthbert, Anne tinha certeza que ela ralharia com ela por horas, lhe explicando mais uma vez item por item do que era necessário para se tornar uma dama decente .

Na verdade, Anne não se importava com essas convenções, e tivera muita dificuldade em se adaptar a sociedade de Avonlea no começo de sua vida ali, pois tinha de certa forma sido criada de maneira não convencional.

No orfanato, ela aprendera que deveria obedecer a Deus acima de tudo, e que a maioria dos atos humanos eram visto como pecado pelo Criador. Felizmente, ela tivera a companhia dos livros para ajudá-la a criar suas próprias conclusões sobre a vida, e apesar de tentar seguir a risca dentro do orfanato o que as freiras e os padres pregavam para não ser punida severamente, por dentro ela desdenhava das ideias arcaicas e opressivas que tentavam incutir em sua mente.

Anne tinha uma imaginação progressiva, e isso por vezes lhe causara inúmeros problemas, mas também a salvara de se afundar na tristeza e na desesperança de que sua vida nunca mudaria. Fora seu otimismo incansável, e vontade férrea de escrever seu próprio destino que a ajudara a persistir, e no fim alcançara exatamente o que desejava.

Ela terminou de se vestir, fez suas costumeiras tranças, e desceu as escadas com cuidado daquela vez, a fim de que Marilla não se zangasse com sua falta de modos.

Assim que alcançou o andar de baixo, um cheiro delicioso de torta de maçã chegou às suas narinas. Ela inspirou profundamente, sentindo sua boca salivar. A torta de maçã de Marilla era divina, assim como a preferência de Anne por ela era grande. Ela quase podia sentir a massa derretendo em sua boca, acompanhada da geleia de morango fresquinha, colhido no pomar de Green Gables.