Fire on Fire

Capítulo 16 - Um doce momento

'Cause there'll be no sunlight if I lose you, baby" ( Bruno Mars)

Anne não conseguira dormir. Virara a noite inteira na cama, sem entender o que estava acontecendo com ela.

Era uma garota inteligente, mas em matéria de sentimentos, não tinha conhecimento nenhum.

Na verdade, nunca tivera direito a eles. Sempre fora jogada de um lugar a outro como se fosse uma boneca sem emoções. Nas casas para as quais fora enviada para trabalhar, nunca fora escolha sua, nunca lhe perguntaram se aquilo era importante ou não para ela, ou se a afetava de alguma forma.

Assim, ela aprendera a não sentir ou questionar, pois se convencera que era melhor daquela maneira, pois não criava expectativas em sua cabeça ou sofreria desilusões depois. Era uma órfã que ninguém queria e muito menos importava a alguém como ela canalizava as emoções dentro de si.

Se tornara uma pessoa otimista, pela força da revolta e da necessidade de provar a si mesma que era capaz de passar por qualquer adversidade sem se quebrar. Afundara sua sede de amor e carinho nos livros, encontrando em cada página que narrava sobre pessoas fictícias, uma maneira de encontrar o que procurava.

Não acreditara naquela época que encontraria alguém que a amasse pelo que era. Tentara ignorar o olhar de pena que lhe lançavam dentro do orfanato ou fora dele, porque lhe feria o orgulho perceber que não passava de uma pobre garota rejeitada que vivia pela caridade dos outros.

Os Cuthberts a tinham salvado de um destino triste, e foi com eles que aprendera o real significado de uma família. Contudo, quando o assunto era sobre coisas do coração, ela ainda era totalmente ignorante. E o que Gilbert provocava nela com um beijo, virava seu mundo de ponta cabeça.

Não conseguia esquecer as sensações, a maneira como seu corpo queimara em contato com os lábios dele. Nunca imaginara que podia se sentir assim, e também não sabia que nome dar aquele calor que surgira do nada e se instalara no meio de suas pernas.

Seu rosto queimava de vergonha ao se lembrar, e o pior de tudo era que Gilbert a vira fugir como uma covarde, e bem podia imaginar o que ele estava pensando sobre ela agora.

Felizmente, não teria que encará-lo naquele dia, pois era domingo e se livrara de um constrangimento maior. No entanto, no dia seguinte ela teria que ir à faculdade e escapar do embaraço de ter fugido, deixando óbvio o motivo de sua fuga, o que seria bem mais difícil.

Respirando fundo, Anne se levantou da cama e se vestiu devagar, pois não estava com muito ânimo para realizar suas tarefas daquele dia. Tinha um trabalho de linguística e morfologia para fazer de manhã, e depois do almoço, tinha que trabalhar na cafeteria. Teria seu turno dobrado naquele dia, o que significava que seria a última funcionária a deixar o estabelecimento.

Ganharia mais dinheiro era verdade, e estava contando com isso para comprar as coisas que estava precisando, mas ao mesmo tempo seu humor naquele dia estava mais para ficar em casa, trancada em seu quarto do que sorrir e atender pessoas, fingindo que sua vida estava uma maravilha.

Mas como Marilla sempre dizia, o mundo não parava de girar só porque alguém tinha um problema difícil de resolver e pessoas como ela, que não tinham nascido em berço de ouro, não tinham sequer o direito de ter tempo para pensar em suas mágoas.

Depois de pronta, Anne foi até a cozinha e encontrou Lisa tomando seu café da manhã. Ao contrário de Anne, a garota parecia bastante feliz, pois o namorado viria visitá-la e passariam o dia juntos, fazendo turismo pela cidade.

-Bom dia, Anne. - ela disse, assim que a viu entrar na cozinha.

-Bom dia. - Anne disse sem muita animação, o que despertou em Lisa um certo alerta, pois Anne nunca acordava de mau humor. Era uma otimista nata e mesmo nos piores momentos, era capaz de encontrar um motivo para sorrir e ter esperança. Então, o que poderia ter acontecido para que ela ficasse naquele estado de ânimo tão estranho?