Réveillon

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A semana de Simone Tebet passou rastejando. Todos os dias, ouvia nos noticiários a repercussão de sua vitória, mas sentia-se completamente derrotada.

Seus pensamentos estavam direcionados não ao plano de governo, nem aos desafios de se governar o Brasil, mas sim em Soraya Thronicke.

Sentia uma mágoa gigantesca dentro de si, buscava conforto nos livros que tanto amava. Passava horas lendo, mas vez ou outra a voz de Soraya ecoava em sua cabeça.

‘’Podemos nos beijar uma penúltima vez?’’

Além da falta que sentia dela, as noites não eram as melhores. Sempre acordava suando com os seus pesadelos que aconteciam, em sua maior parte, na floresta. Precisou consultar semanalmente com Montívia, sua psicóloga amazonense.

Tinha uma ótima comunicação com ela, mas não deu os detalhes de suas crises de ansiedade e noites mal dormidas. Não queria falar de Soraya tão cedo.

Além disso, Simone estava sendo julgada por homicídio. Os advogados alegaram legítima defesa, logo não seria condenada. Sabia muito bem como ocorriam os processos, já que atuou na área da advocacia por muitos anos. De todo jeito, o peso de matar alguém não seria perdoado tão facilmente pelo seu subconsciente.

Assim que acordava, seu primeiro reflexo era pegar o celular para checar suas mensagens. Tinha esperança de receber um recado de Soraya, ou uma curtida no Instagram.

Todos os dias pensava em mandar mensagem para sua vice. Não sabia como ficaria a relação no trabalho depois de tudo que passaram juntas, mas fato é que a mídia falava das duas como se fossem amigas inseparáveis.

As fanfics que antes já eram presentes, agora duplicaram de quantidade. Tebet nunca teve coragem de ler, mas sabia que a maior parte das autoras desejavam que elas ficassem juntas, independente das consequências.

Quem me dera poder viver no mundo dessas fanfics…

Tebet pensa, enquanto está sentada em sua cama, na chácara. Está de volta ao lugar que passou por bons momentos com Soraya.

Desfez suas malas, jogando as roupas em cima da cama. Acaso ou não, Tebet encontra o boné da loira amassado dentro de uma de suas bolsas. Desamassou com cuidado e sentiu o pouco do perfume restante dos cabelos de Soraya, o que a fez chorar instantaneamente.

Um choro silencioso, repleto de dor. Pela primeira vez em muitos anos ela estava realmente gostando de alguém, mas não deu valor enquanto podia. Se não tivesse ficado com Janja na noite do seu comício no Amazonas, não teria perdido Soraya. São tantos ‘’e se’’ que Simone se viu perdida frente ao espelho.

E se não escolhesse Soraya como vice? E se não tivesse se candidatado? E se tivesse se mantido como professora universitária? E se…

Seu choro foi interrompido por batidas na porta. Logo tratou de jogar uma água no rosto e abandonar o boné em sua cama. Atendeu a porta e encontrou Marcos, sorridente.

Ao ver o estado de Simone, seu amigo murchou completamente.

– Oi… – Marcos pigarreia – como você está?

– Estou bem – Tebet oferece um sorriso cansado. Sua feição muda completamente para tristeza e ela retorna a chorar. Seu amigo a abraça e entra no quarto, guiando Tebet até a cama.

– Tá na hora de me contar o que aconteceu, Simone. Não dá para esconder seus sentimentos para sempre. – Marcos pousa as mãos nos ombros da ex-senadora.

Tebet senta sobre uma das pernas e inicia o desabafo com o amigo. Enquanto fala, Marcos sai em busca de lenços no banheiro.

– Foi repentino, sabe? Estávamos bem e do nada ela deu aquela crise de ansiedade. – Marcos assente e segura as mãos de Simone.

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