Estaca zero

1.4K 150 72
                                    

Extasiadas pelo encontro surpresa no banheiro, as duas mulheres caminham de volta para o corredor, em silêncio. Passam por todos os gabinetes mantendo certa distância. Ao chegar no estacionamento, Simone Tebet dispensa sua motorista na intenção de conversar com Soraya durante o caminho.

– Você está bem? – Tebet perguntou, dando partida no automóvel.

– Acho que sim. – Um sorriso fraco surge nos lábios de Thronicke. A reaproximação das duas a deixava muito confusa. Como seria a vida profissional? Ainda seria chantageada pela família Bolsonaro? Poderia assumir um relacionamento com Tebet sem prejudicá-la?

Esses e outros questionamentos pairavam em sua cabeça. E Simone percebeu.

– Você parece preocupada. – Tebet para no semáforo.

– Você não está? Digo, olha tudo que poderia ter sido evitado se nós fôssemos apenas amigas. – Sua voz sai embargada.

– Olhe, eu não me arrependo das minhas escolhas. Não me arrependo de ter te beijado naquele elevador. – O sinal abre e o carro acelera. Tebet retoma a atenção à estrada.

– Eu... também não me arrependo... – A insegurança na voz de Soraya incomoda Simone. A preocupação agora é evidente em seu rosto.

O silêncio pesa no ar enquanto a presidente dirige até a casa da loira. Ao chegarem, permanecem alguns instantes no carro. Seus olhares atravessam para além do corpo físico, em busca das emoções. Thronicke parecia ilegível. A muralha que havia construído entre ela e Simone estava prestes a desmoronar feito um castelo de cartas.

Ela tenta falar, mas hesita. As palavras morrem em sua garganta. Lança um último olhar de tristeza para Simone e sai do carro. Inconformada, Tebet desce do veículo e chega até a porta da casa.

– Soraya? – A loira se vira. – Desculpe pelo texto. Não sabia que você ficaria mal. Podemos só... fingir que nada disso aconteceu. – Ela oferece um sorriso triste.

As palavras pesam no ar e seu coração dói só de pensar na possibilidade de não poder ficar com Soraya.

Thronicke nada diz. Apenas entra em sua casa, mas deixa a porta aberta para que ela possa entrar.

Eu posso simplesmente ir embora, Simone pensa.

Decide entrar.

Soraya entra no quarto e é seguida por Tebet.

– Não queria te pressionar, mas eu também preciso de conforto, ou pelo menos uma resposta. – A mulher diz atrás dela.

Soraya se vira bruscamente e a encara.

– Eu... quero ser sua. – Às lágrimas descem rapidamente pelo seu rosto. A confissão faz Tebet soltar o ar com força, aliviada.

Tantos meses longe fizeram as duas cultivarem incertezas e inseguranças. Agora estavam ali, frente a frente, prestes a retornar à estaca zero.

Simone abandona os pensamentos e se aproxima de Soraya. A loira dá dois passos para trás.

– Me deixe ser sua também, Soraya. - Tebet pega as mãos dela.

A loira suspira e recebe um abraço da mulher que amava. O calor do toque urgente, sincero e receptivo de Simone fez seu coração acelerar ainda mais.

– Eu sei de tudo que aconteceu. – Tebet diz enquanto se afasta de Soraya e senta na cama.

– De tudo o que? – Soraya a acompanha, nervosa.

– Depois que o Marcos morreu... eu descobri que... – Seus olhos apertam. Lágrimas intrusas não paravam de rolar. – Que merda, Soraya. Aquele homem te batia, mas eu descobri tarde demais. Quis te proteger, mas sabia que já não dava tempo. Você se feriu demais, sinto muito por isso.

MirrorsOnde histórias criam vida. Descubra agora