Nosso trio ficou formado oficialmente por pouco tempo, quando já tinha alguns meses que estávamos na escola, Mari me deu a notícia que iria embora da minha cidade. Seu pai era pastor e tinha que mudar de Igreja o tempo todo. Eu demorei a acreditar, estava trste demais, eu não queria aquilo, queria que ela ficasse. Como qualquer criança eu não compreendia e insisti pra ela pedir pro pai dela ficar, até raiva eu senti dele. Era injusto.
Mas ela tinha que ir, a viagem já estava marcada e não teria jeito. Meu mundo caiu, me senti sozinha, pensando no que fazer naquela escola sem minha melhor amiga, me esquecendo de novo de Cida. Nossa ultima semana seria aquela, e depois ela iria embora e eu nunca mais a veria, perderia o contato e não lembraria do seu rosto. Eu surtei. Sentia o peito doer e sabia que ia sentir a maldita e dolorosa saudade dos momentos que nós passámos juntas na casa dela e na escola.
A gente até gostava de compartilhar desenhos que fazíamos juntas, tinham aqueles joguinhos de vestir e arrumar a personagem, a gente se inspirava e fazia uma coisa parecida, só que no papel. Eu Inclusive me lembro de desenhos que ela fez e que eu tinha guardado numa caixa, mas infelizmente com o tempo eu acabei perdendo todos.
Mari e eu passamos a semana juntas na casa dela e com Cida na escola. Eu ia para a casa dela normalmente depois da aula, mas com o peso de saber que ela iria embora. Passados os dias, os nossos últimos dia chegou, ou melhor, a noite. Eu fui na casa dela e fui surpreendida com todo mundo lá se despedindo, ela estava lá. A gente se olhou, ela na parte de dentro da casa e e eu do lado de fora do portão. Eu quase chorei, mas a lágrima não saiu. Cheguei perto dela e conversamos até a hora dela ir. Me lembro que ela estava com uma bolsinha verde de sapo, aquelas de guardar celular. Foi uma cena que eu me lembro muito bem.Seu cabelo cacheado e castanho amarrado com um coque como sempre. Sua pele marrom, sua blusa nada decotada, óculos, voz calma e sua saia jeans escura. Eu me lembro do sapinho verde em sua mão, tinha olhos grandes. Naquele momento eu me lembrei de Isa, fiz uma piada um pouco depreciativa sobre o tamanho dos olhos dela e rimos muito.
Estava sendo uma noite estranha. E queria que ela acabasse comigo acordando daquele sonho e tendo mais coisas pra passarmos juntas, como o dia em que fomos andar de bicicleta e ela quase arrancou o tampo do dedo no chão. Ela ficou tentando esconder do seu pai, talvez ela tinha medo dele saber que ela feriu uma pequena camada da pele do seu dedo. Sério, foi um corte pequeno, não era tudo isso, mas ela era exageradamente medrosa e não estava acostumada a cair e se machucar. Mas apesar de tudo, foi uma das melhores memórias que tenho, e continuarei guardando.Foi minha primeira perda, eu realmente sofri com a falta dela, eu gostava demais daquela menina, foi minha primeira amiga de infância. Quase fomos pro ensino médio juntas - faltavam três anos ok? - e eu penso hoje em como seria se ela tivesse ficado, mas ao mesmo tempo, não me arrependo de muitas coisas que sua ausência me propôs. É como se cada coisa que acontece no mundo tivesse um motivo de verdade. Talvez ela tivesse que ter ido para que eu conhecesse outras experiências e não me prendesse naquele única amizade. E tivesse conhecido a melhor face do que realmente é ter uma amiga.
Tinha um carro preto esperando eles, e eles estavam colocando as coisas no porta mala, estava um céu nublado, ia começar a chover logo logo. Eu finalmente, na última vez que vi Mariane na minha vida, me despedi dela, mas não nos abraçamos.
Sinceramente, eu não entendo minhas relações, mas a gente não se abraçou. Acho que ainda tínhamos vergonha de demonstrar sentimentos, mas com o olhar eu a segui até não a ver mais. Ela entrou no carro e foram embora. Eu fui indo atrás do carro, vendo ele ficar cada vez mais longe até sumir na esquina, e com a chuva que estava começando a cair, estava caminhando lentamente, enquanto as lágrimas finalmente saíram e eu me entreguei ao meu sofrimento. Pode parecer dramático agora, mas naquela época realmente doeu.
Cheguei em casa, e fiquei paralisada por uns momentos, mas depois aceitei tudo. E quando senti sono eu deitei e dormi com o som das gotas caindo no telhado da minha casa. Lembro que sonhei com ela, mas não faço a menor ideia de como foi o sonho, também lembrava dela quando ia pra escola e passava na frente da casa dela, era uma angústia lamentável, tão ruim.
Eu queria ver ela no portão da sua casa, saindo e entrando no ônibus, mas isso só aconteceu na minha imaginação enquanto olhava pra sua casa pela janela. Eu não tenho nenhuma foto nossa, mas tenho uma minha sentada em uma cadeira numa festa que teve perto da casa dela, no fundo dava pra ver as luzes do lado de fora ligadas, e essa imagem se a lembrança suficiente para que eu nunca me esquecesse dela.
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Os primos de Lay
Teen FictionLay é uma garota muito tímida e introvertida, que acaba criando uma fobia de pessoas diante dos acontecimentos de sua infância e adolescência. Ela encontra na sua imaginação um meio de fugir do seu medo de ter relações sociais.