𝒫rólogo ﹙🛷﹚

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Wednesday não se considerava uma pessoa festiva — e, certamente, não era — mas existia algo no Natal que a deixava mais confortável do que em outras celebrações comerciais.

Talvez fosse porque ela admirasse o frio, o gelo que cobria como uma manta grossa toda a cidade, congelando o mais imponente carvalho e forçando os moradores a acordarem pelo menos uma hora mais cedo para limpar toda a neve do lado de fora. Mas, acima disso, acreditava que o grande culpado desse sentimento era seu pai.

Ele fazia da data uma verdadeira celebração acolhedora — do jeito Addams — além de reunir tudo o que Wednesday amava — apesar dela nunca admitir que se afeiçoava a aquilo.

Mas, apesar disso, reconhecia que o significado de natal talvez pudesse ser divergente para ela. A latina não se agradava com tantas luzes e cores, tampouco com a sensação de extrema energia infantil por parte de todos a sua volta — exceto por Enid —, para ela, o natal só era mais uma desculpa para gastar dinheiro.

E, mesmo assim, era diferente das demais festividades.

Na recaída da noite, depois que todos se recolhiam, ela admitia isso para si própria — ver sua família feliz era quase um presente.

E com tamanha certeza que admitia esses fatos, ela sabia que o natal desse ano seria diferente, isso porque sua colega de quarto iria junto a ela para a mansão opaca e sombria onde os Addams residiam.

Não estava sã quando fez o convite, acolhendo a de fios louros em seus braços enquanto ela soluçava palavras desconexas depois de receber a notícia que sua mãe havia se recusado em buscá-la — odiava aquela mulher, por Lúcifer, como odiava. Mas não se arrependera desde então, ela gostava de Enid, gostava de verdade.

E isso era assustador.

Refletia sobre enquanto fechava sua mala, envolta por seus próprios pensamentos, a ponta dos dedos gélidos roçando na mochila de couro enquanto ela observava de relance Thing reunir seus próprios pertences, ansioso para voltar para casa.

— Eu acho que não vou... — Enid murmura de novo, coçando seu braço, chamando a atenção da de fios escuros para a figura sentada em cima de sua cama.

O medo da loira era quase palpável, isso irritava Wednesday, como vidro afiado rompendo as paredes de seu estômago — e a pior parte era que ela sabia o motivo daquilo, não poder ajudar a loira era quase como uma maldição.

— Você vai. — Ela impõe, firme.

— Eu não quero incomodar, Willa... — Enid sussurra, os lábios tremendo em uma tentativa árdua de não chorar. — É sério, eu já estou acostumada a passar o natal aqui... não é ruim! A diretora sempre se esforçou muito na decoração e no jantar e...

A latina a corta, se aproximando da — agora inexistente — faixa que separava os lados do dormitório, a linha que antes residia ali fora arrancada a alguns meses, desde que Enid e ela se reconciliaram no semestre passado.

— Eu não quero saber, Enid. Você vai comigo. — Wednesday rosna, firme. Não se perdoaria em deixar a de fios dourados sozinha ali, especialmente conhecendo a incrível necessidade de atenção da garota.

A latina observa com pesar os olhos azuis cintilantes se encherem de lágrimas, algo que estava frequente nesses últimos três dias — amaldiçoaria até a décima reencarnação dos genitores da loira por isso. Com um suspiro interno, a de fios escuros se senta ao lado de Enid naquele amontoado de bichos de pelúcia, encostando seus ombros levemente.

Ela ainda não era fã de contato físico, e demonstrações de fraqueza a deixavam desamparada, mas com a de bochechas rosadas era diferente, então — mesmo que de forma desconexa — ela tentava se monstra solicita a colega de quarto com pequenos gestos.

— Eu não quero me humilhar. — Ela soluça, fincando a pele leitosa de seu braço com suas unhas involuntariamente.

O chiado fraco fez o coração de Wednesday se apertar, a latina franzindo levemente o cenho enquanto tomava as mãos da loira para si, roçando com cuidado a ponta de seus dedos na palma de sua mão macia, dedilhando linhas sobre as marquinhas da lobisomem.

— Willa, seus pais vão me odiar. Eu prefiro ficar aqui, por favor, não me obrigue a ir. — Ela completa, direcionando seu olhar para a latina ao seu lado.

— Não diga isso, meus pais gostam muito de você, Enid.

— E como você tem tanta certeza?

— Eu conto praticamente tudo para eles. — A loira pisca, lágrimas salgadas escorregando sobre sua bochecha rosada. — Eles sabem do Hyde, e são muito gratos por você ter me salvado.

A pele da garota adquire um tom mais forte, seu olhar caindo para o tapete felpudo no chão, encarando o objeto de forma pensativa.

— Pode ter certeza que eles são gentis. E, olha só... — Wednesday segura o queixo da loira, forçando-a a olhá-la. — Se você conseguiu me cativar, imagina o que fará com meus pais? Eles são bem mais receptivos do que eu, Enid, vão se apaixonar por você.

A latina mal poderia acreditar que havia verbalizado aquilo, encarando os olhos marinhos com certa melancolia — por Lúcifer, ela havia acabado exatamente com o mesmo ar idiota de seu pai.

— Nem meus pais gostam de mim. — Ela murmura com certa amargura e autodestruição.

— Seus pais são uns idiotas. — A latina resmunga, irada, apertando levemente as bochechas rechonchudas de Enid antes de se por de pé. — Vai terminar de empacotar suas coisas agora, e se você ousar colocar cores opacas na sua mala eu juro que te acorrento nas masmorras.

A fala da Addams fez a de fios dourados sorrir minimamente, enxugando as lágrimas enquanto se colocava de pé, pronta para voltar a separar suas coisas.

— E, Enid. — Wednesday chama, a voz arrastada, inconsciente da onda de arrepios que percorreu o corpo da loira. — Leve roupas mais quentes, o natal vai ser incrivelmente frio esse ano.

𝒪 𝒩atal mais quente 🎄 ꒰ 𝘄𝗲𝗻𝗰𝗹𝗮𝗶𝗿 ദOnde histórias criam vida. Descubra agora