Lentamente abri meus olhos me vi em um quarto mal iluminado, no entanto, bastante familiar. Devo ter dormido na carruagem. Pequenas frestas de luz que invadem por entre as cortinas das janelas me permitem olhar os arredores, deitada em minha grande cama vou novamente fechando os olhos e deslizo minhas mãos por ela sentindo sua agradável maciez, esse momento de paz só é possível graças as runas mágicas gravadas nos rodatetos que bloqueiam os sons e criam esse silencio aconchegante que só consigo ter neste quarto.
Retorno a abrir meus olhos e me sento para poder pegar um pequeno sino de prata na mesa ao lado da cama, que ao chacoalhar não emite nem mesmo um único ruído. Hoje será um longo dia... Pouco após tocar o sino as portas do quarto se abrem trazendo bastante luz que me impede de ver quem as abriu.
- Bom dia Anna. - Conforme meus olhos se acostumam com a luz repentina, passo a enxergar a figura dela e de outra empregada logo atrás.
– Bom dia senhorita Eleonor. – Ambas põem a mão no peito e fazem uma reverencia.
Sem perder tempo a outra empregada abre as cortinas do quarto e começa a trocar a roupa de cama enquanto Anna me ajuda a tirar minha camisola e por um vestido. *passos* O quarto é tão quieto que posso escutar elas andando. *passos* Por conta da minha condição, apenas servos especiais são permitidos a me auxiliar, eles são treinados para ocultarem seus passos e me proteger de qualquer ameaça.
- O que aconteceu depois que deixei o palácio imperial? – Perguntei.
- A senhorita caiu no sono e foi carregada até o quarto pelo senhor August. – Anna respondeu enquanto franze o cenho. – E os cavaleiros do Palácio apareceram poucos minutos depois para prendê-la sob justificativa de desacato a realeza. –
Aquele príncipe irritante se atreveu a enviar os cavaleiros e ainda por cima com uma desculpa ridícula? Onde eu o desacatei? Suas acusações foram literalmente insultos a minha pessoa.
- E o que aconteceu com eles? –
- Suas entradas na propriedade foram negadas e quando tentaram entrar à força, o conde acabara de chegar da celebração e os expulsou com ameaças. –
E pensar que tentariam forçar suas entradas só para cumprir ordens que nem ao menos vieram do imperador. Acredito que a idiotice do príncipe herdeiro está se tornando contagiosa.
- O Conde também pediu para avisá-la que vá encontrá-lo em seu escritório após o dejejum. – Quem me avisou foi a empregada que estava terminando de trocar a roupa de cama.
Deve ser para conversar sobre o que aconteceu na festa.
- Compreendo, eu também queria falar com ele. –
Sem demora o quarto já estava organizado, Anna me pôs um vestido longo de cor azul bebê com uma faixa branca na cintura e um par de luvas brancas que cobrem quase completamente os meus braços enquanto a outra empregada fica aguardando em frente a porta.
Fico parada no meio do quarto observando o vestido e... Algo não parece certo, por quê?
- Senhorita. – A voz de Anna me chama e ela está de pé ao lado da penteadeira.
Com passos lentos vou até lá e me sento no pequeno banco acolchoado para que Anna possa ajeitar meu cabelo.
Me vejo através do espelho, um rosto fino e delicado, cabelos prateados com leves toques de um azul bem claro e um par de olhos escarlates que se destacam como rubis na neve. Uma mecha de cabelo cai por cima do meu olho e ao retirá-lo fico enrolando-o ao redor do meu dedo enquanto lembro da primeira vez que Anna o penteou.
- Se... se... seu cabelo... é bonito. – Ela falou com extrema timidez. – Parecem... fios de prata... –
Soltei um pequeno sorriso antes de observar Anna penteando meu cabelo pelo reflexo do espelho e mesmo tentando esconder ao máximo o nervosismo eu pude percebê-lo, afinal, estamos juntas já faz dez anos e nos conhecemos tão bem que podemos dizer quando tem alguma coisa incomodando a outra ou escondemos algo.
- Saia. – Olhei para a empregada que estava parada em frente a porta.
- Sim, senhorita. – Ela sai sem demora.
Me sento de frente para Anna e ela logo percebe o que planejo fazer.
- Me conte, o que aconteceu ontem? –
Anna recuou um passo, fechou os olhos e respirou bem fundo. Se June visse isso ela daria um grande e longo sermão nela.
- Sendo sincera, eu não sei ao certo o que de fato ocorreu. – Ela olha diretamente para meus olhos e continua. – No meio do salão enquanto eu a seguia, as pessoas começaram a passar entre nós como se nem notassem que eu estava lá.
Estranho... se algo assim tivesse acontecido eu teria notado ou pelo menos escutado os passos atrás de mim.
- Por fim, acabei me separando da senhorita e lhe perdendo de vista. – Anna abaixa a cabeça e passa a olhar para o chão – Uma serva do palácio me abordou e me disse que a senhorita estava me esperando em um dos quartos de descanso. –
O semblante no rosto de Anna muda e passa a mostrar imensa raiva, ela aperta o pente em suas mãos enquanto continua a olhar para o chão e fica em silêncio. Não existem muitas coisas capazes de irritar essa garota. Continuei olhando para os olhos da Anna e agarrei sua mão.
Sua carranca se desfaz quando nossas mãos se encostam e ela passa a olhar para mim com olhos levemente surpresos.
- Continue, por favor. – Eu disse com um pequeno sorriso
- Quando cheguei no suposto quarto e pedi para entrar, quem me aguardava era o jovem mestre Nikolas. –
Meu irmão? Arregalei os olhos com essa informação. Era suposto ele estar realizando a vistoria do condado e não na capital.
- Ele... Aconteceu tão rápido. – Seu tom passa para desgosto. – Antes que eu pudesse sair do quarto, ele agarrou minha mão e começou a dizer um monte de asneiras! –
Conhecendo aquela cobra, não duvido. Aposto que mais uma vez ele...
- Mais uma vez ele me pediu em casamento... – Ao proferir "casamento", Anna deu um pequeno rosnado com um olhar que mostrava nada além de ódio.
Fechei meus olhos e deu um pequeno suspiro. Nikolas... Por que simplesmente não desiste logo?
Nikolas Newgate, meu irmão mais novo, narcisista, mimado, egoísta, controlador, obsessivo e que odeia sujeira. Desde o dia que viu Anna pela primeira vez quis se casar com ela e essa vontade só cresceu conforme os anos, mas não é amor o que o motiva, é seu desejo. Desejo de controlar e colocar Anna em uma gaiola onde apenas ele pode vê-la.
- Ele contou porquê estava na capital? –
- Não, ele ficou evitando essa pergunta e me impedindo de sair do quarto. – Seu rosto fica sério. – Se não fosse por uma jovem criada que apareceu e me contou onde a senhorita estava, acredito que teria demorado mais para ir encontrá-la . –
A criada deve ter sido obra da garotinha, tenho que agradecê-la quando nos encontrarmos novamente.
- E após isso foi quando você me encontrou no corredor, certo? – Indaguei olhando diretamente nos olhos de Anna.
- Exatamente. –
- Pois bem, meu pai está me esperando. – Me virei de volta para o espelho – Termine para que eu possa ir comer. –
- Com prazer,senhorita. – Anna disse num tom animado.
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Eleonor
Tarihi KurguEleonor Newgate passou toda a vida se preparando para ser a futura imperatriz do império, mas da noite para o dia todos os seus 20 anos de esforço se mostraram inúteis. Já não bastando possuir ouvidos sensíveis que machucam ao menor ruído, seu noi...