O beijo

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Meu amigo só voltou a falar comigo horas depois.

Ainda fiquei pasma com seu desabafo repentino, por isso me agarrei ao Tapioca e contemplei o silêncio do cômodo. Tudo era tão... difícil. Se não fosse meu compromisso com o baile à noite, eu facilmente teria me enfiado embaixo das cobertas e chorado numa tentativa de pôr para fora o meu desespero.

Mas, eu não tinha esse luxo naquela noite. 

Sendo assim, depois de uns trinta minutos me pus de pé e cliquei em alguns tutoriais no YouTube, disposta a esquecer temporariamente todo o caos que tinha se instalado - e a ligação que eu ainda não entendia exatamente do que se tratou - e ficar bonita. 

Tomei um longo banho, hidratei minha pele e assisti um vídeo ensinando a fazer uma maquiagem leve. Claro, não ficou nada profissional. Mas o batom vermelho, o contorno leve e minhas pálpebras cintilantes me deixaram num aspecto mais jovial e alegre. 

Meus cachos tinham ficado do jeito que eu queria e caíam em um tipo de cascata pelos meus ombros. Me vesti com tranquilidade, calçando um salto relativamente pequeno e olhando o resultado no meu espelho.

Eu estava bonita, realmente bonita.

Ele apareceu em meu quarto no momento em que eu tinha guardado meu secador, carregava uma flor vermelha nas mãos e seu olhar estava fixo no chão. Soltei um suspiro pesado, me endireitando e esperando que notasse todo o meu empenho em me arrumar. Quem eu queria enganar? Estava claro que toda aquela produção foi para agradá-lo. 

O clima ainda estava pesado entre nós, provavelmente meu amigo se arrependia de ter exposto uma parte tão vulnerável de sua alma, mas de alguma forma isso mudou quando ele ergueu o olhar. Nicolas me analisou por alguns segundos e sussurrou:

- Você... está maravilhosa.

- Obrigada – agradeci como seu eu não estivesse esperando por esse elogio a tarde toda – Você também está.

- Não consigo pensar em palavras tão expressivas para conseguir descrever você – ele continuou se aproximando de forma hesitante – Céus, você está sensacional!

- Não exagera –revirei os olhos, por mais que meu coração estivesse quentinho – Agora vamos, tenho que aproveitar a saída do motorista da minha mãe.

Nicolas estendeu o braço para mim e constatei o quanto sua pele estava quente. Caminhamos lentamente, pois eu não costumava usar salto alto. Porém, antes de passarmos pela porta, ele pareceu se lembrar de algo:

- Toma, eu... achei que era o certo para um baile. 

- Obrigada - aceitei a flor, constatando que havia um cartão preso na embalagem. 

O abri rapidamente, olhando sua caligrafia caprichosa. "Não sou muito fã de clichês, mas essa ocasião pedia por um visual mais sofisticado e uma atitude mais simpática da minha parte. Desculpe por tudo, sei que será a mulher mais linda desse baile". Sorri embasbacada e beijei sua bochecha, me sentindo uma boba por estar tão emocionada com algo assim. 

- Sabe que está desculpado - sussurrei e coloquei a flor encima da mesinha de cabeceira. 

- Também sei que acertei no meu palpite - piscou - Não preciso nem ver as senhoras do local para saber que você é a mulher mais linda de lá, da cidade, do mundo. 

- Bobo - foi a única coisa que consegui dizer. 

Descemos as escadas e paramos ao ver minha mãe conversando com seu mais novo fotógrafo. Seu descontentamento em me ver com Nicolas foi ofuscado no momento em que percebeu a forma que eu estava vestida. Imediatamente, seu sorriso cresceu. 

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