Ah, as luzes do meu bar. Eu amo essas luzes, gosto do tom quente que preenche o ambiente amadeirado, da baixa luminosidade que não permite que possamos enxergar uns aos outros com grande nitidez. Hoje é uma segunda-feira, e apesar de abrirmos todos os dias, hoje eu não quis. Na verdade, hoje ele estava aberto somente para algumas pessoas exclusivas. Não sei quem eram, e não me interessa. Dessa parte quem cuida é o meu marido. Meu mundo está em chamas, e eu precisava cantar.
Tem uns dez minutos que finalizei meu show. Eu cantei. Não gosto muito de cantar em público, apesar do meu pequeno show ser transmitido por uma plataforma na internet. Apenas duzentas pessoas podem entrar na minha plataforma; apenas vinte pessoas podem me ver cantar ao vivo. Há um vidro com espelhamento virado para o meu palco, e é um vidro móvel que nós colocamos para que eu possa enxergar o que os outros estão enxergando. Por incrível que pareça, há pessoas que pagam para me ver e para me ouvir cantar. A fila de espera para entrar na transmissão é grande, muitos ficam de fora; e como sou extremamente falha e fraca, me sinto feliz por isso. Meu alter ego é apreciado por algumas pessoas; digo meu alter ego porque de nada serve uma boa música, sem uma presença marcante. O meu eu verdadeiro, não é nada interessante.
Quando estou no palco, eu não sou mais eu. Dou o meu melhor para ser uma espécie de personalidade que você poderia facilmente encontrar em qualquer botequim nos anos sessenta. Eu quero entreter, e eu quero ser ouvida. Aqui eu posso expor meus lamentos, meus desejos, todos os sentimentos que poderiam me levar ao Inferno. Eu tenho vinte e oito anos, e às vezes eu me pergunto se algum dia deixarei de me sentir como uma garotinha carente e assustada.
— Soraya — meu marido entra em meu escritório e me tira de meus devaneios —, acorda, minha querida! Você não vai se juntar a nós?
César e eu, apesar de casados, somos apenas melhores amigos. Ele parece uma versão mais animada de mim.
— Quem está lá?
Não tenho o menor interesse em me levantar e ser social. Eu gosto de beber sozinha.
— Somos apenas eu, o Eduardo — Eduardo é o namorado do meu marido —, e aquele gay que dançou com você à beça na última festa que fizemos — interessante, eu gosto dele —, além daquela minha amiga que estava morando no Rio e voltou pra cá há pouco tempo.
— O gay é o Luiz e a amiga é a Simone, certo?
Eu não conhecia a Simone, apenas pude ver seu rosto por uma fotografia que César havia me mostrado quando recebeu a notícia de que sua amiga voltaria a morar em nossa cidade.
— Ah, não estou a fim de falar com desconhecidos hoje, Carlos César. Não estou com humor pra forçar simpatia.
— Tem certeza? A Simone adorou te ver cantar, e eu pude me exibir, contando que sou eu quem treino você!
— Você é mesmo um partidão, garoto. — César é músico, então, além de me auxiliar com o canto, é ele quem compõe as melodias das minhas músicas. Eu escrevo as letras sozinha, somente eu e minha melancolia; ele me ajuda com o restante. — Me deixe em paz, por favor? Você é compreensivo, sei que vai entender.
— Vai perder a oportunidade de conversar com a Simone? Depois de ter ficado cantando a foto dela pra mim?
— Por Deus, César, eu não fiquei "cantando" a foto dela, só disse que ela era bonita.
Acendo meu cigarro eletrônico. No geral, eu não gosto de fumar. Odeio o gosto do cigarro comum. Normalmente fumo quando estou triste.
— Além de dizer que por uma mulher dessas você ficaria de quatro.
— E em seguida você disse que ela é hétero.
— É que isso é o que ela diz, assim como é o que eu digo para minha mãe, que acredita, graças a você, meu amor. — Fico quieta encarando a parede. — Ah, Soraya, deixa de ser chata. Você nem gosta de sexo, o seu negócio é... Como você diz mesmo?
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The Other Woman - Simone e Soraya
Romansa+18. A outra mulher; a outra história. Contos aleatórios, baseados em músicas ou não, sobre Simone e Soraya. Tudo fanfic, nada de compromisso com a realidade.