SÉTIMO CAPÍTULO

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Já era noite quando Iolanda encarava seu reflexo no espelho daquele boteco, passando seu batom vermelho-cereja nos lábios ao lado de Paola e Grazielly, ambas retocando suas maquiagens.  “Não te falei que tudo era questão de tá disposta a ceder?!”, Paola disse fitando a amiga de esguelha. “É né, mas só eu sei o que isso me custa”, Iolanda respondeu limpando o canto da boca.

“Ah, Iolê, para! Tu sabia que ele não era aquele príncipe todo”, Grazi comentou rindo baixo. “Eu num sou inocente, mas porra, o cara me deixô toda marcada”, Iolanda se desencostou da pia com o olhar voltado para o chão e uma expressão reflexiva. “Tu esperava o quê?”, Paola indagou com aquele chiado carioca e com as mãos na cintura enquanto encarava a amiga, “Porra, se fosse pra apanhar e ganhar o que tu ganha com esse bofe eu tava feita, né não, Grazielly?”.

“Nem tudo é sobre dinheiro…”, retrucara cabisbaixa. “É, meu bem, pra alguns pode até num ser. Agora pra gente como eu, tu e a Paola é sim! É tudo sobre money.”

E no final era mesmo, Maria Iolanda queria ter falado sobre dignidade, mas aquilo as fariam rir. Se sentiu boba e infantil por querer que Isaac fosse diferente, eles não eram um casal, aquele homem se quer a respeitava. “Filho da puta”, ela pensou enquanto guardava o batom dado por ele na bolsa também presenteada por ele.

“Escuta aqui, Iolanda”, Paola falou segurando o antebraço dela e a arrastando para um lugar mais ao canto. “Ai”, Iolanda arregalou os olhos e a encarou torto. “Tá maluca, porra?”, vociferou com um dos cantos da boca retraído.  “Me escuta, caralho!”, sussurrou a mulher mais alta, “Essa vida que nóis vive é uma bosta! Eu sei disso. A Grazi também sabe. Mas uma vez na vida a gente tá vendo uma das nossas conseguir alguma coisa além. Entende isso?”

Com uma das mãos no pescoço e o olhar voltado para o chão, Iolanda nada respondeu, apenas ficou ali submersa nos próprios pensamentos. “Entendeu, Iolê?, Paola indagara novamente com a voz firme, levantando com cautela o queixo da colega.

“Cê acha justo, amiga?”, ela retrucou com as sobrancelhas cerradas fazendo contato visual com Paola. “Qual foi? Tá ramelando? Esqueceu das merdas que fizeram com você quando tu trampava na noite?”

“Não, eu não me esqueci”, respondera baixinho. “Você ainda é novinha, tem muito o que viver. E eu vou te contar, a vida como puta não melhora. Não importa quanto tempo passe, qual valor você cobre ou quem você atenda, essa sensação não vai embora. E é a tua chance de ouro de sair daquele muquifo que cê vive e largar a prostituição de uma vez por todas. Pensa assim, que agora tu vai passar de puta pra amante.”, Paola desabafou com ambas as mãos segurando os ombros da mulher mais nova. “Tô falando por teu bem, como sua amiga, toda e qualquer oportunidade que você tiver para sair dessa vida, saia!”

“Não desperdiça essa oportunidade não, viu?”, Grazi se aproximou delas e com aquele seu sorriso gentil encarou Iolanda, buscando confortá-la. “A Paola sabe do que tá falando”.

“A vida não é justa, já tá mais do que na hora de colocar isso na tua cabeça”, Paola disse encerrando o assunto enquanto fitava a si mesma no espelho, acendendo um cigarro.


Aos poucos o sol subira no céu, trazendo luminosidade para aquela madrugada notavelmente álgida, carregada de uma densa névoa. Os azuis e os negros da noite ainda se mesclavam com os tons amarelados e laranjas que nasciam, trazendo o dia.

Iolanda por algum motivo ainda permanecia acordada sobre seus lençóis estampados. Os olhos escancarados como dois grandes portões, encarando a meia-luz daquele quarto silencioso. Com os cabelos desgrenhados, odor altamente enjoativo da mistura mais clássica de todos os tempos - nicotina, álcool e um perfume altamente doce-, era óbvio que o sono não havia sido seu aliado.

ᴛʀês ᴠᴇᴢᴇs ᴍᴀʀɪᴀOnde histórias criam vida. Descubra agora