Já faziam vários dias que eu tinha chego no acampamento em segurança com Annabeth e sem Thalia. As coisas não tinham sido muito fáceis desde o ciclope e desde que eu tivera que encarar a realidade de que os deuses - em específico meu "pai" - apenas nos deixaram no mundo pra virarmos comida, ou histórias e mitos de tragédia. Eu odiava pensar que não importava o quanto lutassemos pra sobreviver, nunca era o suficiente e nunca significava que estávamos seguros. Pelo menos, o sacrifício de Thalia deu ao acampamento meio-sangue uma esperança de sobrevivência diante de tanta violência e agressividade do mundo do lado de fora do mais novo Pinheiro de Thalia.
De qualquer forma, quando me vi aqui nesse lugar sem conhecer ninguém e nem nada, me senti mais apavorado do que quando estava preso na casa de Hal ( o filho amaldiçoado de Apolo que acabou se sacrificando para nos salvar) vendo a morte se rastejar ao meu encontro. Deixa eu te contar uma coisa, adolescentes são muito piores que monstros mitológicos de 8 metros de altura. Os monstro no geral - fora aqueles com instintos sádicos - só querem devorar você de uma vez só, com os dentes babados e as garras afiadas. Os adolescentes? Eles querem humilhar você antes de te de devorar com os olhares maldosos de julgamento. Era assim que eu pensava de todos os adolescentes do acampamento, até que conheci alguém.
Alguém que se parecia bem mais comigo do que os outros, já que estava tão perdida quanto. Depois de duas semanas estando no acampamento, comecei a finalmente me sentir em casa.
Talvez você não saiba, mas algumas coisas tinham acontecido na minha vida antes de conhecer Thalia. Na última vez que escrevi nesse diário fiquei um pouco preocupado de expor tudo e ela acabar roubando o diário de mim, mas agora que ela...se foi, talvez seja melhor explicar. Quando eu era um bebê, meu pai abandonou minha mãe e eu a nossa própria sorte, isso fez com que ela tivesse alguns..."problemas". Afinal, como vocês já sabem, sorte é uma palavra forte para designar semideuses e "pai" uma palavra forte pra designar um deus. Hermes nos abandonou e eu acabei fugindo de casa muito cedo pra evitar que a minha mãe acabasse sofrendo as consequências por minha causa e também por uma outra razão, mas talvez eu não esteja pronto pra falar disso ainda.
De qualquer forma, naquela noite Agnes e eu decidimos fazer algo um pouco imprudente. Invadir a casa grande e roubar alguns documentos, o que poderia ser quase hilário se fosse feito por adolescentes inexperientes mas eu sabia como fazer. Já tinha roubado um monte de coisas na vida ( e não, não sinto vergonha disso se quer saber) desde comida até um Nintendo 64 roxo que tive de deixar pra trás junto da minha mochila velha. Equipamentos eletrônicos não funcionavam muito bem aqui e também era arriscado usá-los e chamar monstros para perto da fronteira. Por causa da minha vaga experiência com pequenos furtos, arrombamentos e ligações diretas ( hã...longa história) acabei me prontificando para ajudar e entrar sozinho.
E subitamente mudei de idéia no instante que abri a porta e fui consumido pelo escuro do casarão que tinha todas as luzes apagadas naquele momento. Mas já era tarde, eu precisava ir até o fim ou ia parecer um grande mané em frente a Agnes. A minha nova amiga estava contando com isso, não era justo eu saber tudo sobre minha própria vida – pelo menos até onde interessava – e ela estar completamente a margem de tudo. Já era difícil saber que eu era filho de Hermes e dormir no chalé 11 graças a isso, mas dormir no chalé 11 só porque você não sabe de quem é filho deve ser ainda pior. De qualquer maneira, eu não queria que ela continuasse naquela situação e também queria me exibir um pouco. É. Edai poxa.
Quando pisei firme no assoalho de madeira, ele rangiu um pouco. Meus olhos estavam arregalados e minhas pupilas tentavam puxar o máximo de luz que conseguiam naquele breu. Eu não podia ver absolutamente nada em frente a mim e comecei a rezar para que não houvesse nenhum... cão de guarda ou coisa do tipo dentro do casarão.
Depois da terceira tropeçada, comecei a tatear as paredes do lugar até encontrar um interruptor de luz que estava na ponta esquerda perto do que parecia a escada. Em um "Blink" as luzes estavam acesas e eu finalmente conseguia ter visão de onde seguir. Observei as escadas que pareciam levar para o sótão do lugar. Um lugar promissor para se esconder documentos sobre semideuses recém chegados, será que eu iria encontrar algo sobre mim lá? Bem. Não era hora de pensar sobre isso.
Adentrei depressa o escritório de Quiron que estava destrancado e comecei minha busca minúcia por gavetas e caixas de papéis.
– Onde um centauro guardaria um monte de papéis sobre uma menininha recém chegada?– Pensei alto, continuava bagunçando as gavetas em busca de qualquer coisa que pudesse parecer informação. Entre os clipes de papéis e lápis, encontrei um souvenir engraçado no formato de um raio-mestre. Eu não sentia realmente a necessidade de toma-lo pra mim, afinal era só um pequeno raio, mas meu instinto fez com que eu pusesse ele no bolso sem pensar muito.
– Achei que íamos pegar meus papéis e dar o fora. – Agnes surgiu atrás de mim como um vulto. Soltei um suspiro exasperado de susto, minha respiração acelerou e meu peito batia depressa.
– Você quase me matou! Eu não disse pra ficar lá fora? – Tirei o raio-mestre do bolso e larguei dentro da gaveta novamente. Era melhor deixar aquilo pra trás, Quiron daria falta e provavelmente iria atrás do ladrão de raios.
– Eu sei, eu sei. Você disse, mas eu estava assustada lá fora. – Agnes cruzou os braços casualmente. Ela tinha os cabelos louros escuros presos em um coque, a pele do seu rosto não via sol a uns bons anos mas suas bochechas eram de um tom rosa saudável. O que mais me impressionava nela eram os olhos de um tom que eu desconhecia, um tipo de cor de oliva amarelado as vezes verde, pareciam com um olhar de lince. Mas ainda assim, um lince terno e bonzinho. – Não vou atrapalhar.
Suspirei. Não podia mandá-la de volta pra rua.
– Certo, tudo bem. Você pode ficar, só... faça o que eu disser e vamos sair depressa. – Cocei a testa pensativo. Nós ainda tínhamos que entrar no sótão que parecia escuro e bizarro e nada convidativo, mal podia imaginar o que aquele lugar escondia. Pelo menos eu esperava que os documentos estivessem lá.A primeira vez que entrei naquele prédio grande eu havia acabado de me acordar de todo o pesadelo. Quiron estava em sua forma natural, parado diante do pilar da varanda. Tinha os braços cruzados observando o horizonte logo a frente, quando pousou os olhos velhos em mim logo ergueu as sobrancelhas com curiosidade. Ele parecia já ter me visto, mas eu nunca o vira antes.
– Bom dia, Luke. Vejo que acordou. – Deu um breve sorriso, mas logo tornou a ficar sério. – Meus pêsames, sei que fez seu melhor para proteger as duas.
Eu não disse nada, apenas balancei a cabeça positivamente. Ninguém precisaria estar me de desejando melhoras ou me felicitando por cuidar tão bem de alguém se Zeus e Atena fossem bons pais. Nenhum de nós tinha idade para ser responsável por cuidar uns dos outro, mas achei que Quiron não estava interessado em ouvir mais um monólogo sobre como nos semideuses não concordamos com a vigência divina.
– Bem, se que deve estar zangado com o velho Hermes por tudo que vem acontecendo. Mas não podemos nos agarrar a isso, Hermes é o deus da velocidade e é tão volátil quanto. Todos eles são, por isso esse lugar existe. – Quiron deu um suspiro, como eu disse, ele já devia ter explicado tudo aquilo para outro revoltado a pouco tempo.
– Não preciso que me diga nada disso, eu já sei e não podia me importar menos com ele. – Apertei meus dentes com raiva pressionando meus lábios. – Eu posso cuidar de mim mesmo, afinal de contas.
Senti uma lágrima escorrer pelo meus rosto enquanto eu segurava meus punhos com força. Quiron se aproximou e largou a pesada mão sobre meu ombro.
– Filho, vai encontrar seu lugar aqui conosco. E as coisas vão ser menos difíceis. – Ele concordou com a cabeça e um longo suspiro. Eu sabia que Quiron devia ter mais de 2 mil anos de idade e que ele provavelmente já vira muitas histórias como a minha, mas ainda assim, ele parecia se importar. Geralmente criaturas que vivem tanto, passam a não sentir mais tanta empatia por nada, mas Quiron não. Ele se importava com cada herói que passava por ali e tinha o mesmo olhar cuidadoso com todos, o que me fazia confiar muito mais nele que em qualquer deus. E a última coisa relevante de que me lembro, foi ter caído em um chororo muito intenso, do qual me envergonho um pouco.
– Luke? Você está legal? Tá olhando pra escadaria a uns 2 minutos. – Agnes tocou no meu de leve, me trazendo de volta do meu transe de memórias.
– Hã...Sim! Eu estou ótimo. Temos que subir ali, acho que pode ser onde guardam os tais papéis. – Movi as mãos a chamando e fui subindo as escadas pé por pé, bem devagar. Estava muito escuro e mal conseguia enxergar um palmo na frente do meu rosto. Mas incrivelmente, Agnes parecia estar se localizando perfeitamente. Eu não conseguia imaginar como ela podia enxergar os degraus naquela escuridão, mas ela estava. – Agnes você consegue enxergar a maçaneta?
– Sim? Não está assim tão escuro. Você não vê?
– Está completamente escuro. Do que você está falando? – Franzi a testa. Estava mesmo muito escuro, não devia haver uma luz sequer. – De qualquer maneira. Pode me levar até ela?
Ela pegou meu pulso com gentileza guiando minha mão até a maçaneta fria e redonda. Estava trancando é claro, mas consegui me concentrar o suficiente para que em um pequeno som de estalo voila...estava aberta. "Isso é muito maneiro " disse Agnes espantada. Eu dei um sorrisinho contido e nós atravessamos a porta escura.
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Agnes Morana e os olimpianos
FantasyAgnes tinha sérios problemas na casa em que vivia com seus pais adotivos. Coisas muito estranhas aconteciam com as paredes quando ela sentia raiva, pedras engraçadas surgiam do chão para protegê-la. Criaturas bizarras vinham em sua procura e uma voz...