Disappearer

148 21 94
                                    

Looking out, I'm back in time to stay

Into the eastern, sign away

It comes alive through the clearer

The ghost arrives into your mirror

— Disappearer, Sonic Youth

***

Nova Iorque, 15 de abril de 1987

Não havia nada mais cru que o cinza daquela cidade. No telhado da escola, os olhos de Nico pairavam sobre a selva de pedra que era a cidade de Nova Iorque. Seu tormento pós-fuga da aula de literatura o fazia questionar se algum dia teria o mesmo encanto de seu pai ao de contemplar aquele lugar.

Os prédios esvaeciam no campo de visão do menino, o qual temia saber que não era o fim da cidade, nem do seu tormento. Restava-lhe erguer a cabeça e deparar-se com o céu rosado na maior parte dos dias, mas, incomodado, fechava os olhos com o ruído dos carros, e os sons das aves tornavam-se sua única companhia.

Chegava a ser patético. Em outras situações, ele não beiraria à infelicidade e à miséria do presente. Deu um sorriso debochado para o nada, quiçá estivesse usando o drama aprendido com a irmã e fosse mais grato.

No fim, era poeira. Não deveria se importar; porém, Nico era ciente demais e, mais uma vez, a consciência era a sua maior inimiga em uma guerra travada contra si mesmo.

Naquele momento, chegou à conclusão de que o cinza da metrópole não era o único ali.

Seu espírito era nublado.

Então, quando Thalia chega ali, ele é finalmente descoberto. A garota diz algo que ele não entende, mas, a julgar pela sua expressão, ela aparentava estar um pouco desapontada e frustrada, pois Nico não a dignava uma única resposta.

***

Quando Jason chegou, empolgado e com alguma porcaria alimentícia em mãos, na mesa do refeitório em que estava sentado, Nico deu um leve sobressalto, desacostumado com pessoas indo em sua direção, mas tudo bem; afinal, era Jason daquela vez, e ele estava com comida.

Se algo que tinha gostado dos irmãos Grace, era o modo com que agem com quem já consideram próximos, uma espécie de cuidado que não precisava de palavras, para a euforia de Nico, para ser efetivada. No início, ele estranhou, é claro; não era costumeiro alguém ser tão hospitaleiro e afetivo consigo, mas, desde que se conheceram, Thalia o ajudava a achar as salas nos primeiros dias, mesmo que depois ele encontrasse a saída por conta própria antes do fim das aulas, e Jason sempre o acompanhava nos intervalos.

Fora as vezes em que os dois irmãos tentavam um diálogo mais complexo em inglês para ajudar Nico — que não conseguia dizer que não tinha o menor interesse em aprender a língua. Eles não eram tão irritantes, Nico ficava sem graça de soltar seus palavrões no idioma materno, mesmo sabendo que eles não iriam entender nenhuma palavra.

Mas, naquele fatídico dia em que Nico estava aborrecido, seus ouvidos conseguiram captar algumas coisas que Jason falava.

— Batalha de bandas? — perguntou, baixinho.

Os olhos azuis de Jason brilharam ao ouvi-lo.

— Isso! Você conseguiu entender o que eu disse?

Nico ergueu a palma de uma de suas mãos, balançando-a.

— Espere!

Não era como se ele fosse sair dali mesmo.

Jason volta com um enorme dicionário de italiano-inglês para o refeitório. Nico quer afundar na cadeira quando ele bate o objeto com muita empolgação na mesa, as batatas quase voando em todas as direções.

Apoteótico | SolangeloOnde histórias criam vida. Descubra agora