Não sangram mais

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Sei que não precisava vir aqui, me disseram isso muitas vezes quando mencionei, e agora, olhando para o homem impassível do outro lado do vidro, começo a me perguntar se não estavam certos. Não sei como iniciar essa conversa, não sei o que pensar e o que esperava, mas com certeza não era essa ausência de reação que meu pai aparenta ao me encarar de volta.   Finalmente pigarreio e digo algo.
- Nunca te vi de laranja.
Ele pisca confuso e então me olha com desaprovação.
- O que você está fazendo aqui?
- Ainda não sei...
- Vá embora!
-Por que você fez aquilo?
Ele desvia os olhos e parece pensar por um momento.
- Eu não gosto de você! Nunca escondi isso. Mas você é meu filho. Eu amava vocês.
  Fico em silêncio capturando cada uma das suas palavras, que parecem difíceis de serem usadas quando ele tenta falar sobre seus sentimentos.
- Quando Bianca se foi...não consigo dizer o quanto isso acabou comigo. Se tivéssemos visto que ela estava doente antes... Sua mãe nunca deixou de se culpar, eu nunca deixei de me culpar, e você estava ali e sua irmã tinha partido. Sei que não devia ter descontado em você, mas eu não te entendo e com ela...era a minha garota. Eu devia ter cuidado de vocês, ter garantido que Maria ficasse bem, nunca ter deixado você sofrer desse jeito... Vi isso quando fiquei sem vocês, e quando Hazel me culpou pelo seu sequestro. Eu estava sozinho, jogado nos escombros da destruição que eu mesmo causei. E quando quis saber de verdade o que fiz você passar, quando parei de fugir da verdade... Não me arrependo, ouviu? O mataria de novo, o faria sofrer se pudesse. Porque você é o meu garoto! Eu não gosto de você e sei que você deve me odiar, mas eu te amo, e matar o homem que te fez tanto mal é minha pequena redenção.
  Suas palavras são como socos em meu estômago, não posso respirar,meus olhos querem lacrimejar, mas evito piscar, se eu chorar agora sei que ele vai desejar me dar um murro, digiro suas palavras e respondo quando penso que minha voz não vai me trair.
- Eu não te odeio! Não gosto de você, já te odiei, mas você é meu pai e eu te amo.
- Não venha mais me visitar, nunca mais volte aqui!
- Eu vou vir, e vou trazer a Hazel.
- É por atitudes assim que você nunca vai ser meu preferido.
- Nunca ousei sonhar tal coisa.
Ele me encara irritado e então faz algo que me surpreende, sorri e diz que o horário de visita acabou antes de desligar e sair, fico encarando o espaço que ele deixou para trás com um sorriso triste, descreveria a sensação como agridoce, é a primeira vez em anos que chegamos perto de nos dar bem.

## 2 anos depois

Leio a carta mais uma vez, com essa deve ser a vigésima olhada que dou nela, o loiro bate na porta outra vez me apressando, termino de apreciar o convite para o treinamento no F.B.I ao qual realmente cumpriram a promessa de me chamar quando tivesse idade o suficiente, e desço para receber meus amigos.
Piper me dá um abraço apertado me desejando feliz aniversário, Jason está ao seu lado, todos que eu gostaria que estivessem aqui se fazem presentes: Reyna e Thalia, Luke e Anabeth, Cecil, Lou, Tyson, Chris, Drew, Percy em um improvável relacionamento com Léo, Frank acompanhado da minha irmã é claro, e meu namorado.
Se eu tivesse organizado isso não daria tão certo, mas o loiro convenceu nossos pais a saírem e deixarem a casa para haver uma festa de aniversário memorável já que em breve irei ir para o outro lado do país começar o treinamento.
A situação fica incontrolável bem rápido, há bebidas espalhadas pela enorme casa de Apolo, é onde vivemos agora (é ridiculamente incrível ser irmão postiço do seu namorado), Tyson e Anabeth estão levando muito a sério o jogo de acertar a bola no copo, Drew está em uma discussão amigável com Piper, e em resumo todos estão bem bêbados e rindo de coisas idiotas.
Arrasto meu namorado para longe do caos, um lugar mais calmo e privado (anrham) meu quarto, avanço em seus lábios com desespero, como se não o beijasse a tempos, ele me corresponde com a mesma intensidade, o conduzo discriminadamente à cama, marco seu pescoço e desbravo seu corpo, cada centímetro precisa ser tocado, necessito cravar uma bandeira em toda essa terra, para ele saber que é meu, e quero que ele também me reivindique, o caos é aqui dentro agora, e a destruição é o que resta quando tudo se acalma.

Ainda sinto que estou de ressaca e já é a noite do outro dia, deixo Drew no vácuo e estou quase dormindo quando ouço a porta ser aberta, vejo um certo loiro se esgueirar gatuno e deitar ao meu lado, não somos explicitamente proibidos de dormir juntos mas é sempre bom evitar constrangimentos no dia seguinte, porém quando ele me abraça não penso em nenhuma possível consequência.
Finalmente estamos nesse ponto, onde tudo parece estar indo bem, estou sendo abraçado por quem amo, Minos está morto e os outros presos, minha mãe está bem e feliz, visito meu pai regularmente e não nos odiamos mais, tenho uma irmã de novo, agora não minto todos os dias para os meus amigos, minhas cicatrizes não fecharam mas já não sangram mais.

Anjo Caído ( Nico Di Angelo) Onde histórias criam vida. Descubra agora