1.

1.7K 102 59
                                    

AMANDA

Suspiro quando o líquido quente entra em contato com meu paladar e engulo o café. Eu juro, seria capaz de casar com a pessoa que resolveu colher uma planta, torrar e misturar na água quente, dando origem à melhor bebida do mundo...

É...acho que já deu pra perceber o rumo que meus pensamentos tomam quando eu tô há quase vinte e quatro horas sem dormir. E é exatamente por isso que o café é a minha vida.

Afinal, como eu poderia aguentar todo esse tempo sendo uma médica num hospital cheio de pacientes sem essa maravilha?

— Namorando o café de novo, doutora?– Cezar, um dos enfermeiros do hospital em que eu trabalho, pergunta ao entrar na sala de descanso dos médicos.

— Mas é claro. Ele sempre está lá pra mim, me bota pra cima e me deixa acordada. Se eu pudesse ma casar com uma comida, seria com o café...— digo dando mais um bom gole da minha xícara. Cezar começa a rir de mim– É verdade que eu me casaria com quem inventou o café também. Se não tivesse morrido há séculos...

— E com alguém de verdade?– ele pergunta se servindo da sua própria xícara.

— Não tem espaço na minha vida pra isso...– digo dando de ombros.

Da última vez que eu me permiti entregar meu coração a alguém, essa pessoa brincou com ele e o despedaçou. Ele me transformou em algo que eu mesma desconheço. Esses relacionamentos te sugam tanto que você só percebe o que realmente acontecia quando sai deles.

A gente precisa de um tempo pra se curar quando passa por isso. Ainda estou passando por esse tempo, estou me reconectando comigo mesma, reaprendendo a me amar. Não acho que caiba uma pessoa na minha vida nesse momento.

— Bom, meu caro, deu minha hora...– digo me levantando e indo até o vestiário trocar de roupa.– Feliz Páscoa, Cezar. Até terça!

— Feliz Páscoa, Amandita!– ele diz sorrindo.

Por sorte, eu não fui colocada na escala de plantões de Páscoa, o que significa que vou poder tirar minha tão sonhada (e modéstia à parte merecida) folga. Vou voltar pro Paraná, pra passar com minha família, já que moro e trabalho em São Paulo.

Só faltam mais algumas parcelas pra eu terminar de pagar o FIES, então estou trabalhando praticamente dobrado esses meses pra quitar logo tudo.

Troco de roupa e vou saindo do hospital, já pegando meu celular pra mandar mensagem pra Larissa vir me buscar. Moramos juntas num apartamento, o que é bem mais fácil pra nós duas pois os gastos não são tantos.

Conheci ela no meu primeiro dia na faculdade de Medicina. Acabei me perdendo e indo parar na área errada do prédio, na parte de Educação Física, onde ela estudava. Larissa me ajudou a achar minha sala e acabamos nos aproximando depois disso.

Quando o aluguel do prédio dela subiu e ela precisou se mudar, ofereci meu apartamento pra dividirmos as contas e ela aceitou. Moramos juntas desde então e tem sido uma experiência bacana. Larissa é engraçada e alto astral e me ajudou bastante quando eu terminei meu relacionamento. Ela já me alertava sobre ele antes, mas eu infelizmente não dei ouvidos. Acho que muitas coisas poderiam ser evitadas se as mulheres tivessem "Larissas" em suas vidas e ouvissem mais elas.

Antes que eu mandasse mensagem pra ela, porém, o celular vibra indicando uma chamada do meu pai. Era uma vídeo chamada.

— Oi, pai!– digo.

— Oi, filha! Você vem passar a Páscoa em casa, não vem?– ele pergunta.

— Claro que vou. Já tô até saindo do hospital!– digo sorrindo.

Safe Inside | DocShoeOnde histórias criam vida. Descubra agora