8 - A Ordem de Poseidon

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No caminho de volta para o hotel, Coral foi no banco traseiro do Uber com Dante, enquanto Petrus ficou no banco do carona, recusando-se a ficar mais próximo do selaquiano. Coral não fazia ideia do que havia entre eles, mas pelo modo como ambos se comportavam, algo de muito grave devia ter acontecido no passado, o que apenas aumentava sua curiosidade e preocupação. 

Ninguém falou nada durante todo o percurso, o veículo imerso em um silêncio fúnebre causado pela adrenalina da recente fuga da boate e dos octopos, bem como pela estranha discussão entre Petrus e Dante. Ao lado da garota, o selaquiano permanecia sério e concentrado em um ponto às costas de Petrus. Ele parecia perfeitamente bem de saúde, como se não tivesse acabado de lutar sozinho contra uma tropa oficial inteira e depois servido de saco de pancadas para um delfine ressentido.

Coral queria muito saber sobre a história por trás daquela briga, mas achou por bem ficar em silêncio até estarem fora de perigo, e até que os novos amigos estivessem confortáveis em contar a ela.

Já no quarto, Petrus certificou-se de trancar bem a porta antes de ir tomar um banho demorado. Coral desconfiava que aquela demora excessiva era em virtude de Petrus ainda não estar preparado para encarar Dante, então resolveu aproveitar o momento a sós para tentar descobrir algo do selaquiano.

— Então... — começou ela, escolhendo as palavras com cautela. — Você vai me dizer o que foi aquilo com Petrus?

Dante inclinou o corpo para ficar de frente para ela. Ambos estavam sentados sobre o tapete felpudo da sala, as costas escoradas na parte inferior do sofá verde-menta.

— Por favor, não o culpe por sua agressão. Petrus ainda está muito magoado comigo, e com razão, mas agora que estou aqui pretendo conquistar o seu perdão.

Coral notou sua expressão de dor, e percebeu que a culpa o consumia por inteiro. Mas também havia algo mais... algo no modo como ele olhava para Petrus, com profunda devoção, como se não se importasse de ser um mero capacho.

— Vocês dois... estavam juntos antes?

Dante sorriu com tristeza.

— Não oficialmente. Petrus e eu nos apaixonamos enquanto estudávamos juntos na Academia. Naquela época, não havia distinção de raças, qualquer jovem atlante que tivesse interesse podia estudar no Centro, mas ainda assim o relacionamento de um delfine com um selaquiano jamais seria bem visto, porque nossas raças são rivais. Podíamos estudar juntos, mas não podíamos ser amigos ou nos envolver romanticamente. Para Petrus era ainda pior, porque ele estava destinado a ser o próximo oráculo de Delfos, o que significava que ele teria de cumprir certas... obrigações que o impediriam de ficar com quem ele desejasse...

— Eu sinto muito, Dante — Coral se viu dizendo, porque Dante tinha feito uma longa pausa, imerso em lembranças dolorosas. — Deve ter sido difícil para vocês dois.

— Sim, foi — retomou ele, suspirando. — Por isso Petrus me convenceu a fugir com ele para a superfície. Aqui poderíamos viver livremente, sem ninguém para impedir o nosso amor, mas as coisas não saíram bem no final.

— Por quê? Alguém descobriu sobre o plano?

— Não. Na verdade, nessa época as coisas estavam muito difíceis em Atlântida porque Caleo tinha acabado de assumir o trono e estava tomando várias medidas arbitrárias. Ele acabou com a política inclusiva do Centro Acadêmico, mudou o nome da capital para Netuna e expulsou os sirênicos mestiços da Cidade Alta. Mas para nós, selaquianos, foi ainda pior, pois ele nos declarou traidores de Atlântida e nos expulsou de sua guarda real, colocando os octopos no lugar. Aonde quer que fôssemos, éramos perseguidos, humilhados, até agredidos. Meu pai perdeu o emprego, chegamos a passar fome. Eu não podia abandonar minha família. Não podia deixar o meu povo. Quando chegou o dia combinado, eu simplesmente não consegui ir... é por isso que ele me acha um covarde.

Coral: A Ordem de PoseidonOnde histórias criam vida. Descubra agora