20. Nada

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HOGWARTS
2 DE DEZEMBRO| 1976
—— terça-feira

COM JOELHOS RALADOS, MAY NÃO escutou os passos de Minerva McGonagall. A ala hospitalar estava fechada na madrugada do dia dois de dezembro. Fechada para seis específicos alunos do sexto ano. Enquanto Hogwarts dormia, aquela pequena parcela estava acordada e tudo piorou quando Dumbledore também se encontrou no mesmo estado. Remus era o único desacordado, posicionado em uma das macas, as cortinas tentando lhe dar um pouco de privacidade que seja.

May estava em choque. Era o que todos eles sabiam. Ela estava sentada na ponta de uma das macas, encarando uma das paredes. Sua garganta seca, seus olhos também. Ela não os respondia, apenas encarava o nada. Não reclamava de dor, mesmo seu corpo apresentando cortes visíveis. Madame Pomfrey já havia cuidado dela e agora estava finalizando Snape. James havia caminhado com Sirius até a sala de Dumbledore. Lizzie tentava ajudar como enfermeira, ela havia pegado água, preparado poções, tentado fazer May comer um pedaço de pão de mel, na verdade, havia tentado tirar qualquer reação de Amaya possível, mas nada.

— May. Pode me dizer o que está sentindo? — A morena estava agachada na altura da cintura da loira, tocando em suas pernas. — May.. Vamos. Qualquer coisa. Eu estou aqui.

Mas o que Amaya poderia dizer? Ela nem ao menos sabia o que estava sentindo. Aquela bile em sua garganta, as tremedeiras em seu corpo como se seus ossos estivessem tentando sair da pele. Ela não sabia como descrever aquilo. Era como se sua vida tivesse resetado por um mísero segundo e mesmo assim tivesse mudado completamente tudo ao seu redor. Como descrever isso. Como.. Como perguntar se Sirius está bem mesmo depois dele ter causado cada tremor em seu corpo?

A sensação que havia transcorrido em suas veias após vê-lo em seu formato animalesco, nunca havia pensando em sentir antes. Ele era gigantesco, era um força da natureza e se ela já não estivesse no chão, talvez teria caído para trás. Esse era o problema. Ela não conseguia assimilar Sirius através dos olhos da criatura escura como a noite e ao mesmo tempo enxergava cada traço dele naquelas retinas dilatadas que a liam a alma.

Por que? Se perguntava repetidamente.

Lizzie continuava falando e falando, acariciando sua perna.

As portas da enfermaria se abriram. Lizzie se ergueu e May virou imediatamente para encara-lo. James passou diretamente para dentro, deixando o Black na entrada, parado, sem saber andar, se mexer, se desculpar? Merlim, como poderia se desculpar ao vê-la? Como poderia olhá-la nos olhos e vê-los marejados por sua culpa. Sirius não sabia como. Ele sentiu o maior senso de culpa que jamais havia sentido. Por muito tempo na verdade, o garoto se livrou daquele sentimento antigo. Após senti-lo sua vida toda, ele o renegou e começou a ser quem era, sem ligar para suas ações, falas, atos. Odiava o sentimento da culpa, mas por causa dela, havia retornado e o acolhido como um velho amigo.

Era culpado.

May..

— Não fale com ela. — Lizzie rosnou. Ela parecia cansada, mas sua face estava imbatível quando a colocou a centímetros da de Sirius. — Não olhe para ela, não se dirija a ela e não pense nela, Black.

Elizabeth. — James tocou em suas costas a fazendo encolher ao toque, fugindo da sensação como se tivesse a queimado. — Você está bem?

— Não é nada demais.

James a ignorou, se aproximando mais. A blusa da garota estava colada aos arranhões em suas costas. O vermelho do sangue fresco o assustou imediatamente. Ele a assistiu bater contra a árvore, mas não achou que estaria daquele jeito pelo modo que a garota se colocou de pé em menos de um minuto. Não deveria esperar menos vindo dela.

— Vamos falar com a Madame PomFrey.

— Eu não vou deixar ele sozinho com ela.

— Lizzie, vai. — May se pronunciou com a voz rouca. — Vou ficar bem.

Elizabeth sentiu suas pernas virarem pedra no local. Ela era incapaz de apenas ir. Amaya sabia disso, por isso assentiu para James levá-la. O garoto o fez, deixando os outros dois a sós. Sirius encarava o chão envergonhado e ela encarava ele fixamente. O silêncio que vinha do Black começava a irritar. Ela precisava de uma explicação, uma desculpa, até uma mentira, qualquer coisa menos nada. Menos o absolutamente silêncio. Ela merecia alguma coisa.

— Então? — Questionou.

Nada. Sirius abriu sua boca e fechou. A encarou de relance e se voltou ao chão. Fucking nada.

— Nada? — Ela aumentou o tom de voz. — Você não vai dizer nada? Olha para mim! — May levantou da maca, sem saber como não havia caído logo em seguida. — Se não vai olhar para mim, olhe para Remus. Vamos lá, olhe para ele.

Ela puxou a cortina que cercava o Lupin. Sirius sentiu seu estômago contorcer com a imagem. Seu melhor amigo tinha alguns machucados começando a cicatrizar, porém sua face ainda estava machucada. Imaginou que ele mesmo não deveria estar muito diferente, porém a adrenalina não lhe deixava sentir a dor.

— Diga alguma coisa, Sirius.

— Nada que eu disser vai ser bom o bastante, May.

— Mas diga, porra! Comece com alguma coisa.

— Eu sinto muito.

Ela empurrou ele. Seus braços doeram, mas May não ligou. Agora, ela tinha os olhos marejados e a respiração descompassada. Ela tentou parar um soluço, mas não conseguiu. Sirius sentiu uma fincada em seu peito ao ouvir aquele som. Ele fechou os olhos e mordeu o lábio interior.

— May, eu nunca quis te machucar. Nenhum de vocês. Eu só.. Eu não sei. Eu fiquei tão irritado.

— Pelo o que?

— Eu vi você beijando o Snape e eu.. Eu perdi a cabeça, May. Não consegui. Não.. Não.

Ela o empurrou novamente. Sirius apenas deixou. Eles ficaram a metros de distância pelo empurrão. May tinha lágrimas caindo livremente pelo seu rosto aquele ponto. Ela não sabia se conseguia se aproximar ou só afastá-lo novamente.

— Eu gosto de você, May.

— Vai se foder. — Ela murmurou.

Sirius abaixou a cabeça.

— É verdade.

— Vai se foder. — Exclamou, o empurrando novamente, e de novo, e de novo, repetindo a mesma frase. — Vai se foder, Sirius!

May apenas parou quando James a segurou. Ele colocou suas mãos em volta da garota e a apertou firme. Ela amoleceu um pouco, se sentindo tonta.

— Eu realmente sinto muito, Amaya. — Sirius tinha sua face molhada por lágrimas.

— Sabe, eu não sou burra o suficiente para achar que te conhecia. — Cuspiu as palavras. — Mas você se superou, Black.

— Você deveria ir, Sirius. — O Potter interferiu antes que a situação piorasse.

O mais velho assentiu, caminhando em direção a saída. Antes de fechar a porta, ele assistiu James envolver May em um abraço, a assistindo desmoronar no ombro do amigo. Ele caminhou pelo corredor sem reconhecer seus próprios passos, mas pior ainda, sem reconhecer a si mesmo.

𝐒𝐓𝐀𝐑 | 𝐒𝐈𝐑𝐈𝐔𝐒 𝐁𝐋𝐀𝐂𝐊Onde histórias criam vida. Descubra agora