Capítulo Quinze

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    Fungo algumas vezes andando a passos arrastados até o sofá e me jogo sobre o mesmo, me deitando em posição fetal e puxo a coberta sobre o meu corpo sentindo uma onda de vento frio invadir o cômodo; mexia no celular para passar o tempo e estava quase adormecendo quando ouvi um barulho na maçaneta e ergo meu tronco me apoiando nos meus antebraços e vejo minha avó, aparentemente exausta, passar pela porta com as mãos cheias de sacolas e me levanto em um pulo indo até ela para ajudá-la, levo as várias sacolas até a cozinha e as coloco em cima da mesa enquanto minha avó abre a geladeira pegando uma garrafa de plástico com água.

— E esse doce aqui? Você que fez? — Ela pergunta, retirando a vasilha da geladeira.

— Não, Maicon que trouxe... — Murmuro baixinho e ela me olha desconfiada. — Ele veio me visitar, saber como foi a consulta...  mas não ficou muito tempo, ele teve que ajudar a Camila no bar. — Desabafo, apoiando minhas mãos na pia.

— Ele tem sido bem atencioso com você né? — Pergunta e pelo sorriso no seu rosto, entendo suas intenções.

— Um amigo e tanto. — Sorrio timidamente olhando para o lado oposto, dedilhando o cimento da pia.


××××


    Hoje é a minha oitava sessão de terapia e minha avó não vai poder ir comigo, por isso pediu para que Maicon me acompanhasse.
    Depois de tudo o que aconteceu nossa amizade ficou mais forte. Ele passou a vir aqui todos os dias para eu não ficar sozinha, mas tudo nunca passou de amizade.
    Devido ao calor intenso, decido ir com um vestidinho rodado florido acima do joelho e uma rasteirinha branca com strass na lateral das correias; ficando o mais confortável possível.
    Terminava de pentear o cabelo quando ouço uma buzina no portão de casa, jogo uma água no pescoço para amenizar o calor e caminho até a sala deixando minhas coisas no sofá dando uma corridinha até o lado de fora.

— Quem é?

— Vamo que estamos atrasados. — A voz alta de Maicon ecoa do outro lado do portão.

    Retorno para a sala pegando meu celular e a bolsinha com os meus documentos, acendo o visor constatando que realmente nós estamos atrasados e apresso-me em fechar a casa e ir até ele.
    Chego cinco minutos antes da minha consulta e assim que termino de fazer a ficha ouço a voz angelical da psicóloga chamar pelo meu nome, antes de ir até ela, sorrio para Maicon sentado em uma das muitas poltronas vazias e ele manda um beijo no ar.
    Encontro a mulher que vinha em minha direção com um sorriso aberto e lhe dou abraço rápido, quando afasto seu corpo do meu observo seus olhos passearem por meu corpo pairando novamente em meus olhos.

— Você está aparentemente radiante, diferente das suas primeiras consultas que você chegava aqui aos prantos, sem conseguir falar nada.

— É. Estou ficando mais forte. Aos poucos estou melhorando. — Comento, seguindo ela até sua sala.

    Ela aponta para a namoradeira pedindo para eu me sentar e logo em seguida ela faz o mesmo com uma prancheta nas mãos; respiro fundo encarando ela por alguns segundos e vejo sua sobrancelha se erguer junto ao sorriso que se forma lentamente em seus lábios, como se ela esperasse que eu dissesse algo. Mordo os lábios com dúvidas do que falar primeiro e ela intensifica seu olhar sobre mim, percebendo meu nervosismo.

— Tenho tanta coisa para falar, sei nem por onde começo. — Suspiro, maneando a cabeça para os lados. — Já te falei que sinto alívio pela morte da minha mãe né? Wictor me procurou, sendo que ele nunca quis saber de mim, eu perdi o meu irmão mais novo, morto com vários tiros. — Faço uma pequena pausa entre as coisas citadas e ela murmura em concordância. — Mas agora eu estou bem, fiz amigos novos e eles me ajudaram a mudar.

— E esses olhinhos brilhantes tem algum motivo especial? — Pergunta, de maneira sugestiva.

— Não, na verdade... eu não sei! — Exclamo, indecisa com a minha resposta. — Tem um garoto, inclusive, ele que me trouxe hoje. — Completo, timidamente.

— Ah, que legal! Se você está gostando de alguém, é um bom sinal, não acha? No começo você não queria nem saber de ouvir a palavra AMOR. — Ela cantarola a última palavra, me tirando uma gargalhada alta.

    A consulta acaba e eu volto para recepção encontrando Maicon dormindo com a cabeça tombada no encosto da cadeira vazio ao lado, observado pelas demais pessoas que esperam para ser atendidas; rio nasalmente e caminho até ele dando leves toques em seus ombros para acordá-lo. Ele desperta e abre um sorriso tímido se endireitando na cadeira, olhando para as pessoas que o observam discretamente, faço uma careta e ele se levanta para finalmente irmos embora.
    Chego em casa e ainda no portão pego meu celular na bolsinha e vejo que há poucos minutos Kali me mandou uma mensagem me chamando para sair, mas estou exausta e aviso que preciso descansar e por isso não vou conseguir ir.

— Vou ficar aqui até sua vó chegar. — Ele anuncia, estacionando a moto na calçada de casa.

— Aé? — Pergunto sentindo minhas orelhas queimarem.

— É mocinha, bora lá! — Salta da moto e se coloca ao meu lado enquanto abro o portão.

    Entramos em casa e ele foi correndo direto para o sofá, se jogando todo largado em cima do mesmo, dou uma risada baixo e aviso que vou até a cozinha fazer alguma para gente comer; saio da sala a passos apressados e ouço a televisão ser ligada, aparentemente em um canal de desenho infantil.
    Separo o milho de pipoca e o óleo em cima da pia e quando me abaixo para pegar uma bacia em baixo do armário sinto o forte perfume de Maicon no ambiente, mas antes mesmo que pudesse olhar para trás, sinto sua mão em minha cintura e me levanto rapidamente com o susto e ele ri nasalmente me encurralando na pia, tento fugir, mas ele me impede movendo-se para o mesmo lado que eu ritmadamente, por algumas vezes.

— Para... — Minha voz soa fraca quando seus dedos tocam a lateral do meu rosto, tirando uma mecha negra que recai sobre meus olhos. — Maicon, eu... Eu não quero! — Viro meu rosto para baixo rindo baixinho, quando ele aproxima seu rosto do meu.

— Tá tímida, por que então?

— Eu... Eu... — Gaguejo, sentindo meu coração acelerar ainda mais com o toque quente de sua mão em minha cintura.

    Sua respiração fica mais próxima e eu não consigo me conter, o beijo com vontade, dando espaço para sua língua invadir a minha boca e sinto seus dedos serem enterrados nos fios de cabelo ralos da minha nuca, me causando um arrepio, abro um sorriso e ele faz o mesmo voltando a me beijar com vontade; seguro firmemente em seu pescoço puxando-o ainda mais contra mim, ofegando entre o beijo, ele morde meu lábio inferior e nos afastamos ofegantes.
    Olho timidamente para ele com a respiração irregular e ele maneia a cabeça para o lado olhando-me nos olhos; abaixo minha cabeça, mas ele toca em meu queixo me fazendo encará-lo e me dá um selinho demorado.

— Achei que isso nunca fosse acontecer! — Ele diz em um sussurro encostando sua testa na minha.

— Eu não tava pronta!

— Agora você tá? — Pergunta, sorrindo abertamente.

    Não respondo, apenas o beijo novamente, sentindo suas mãos deslizarem por todo o meu corpo; flashes de Diogo invadem minha mente e me afasto dele abruptamente empurrando seu corpo para trás com lágrimas nos olhos. Ele não fala nada, apenas me abraça sem encostar as mãos em mim, passando apenas os seus braços pelas laterais do meu corpo, e eu repouso minha cabeça em seu peito, sentindo o cheiro de seu perfume.

— Será que eu nunca vou conseguir ser feliz? — Murmuro choramingando contra o tecido de sua camiseta e ele beija o topo da minha cabeça demoradamente.

Sami: Sobrevivendo no InfernoOnde histórias criam vida. Descubra agora