capítulo 2

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— Então...

— Então?

Então lá estavam elas, muitos anos depois, uma em frente à outra, ambas abatidas. A assistente social percebeu a tensão no ar e preferiu deixá-las sozinhas para que pudessem conversar, mas não havia nenhuma conversa ali, o que elas poderiam dizer?

— V-você já sabia que eu era... que era eu quem...? — Clara tentou perguntar, sem saber como terminar a frase.

— Eu já estou aqui no Brasil faz um tempo, demorou para descobrirem quem era a... quem gerou a Alice, eu descobri ontem, eles te acharam hoje, então... — Divagou e Clara assentiu.

— Isso é estranho. — Comentou e balançou a cabeça.

— É, é muito estranho. — Concordou e Clara olhou para ela.

Helena estava diferente, os cabelos estavam mais curtos ainda, Clara chutava que era um corte pixie, o castanho dos fios estavam mais claros agora, os olhos ainda eram tão doces como ela se lembrava, mas agora pareciam cansados.

— Clara? — Ela chamou quando a outra ficou tempo demais sem dizer algo.

— Desculpa, eu... me distrai. — Balançou a cabeça.

— Você está diferente. — Ela disse tombando a cabeça para o lado.

— Você acha? — Perguntou e a outra assentiu.

Clara havia mudado desde a última vez que se viram, os cabelos batiam pouco abaixo do ombro agora e tinham as pontas claras, quase em loiro, ela usava uma maquiagem leve, mas que tinha sido borrada pelo choro, Helena quase ergueu a mão para secar seu rosto, mas se conteve.

— Como você lidou com a notícia? — A mais nova perguntou.

— Mal, muito mal mesmo. — Riu fraco e apontou para o rosto, que estava um pouco inchado pelo choro recente. — Você? — Perguntou de volta.

— Quando descobrimos a doença estávamos em Madrid, eu fiz todos os exames e quando me disseram que era impossível ela ser minha filha pelo fato de eu ser O+ e ela A-, busquei no histórico do doador de esperma e ele era O+ também, então ela realmente não podia ser minha filha, então eu vim pra cá e durante esse tempo foi muito difícil lidar com isso, contar pra ela, sabe? A doença, a troca de crianças, tudo ao mesmo tempo, é demais pra mim e foi demais pra ela. — Falou caminhando até o banco que tinha ali em frente e se sentando, sendo seguida por Clara.

— Como você contou pra ela? — Perguntou encostando a cabeça na parede, olhando para Helena, que fez o mesmo.

— Eu só disse a verdade, acho que a sinceridade é o melhor nessas situações. — Disse dando de ombros e suspirando.

— E como ela reagiu?

— Bem pior do que eu imaginava no começo, mas depois ela só deixou pra lá, ela disse que eu era a mãe favorita dela e ela podia ter duas mães. — Riu.

— E sobre a doença?

— No início ela estava confiante, sabe? Mas depois, eu não sei se por conta do cansaço que a quimio gera nela, ela foi ficando menos alegre e tudo piorou quando a menina do quarto ao lado do dela no hospital do câncer morreu esperando um doador de medula, agora ela acha que vai morrer e eu não sei como convencer ela do contrário, por que sinceramente se você não puder ajudar eu... eu não sei o que pode acontecer. — Disse sentindo seus olhos encherem d'água e olhou para cima tentando não chorar.

— Ela começou o tratamento a muito tempo? — Perguntou.

— Faz um mês mais ou menos, descobrimos a doença um pouco tarde então ela já começou com as sessões de quimio. — Deu uma pausa. — Assim que os cabelos começaram a cair ela insistiu pra raspar a cabeça toda.

entrelaços | PARADAOnde histórias criam vida. Descubra agora