A bicicleta descansava nos fundos da loja. Me apoiei na parede e comecei a pensar em como eu me sentia sobre tudo o que havia rolado ontem, mas acima disso, como ela se sentia sobre isso. Eu só vou saber quando eu perguntar. Senti a ansiedade se arrastando com seus pensamentos pesados, agora não é a hora pra isso, joguei as mãos no rosto e respirei fundo. Abri um sorriso. Fui até o interior da loja.
Lá estava ela, e assim como a lua, ela estava imóvel e com seu brilho pálido, mas apesar de imóvel a sua imagem me seguia aonde quer que eu fosse, nunca um apelido fez tanto sentido assim. Cumprimentei-a e ela sorriu encabulada, estávamos respirando o mesmo ar mas o dela parecia mais pesado. Eu não ía saber até perguntar:
_Dá pra ver que você tá incomodada sobre ontem.
_O que? Sobre ontem? Ah não, eu... eu tô meio assim por causa da minha mãe, sabe como é, ela não consegue me deixar em paz por um segundo. _Lua esfregou os dedos como se quisesse aquecê-los.
_Tá, pode ser, mas não tenta mentir pra mim, eu sei que tem mais aí. É por causa de ontem, certo? Pode falar, cara, somos... amigos.
_Bem, eu não estaria sendo sincera se dissesse que é mentira. Eu... eu não queria ter feito aquilo, quer dizer, não que você me forçou ou que foi ruim, longe disso, foi tranquilo e eu gostei, eu quis, mas no fundo eu não queria... E eu quero na verdade assumir algo, mas não assim...
_Não quer só ficar.
_Isso!
_Então você quer dar um passo? _ Minhas mãos estavam esfriando.
_Não, eu... eu não quero isso. Mas eu não quero ficar, eu não tô pronta, e não teria como. Eu não quero só emoção! Argh! Qual o meu problema! Por que eu não consigo simplesmente falar o que sinto!?
Baixei a cabeça, ela não quer nada. Já entendi.
_Calma, acho que saquei , você gostou e tudo mais, mas foi no calor do momento, você não quer um replay por que quer algo sério, mas o algo sério não é comigo.
_Sim! Como você consegue? _Ela parecia aliviada por ser compreendida, mas logo em seguida, algo lhe pesou de novo.
_Bem, eu acho fácil entender os sentimentos dos outros. _Só o dos outros.
_É... sabe, eu sinto muito. _Lua desviou o olhar. Dei a volta no balcão e apoiei as mãos em seus ombros:
_Gabriela, escuta. Pra você, no seu mundo, talvez não seja normal isso, mas pra mim tá tudo bem . Isso rola, sabe? Beijar alguém, algo casual, depois sair e não fazer isso de novo, as vezes a gente se beija mais, mas na real, não tem problema. Eu não vou ficar chateado, e a nossa amizade não vai acabar só porque... _Dei um sorriso maldoso._ só por que eu sei qual o gosto da sua boca...
_Sai fora, Island!!
Rimos um pouco e o ar voltou a ser leve.
_Olha, e para de falar como se eu vivesse em outro mundo! Eu sei como são essas coisas!
_Ok, mas me fala, Lua, só por curiosidade, por que você não namoraria comigo?
_Hmmm, bem, primeiro, eu tenho me sentido inconstante eu certas coisas, eu não quero arrastar alguém pra isso. Segundo, eu tenho uma idéia de como é alguém que eu queira estar junto. Alguém que me respeite, bem humorado, que me apoie e que me deixe livre pra apoiá-lo também, mas acima de tudo, alguém que pense como eu, que ame a Deus. Island, você tem tudo isso, mas você não ama a Deus. Você nem acredita nele! É algo que conta muito, sabe? Eu não vou negociar algo que conta muito.
Ouvir aquilo de certa forma doeu, afinal, por causa de uma pequena coisa eu vou ser apenas amigo. Mas talvez tenha sido libertador, eu não vou mudar quem eu sou e o que penso só pra estar com alguém, e ainda que eu mude, isso uma hora não vai dar certo, porque eu não estaria acreditando de verdade, fingir cansa, e eu tenho andado cansado de mais pra isso. Ainda assim, algo doía.
Ignorei isso e sorri, um sorriso bem aberto e tranquilo:
_Está bem. Ah, hoje já é capaz de aparecer mais gente na loja, então... vamos nos preparar!
Ela acentiu e começamos a organizar as coisas, liguei o som e enquanto os clientes não apareciam, conversamos sobre a Estrela. E isso me fez lembrar que preciso comprar um novo vaso de planta e algo para aquela gata pular e se divertir, se não vou ficar sem apartamento!* * *
Já em casa, me certifico de não ter perdido outra planta, ou talvez um móvel... peguei a guia e coloquei na gata que se desmanchou no chão como mercúrio. Eu precisava comprar um vaso de plantas antes que eu enfezasse e resolvesse jogar aquele "treco de são Jorge" fora, e também, uma diversão para a Estrela, mas... no momento, o melhor a se fazer é usar a "técnica infalível contra animais e crianças!" Cansar eles. Eu vou cansar a Estrela andando com ela daqui até a loja. E é isso.
A gata obviamente não queria usar a guia, mas eu não seria vencido por um simples deitar no chão. Depois de algum tempo de insistência e persuasão com comida, aquela bolinha de pêlos resolveu me seguir pela escadaria.
Fazia muito tempo que eu não andava a pé por esses lados, eu sempre saio de bicicleta, até para comprar pão! Mas, pensando bem, tenho andado mais nesses últimos dias desde que... desde que reencontrei a Gabriela. Meu coração acelerava a cada pensamento sobre ela. Embora eu tenha disfarçado bem, hoje foi um dos dias que mais pensei nela. Eu preciso parar com isso. Soltei uma risada alta no meio da rua, até Estrela parou pra me olhar, acho que essa gata é na verdade um filhotinho de pantera, qualquer movimento meu é motivo para ela se abaixar como se fosse me atacar e vir morder e arranhar meu pé. Vou comecar a andar de tênis. Estrela pulava entre as gramas que brotavam nas rachaduras das calçadas e se desviava dos pés apressados das pessoas. Não demorou muito para chegarmos até a floricultura, que estava fechada, na verdade, acho que não iria abrir nunca mais, até a placa havia sido tirada! Droga! Eu gostava daquele lugar! Era pequeno, faltava algumas coisas básicas, a atendente era uma velhinha caolha que dava biscoitos murchos, mas era um bom lugar! Sei lá, era aconchegante. Chutei uma pedrinha no chão que rolou até o calcanhar de um cara.
_Hm, precisa de alguma coisa? _ O homem esguio de voz rouca me encarou. Ele era engraçado, apesar das roupas largas, podia-se ver que ele era bem magro.
_Ah, foi sem querer, ei, o senhor poderia me dizer se tem algum outro lugar que venda plantas por aqui? Ou vasos de plantas?
_Bem ..._ O homem tirou um charuto excepcionalmente grande do bolso e o acendeu, fazendo uma pausa dramática desnecessária. Depois de tragar e soprar a fumaça tóxica fazendo-a se espalhar pelo ar, ele me olhou com despeito. _Alí, bem do outro lado da rua, tem uma casa de ração, abriu há pouco tempo, vende coisas para animais e jardinagem.
Segui seu olhar e senti as bochechas queimarem, do outro lado da rua, muito bem iluminada por um poste, e em cores bem marcantes havia uma casa de ração. Como eu consegui não ver isso!? Acenei pro cidadão carrancudo que me ignorou e voltou a encarar a rua, e fui até o local. Era bem bonito e já estava pra fechar, é o horário.
Arrastei o olhar pelo local e me aproximei do balcão ainda encarando as estantes ao meu redor:
_Ei, será que você não teria um vaso de plantas legal e alguma coisa pra distrair gatos?
_Hm... se não é o apressadinho.
Finalmente encarei a atendente. Encontrei um par de olhos âmbar me encarando:
_Lúcia?
_Olha, ele acertou meu nome!
_É... E não é que eu acertei. Nossa, que cidade pequena essa né? Eu nunca imaginaria que iria te encontrar aqui.
_Tem certeza? Aposto que andou dando um de stalker pra me encontrar.
_Hm, aposte o que quiser.
Ela sorriu e deu a volta no balcão. Andou até o lado com vasos de planta:
_Qual você quer?
_Ah, droga, eu costumo ser bem indeciso... hm... olha, a planta que eu comprei já veio com o vaso dela, então não faço idéia, é uma "faca de São Jorge "não é muito grande, então acho que um vaso pequeno daria.
_É uma... o quê?
_"Faca de São Jorge"
_Espada..." espada de São Jorge".
_Ah, você entendeu.
A mulher revirou os olhos e pegou um vaso, deve servir. Depois andou até o lado para animais. Apontou para um treco de escalar e falou o preço, 70 reais é bem salgadinho e eu francamente não queria gastar essa grana, na verdade, eu não tava nem planejando ter um bicho! Olhei para a mini pantera do meu lado, seus olhos brilhavam enquanto ela encarava o "escalador". Vou levar.
_Bem, eu vou ter que dar meus pulos pra arrumar isso lá no meu "apertamento". _Me virei com as sacolas e a gata, quando de repente sinto uma mão no meu ombro.
_Ei, posso te ajudar com isso!
_Como?
_Bem, acredite ou não, eu fiz curso de dsigner de interiores, posso te dar uma ajuda lá com essas coisas, Apressadinho. _Passei os olhos pelo relógio, obviamente já era noite. 20h. Voltei o olhar pra ela.
_Hm, não sei, você tem que terminar de fechar a loja, não? E... já está tarde, fora o fato de que é um caminho um tanto... cansativo até lá.
_Não tem problema, a loja é da minha tia e é ela que fecha, eu não ligo muito para horários e se o caminho for cansativo, aí sim que você precisa de uma companhia. _Ela passou por mim e pegou a sacola com o vaso. Gritou algo para a tia que estava nos fundos da loja e fomos.
Andamos e conversamos um pouco. Não tínhamos muito em comum, o caminho foi sobre nossas experiências em lojas e clientes chatos, era o que tínhamos.
_Chegamos.
_Você mentiu pra mim.
_Por que?
_Você disse que o caminho era cansativo, mas não é, basicamente só seguimos a rua em linha reta e viramos algumas vezes. Isso não é cansativo.
Abri o portão e fomos até a escadaria, Estrela se deitou no chão com um miado desanimado. Peguei-a e a coloquei no bolso da blusa. Me virei para a mulher do meu lado:
_O caminho cansativo é esse. _Apontei para a escada.* * *
_Ah, acabamos, finalmente! _Lúcia sorriu e caminhou lentamente até a pia para lavar as mãos.
_É, valeu pela força com a planta e com o "escalador" da Estrela.
_Ah, francamente, isso nem foi dificil, o desafio mesmo foi aquela escadaria. _Ela secou as mãos e se aproximou. Caminhei até a cozinha:
_Quer tomar alguma coisa? Um suco, uma água...
_Uma água.
Caminhei lentamente até ela com o copo na mão, ela tomou mas ainda me encarava por cima do copo. Os olhos cor de âmbar eram bem atrantes, lembro que eram bem mais escuros na festa, mas agora que ela está aqui, posso perceber os detalhes. Lúcia me entregou o copo e eu o repousei num móvel na minha sala/quarto, ela me encarava sem parar. Senti um arrepio, eu sabia onde aquilo iria parar, mas... não, não vai rolar nada.
_Quer mais alguma coisa? Eu não sei se você comeu algo, se está com fome, com vontade de comer.
_Não, eu não tenho fome, mas... eu quero algo. _Ela já estava bem perto, seus olhos me prendiam de uma forma estranha ela segurou meu rosto e me beijou, um beijo frenético que de primeiro não correspondi, ela se afastou lentamente e me encarou. Seu decote era bem aparente. Eu sentia como se estivesse prestes a trair alguém, mas eu não tenho compromisso com ninguém! Eu não preciso me sentir assim! Pensei na Gabriela, não era o mesmo beijo, óbvio, não era a mesma pessoa. Pensei em... pensei no que rolou naquele dia. Aqueles sentimentos na praça. Mas eu não acredito naquilo. Era como uma balança, de um lado, o que me impedia? Nada, eu não tenho compromisso com ninguém, e sentimentos não são provas. Do outro lado, o que me impulsionava? Tudo, ela estava alí e eu aqui, e eu ansiava.
_Pode ser casualmente. Não precisa ser algo sério. _Ela sussurrou enquanto deslizava o rosto pelo meu pescoço.
_Tem certeza que quer algo casual comigo? Não vá se arrepender...
_Seu amigo me disse que você não gosta de se prender, e eu também não, é perfeito.
_ok.
Precionei-a na parede e a beijei, dessa vez fui tão frenético quanto ela, nossas bocas se chocaram e ela mostrou que não brincava em serviço, me empurrou para a cama. Meu coração disparou e eu a segurei. Eu quero ver essa obra de arte.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Como Sol e Lua
Lãng mạnIsland, escreve assim, mas se diz "aisland",um nome incomum, para um cara incomum, mas isso não é sobre meu nome, então vou tentar explicar... afinal, para que eu dificulto e enrolo tanto?! Isso aqui é sobre eu ter me apaixonado, sobre estar amando...