SOFIA
― Por que você fez isso, Sofia?! Por quê...?! ― Em pé, a minha mãe estava descontrolada. Andava de um lado para o outro, a mão firme balançando no ar, os olhos em erupção... Suspirei, cruzando os braços no peito. Já tinha respondido à sua lista de perguntas sobre o horário que saí, como saí e para onde fui. Agora o sermão vinha. ― Sabe o que podia acontecer com você, entrando em carro de gente desconhecida?! Como você não vê o quanto é perigoso?!
Para mamãe, tudo sempre foi perigoso.
Escalar? Perigoso. Brincar de esconde-esconde na rua? Perigoso. Andar de bicicleta aos arredores do sítio? Perigoso. Ir a excursões de escola? Perigoso.
Ela só não se dava conta de que, se fosse para evitar todos os perigosos da vida, ninguém poderia sair de casa.
― Pelo amor de Deus, não é como se eu tivesse encontrado um motorista qualquer na rua e pedido carona...! ― eu respondi, ao contrário dela, parada ao lado do sofá. Papai estava entre nós duas, sem chance alguma de entrar na conversa. ― Fiz isso por um aplicativo, igual a um monte de gente faz todos os dias!
― E só por que todo mundo faz você tem que fazer, também?!
Ah, a clássica!
― Não. O que eu tô dizendo é que não me coloquei em perigo, não peguei um Uber pra dar bobeira por aí...
― Uma adolescente andando sozinha por São Paulo é dar bobeira, Sofia ― mamãe me cortou.
Suspirei outra vez e me segurei muito, muito mesmo, para não revirar os olhos. Como ela podia ser tão dura, sem habilidade alguma para analisar as coisas por outro ângulo?! Era sempre só a sua perspectiva de tudo!!!
― Pois é... ― comecei a dizer, sem conseguir conter o tom irônico, já que estava focada nos olhos. ― Igual a postar uma foto na praia é dar bobeira, é estar pedindo pra ser assediada em vários grupos de Whatsapp e em fórum de internet... Com esse perigo ninguém se importa, né?
Por um momento, mamãe parou de disparar perguntas violentas na minha direção. Era culpa por não ter me defendido quando precisei dela? Ou era apenas indignação porque eu conseguia me defender sozinha?
― Eu me importo ― papai, uma vez que viu a oportunidade, entrou no meio da discussão. Quando me recebeu lá fora, colocando a mão nas minhas costas, tudo o que conseguiu me perguntar foi se eu estava bem, porque logo em seguida mamãe apareceu disparando pergunta atrás de pergunta. ― A primeira coisa que vou fazer amanhã de manhã é ir atrás dos pais desses moleques. Com uma advogada ― ele falou, olhando nos meus olhos sem titubear.
Eu me calei junto à minha mãe, mas, diferente dela, não foi porque fiquei sem argumento.
Foi de alívio mesmo.
Finalmente alguém encarou com sensatez o que aconteceu comigo, com as minhas amigas. Na escola, Marcos não se importou, mamãe ignorou, Téo só queria saber de porrada...
Era isso que eu precisava ouvir. Era de um adulto como você que eu precisava nisso tudo.
Descruzei os braços e, com os olhos e nariz coçando, fui até o meu pai. Ainda estava envergonhada por ter mentido para ele, só que isso acabou ficando em segundo plano quando a necessidade de o abraçar me invadiu. Afundei a cabeça no seu peito e cruzei os braços em torno do primeiro homem que amei, pelo qual fui amada. Ainda sentia esse amor fortemente, apesar da falta entre nós.
― 'Brigada, pai ― sussurrei, sentindo as suas mãos me aconchegarem no abraço. Ele não respondeu, apenas suspirou contra o topo da minha cabeça. Continuava desapontado comigo, também parecia meio cansado. Por isso, acabei de afastando para continuarmos a conversa e tentarmos nos resolver.