XVI

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"O começo de um fim"

Eu esperava tudo, vindo do meu pai, acredite! Tudo.
Mas essa bofetada doeu até na minha alma.

- Albert, por favor.- Minha mãe fala, de olhos fechados.

- Não tente defendê-la, Amma.- Ele olha para mim com desprezo. - Eu te criei pra ser uma guerreira, lutadora, sobrevivente, e você acaba por ser uma vagabunda.- Achei que a bofetada, havia sido dolorosa. Mas as palavras dele me destroem.

- Eu fiz pra proteger vocês.- Sussurro. A queda do soco me fez mal, meu estômago está embrulhado.

- Eu preferia estar morto, à ver minha filha se tornando uma...prostituta, para me "proteger".- Levanto-me do chão, tentando me equilibrar nas minhas próprias pernas.

- Pai...a história é tão complicada...- Nem sei por onde começar. Meu pai não acreditaria em mim. Vamos lá...você também não acreditaria.
Como posso dizer: "pai, o juiz/prefeito, que nos julgou. Era na verdade um vampiro psicótico, que é apaixonado por mim, e tem uma irmã que é uma vaca/vampira, que tem desejo de vingança, porque seu irmão matava suas namoradas, e por culpa dela, perdi a virgindade com seu irmão maluco e a mesma ainda me obrigou a entrar no portal do inferno, antes que eu tirasse sua máscara." Fala sério, você acreditaria? Eu também não.

- Não há complicações. Você disse que se entregaria a ele para nos "salvar"- Ele me olha sério.- E para quê? Nos deram uma surra e nos mandaram para cá, enquanto você se divertia nos braços daquele hipócrita.- Eu não posso argumentar com isso, de uma certa forma é verdade.

- Pai, assim que eu soube o que aconteceu, e quis vir para cá, eu juro.- Ele levanta a mão para mim, fecho os olhos aguardando a dor.

- Não minta! Ele te usou e te jogou aqui.- Se ele soubesse...

- Albert, nossa filha não sabia, ela só quis ajudar. Calma.- Minha mãe fala, segurando o rosto dele.

- Você não entende, Amma.- Ele olha para mim. - Ela se vendeu. Pouco se importou conosco.

- Eu me importei!- Grito, surpreendendo-os. - Cada dia que passei naquele lugar, eu pensava, em como vocês estavam. Todo esse breve tempo que passei naquela casa, eu sofri as piores humilhações que alguém poderia passar. Por vocês. Eu fiquei aleijada, fui espancada e me submeteram a revelações inimagináveis, mas eu aguentei tudo, tudo! Por vocês!- Minha mãe me olha com...acho que é com orgulho. Meu pai por outro lado, não alterou sua expressão de zangado.

- Eu sei que você pensou em nós, meu amor.- Mamãe fala.- Eu disse isso ao seu pai.- Sorrio para ela.

- Isso não justifica, de todo jeito, acabamos aqui, não é?- Eu odeio admitir isso, mas ele tem razão.

- Tente entender, pai...

- Entender o que? Que a minha filhinha, virou uma...- Ele não consegue terminar a frase, as lágrimas invadem seus olhos.

- Não foi assim, pai.- Vou até ele e seguro seu rosto. - Eu não fiz nada, que eu não queria. Ele disse que manteria vocês seguros, a unica coisa que ele pediu em troca foi minha companhia.- Mais ou menos.

- Ele te...te...desonrou?- minhas bochechas queimam, o que dizer? Fui induzida a me entregar, tive desejo em fazer isso? Como posso responder algo, que nem eu mesma sei?

- Não. Eu...eu...fiz amor com ele, por que eu quis.- Meu pai desaba em lágrimas, nunca o ví assim.
Minha mãe não demonstra raiva, apenas tristeza.
Que droga! Minha vida acabou.

- Eu...não quero te ver.- Ele diz, sem conseguir olhar para mim. - Aqui não tem lugar pra você.- Minha boca abre e fecha, sem saber o que dizer.

- Pai, por favor...eu voltei por vocês.- Sussurro, meu coração dói. - Eu amo vocês...- Ele não me deixa terminar a frase, agarra meus cabelos, e me arrasta até o lado de fora. Ele parece não ouvir meus gritos, nem os da minha mãe. Ele está completamente cego e surdo de ódio.
Me afogo nas lágrimas de desespero, ele me joga do lado de fora do apartamento, me agredindo com os piores nomes possíveis.
Tento me arrastar para dentro novamente, mas ele fecha porta na minha cara, atingindo em cheio o meu rosto.

Eu não acredito que isso esteja acontecendo comigo.
Tudo o que eu queria, era reencontrar minha família, e agora...eles não me aceitam.

Várias pessoas, que estão no corredor, olham para mim. Levanto-me do chão e começo a andar sem rumo.
Não me importo com os olhares de pena ou desejo, apenas sigo em frente.

Chego ao lado de fora, me sentindo um verdadeiro lixo. Neste momento não há pessoas com que eu possa contar, estou largada ao vento, como as folhas das arvores no outono.

- Ei você.- Escuto alguém falar, olho ao redor, mas não vejo ninguém. - Atrás de você.- Viro-me rapidamente e vejo uma garota, aparentemente da minha idade, com olhos cinzentos, pele pálida, e cabelos castanhos.- Você é nova aqui, não é?- Ela pergunta, franzindo a testa.

- Sou...eu acabei de chegar.- digo. Eu não vou falar que fui chutada pelo meu pai.

- Você, era de Big City? Digo...foragida?- Ela pergunta sorrindo.

- Sim.- Falo, curta e grossa. A garota começa a se aproximar de mim, com uma alegria aparente.

- Me conta como era lá.- Ela fala, quase saltitando. Que estranho, essa garota aparecer assim.

- Quem é você?- Pergunto, um pouco ríspida. Ela bate na própria testa.

- Me desculpe, me chamo Anna, na verdade é...Annabelle, mas pode me...quer dizer, deve me chamar de Anna.- Ela para, para respirar um pouco.- Enfim, eu tinha catorze anos, quando vim parar aqui.

- E onde estão seus pais?- Pergunto, achando essa conversa muito estranha.

- Como era a vida em Big City?- Ela pergunta um pouco triste. Sei o que aconteceu, eles morreram. Por isso ela mudou de assunto.

- Temos mesmo...que falar sobre isso aqui?- Pergunto, tentando escapar de uma conversa tediosa.

- Tem razão...você já escolheu onde morar?- Pergunta ela, com algum tipo de esperança na voz.
Sorrio para ela, tentando não chorar, e nego com a cabeça. - Ei, o que foi? Aqui não é tão ruim, você se acostuma...com um tempo. Sabe o que faço para passar o tempo?- Faço que não com a cabeça.- Acumulo histórias. Um dia quero escrever algo que encante o mundo.- Sorrio, desta vez é um sorriso sincero. Ela é cheia de sonhos, eu não tenho mais, esse tipo de privilégio. - Sei que vai parecer estranho, e que não deve confiar em mim, mas...que vir na minha casa? Estou vendo que você não está bem. Venha.- Ela segura minha mão. Deixo-me guiar por ela.
Eu não tenho nada a perder, e pelo jeito ela também não, pois está levando para casa uma completa estranha. Eu poderia ser uma assassina profissional.

Andamos durante um tempo, não tenho ideia, se foram minutos ou horas, só sei que entramos dentro de uma velha casa com muito mofo, e cor desbotada.
Por dentro, a casa é muito organizada, nunca vi nada tão perfeito.

- Aqui é lindo.- falo, encantada com tanto perfeccionismo.

- Obrigada.- Ela fala indo até a...imagino ser a cozinha.- Sente-se.- Aponta para um sofá, com o estofado um pouco queimado.- sento-me, com todo o cuidado para não derrubar nada. - Você...- Ela começa a falar, mas não escuto, pois de repente sinto uma tontura, fora do comum.
Procuro parecer bem, mas não sei se vai dar certo.
Vejo Anna trazer um prato com...acho que são biscoitos.
Quando ela os aproxima de mim, algo sobe do meu estômago, passa pela minha garganta e termina a viagem no pratinho de biscoitos.
Sinto um gosto metálico horrível na minha boca, o vômito parece não querer parar, quando abro os olhos, vejo algo horripilante, os pés de Anna, o prato de biscoitos, minhas pernas, e minha boca, repletos de sangue, escuro, avermelhado e quente.

- O que droga foi isso?- Anna pergunta apavorada.
Também quero saber.

E agora? O que a Emily tem? Façam suas apostas.

Valeu.

O Beijo de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora