quarta-feira

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Fazer a rotina nunca foi tão diferente em tanto tempo.

O quarto ainda mantinha o seu cheiro amadeirado, assim como a cama, as roupas, o colchão que estava bagunçado quando o corpo foi levado. Os talheres e a tigela de mingau ainda descansavam sobre o criado mudo, as pantufas azuladas ao lado da cama; até o travesseiro amarrotado ainda continha a sua marca.

Minji não se atreveu a tocar em nada desde o que aconteceu. Era como se fosse um respeito à alma da mais velha, que poderia estar rondando confusa pelos corredores da casa, ainda tentando entender o que tinha acontecido. Ou não, para os descrentes.

Passou o resto do dia anterior inteiro deitada na cama, procurando entender e ainda processar o evento, mas mesmo assim, parecia tão irreal. Acabou por adormecer ainda com a mesma roupa – de agora – dois dias atrás e apenas quando acordou, procurou por um banho e se desfez do uniforme usado.
Ela ao menos queria encarar aquele conjunto de blazer e saia azul marinho e a saudosa gravata vermelha, que sempre a acompanhava.

Seu estilo para aquele dia, continha a mesma saia de uniforme, mas por cima da blusa social, um colete de lã da mesma cor, que não usava há séculos; para acompanhar, meias brancas, dobradas, seu sapato social preto e por fim, uma faixa azul para enfeitar o seu cabelo solto.
Nunca que descreveria um look diferente em sua vida, já que sempre utilizava as mesmas roupas, mesmo com tantas em seu armário.

Até mesmo seu trajeto para a escola tinha sido diferente.
Optou pela carona do ônibus amarelo, pela primeira vez e decidiu por si mesma que não levaria os fones de ouvido em sua bolsa.








Eram cartas, flores e até mesmo um memorial foi criado em frente ao seu armário, em homenagem e luto à sua mãe.

Talvez remorso e/ou arrependimento pelo que fizeram?
Nada!
Uma semana passaria e tudo voltaria ao normal. Ou até menos.

O que poderia esperar? As notícias corriam rápido naquele lugar; dos vizinhos aos filhos, dos filhos aos colegas e assim por diante.

Ela só não esperava a publicação feita no fórum da escola. Não aguentava ver tantas republicações do rosto de sua mãe – mais jovem – em preto e branco, complementando comentários de apoio e lamentações. Pena falsa.

Quanta bobeira... – Resmungou, com a cabeça balançando em negação.

Estava frente à porta do diretor para conversar sobre a publicação um tanto desnecessária e que com certeza poderia ter sido ideia dele.

– Podemos conversar? – Ela abre a porta sem bater, surpreendendo ao homem, fazendo-o até mesmo saltar de sua cadeira.

– Oh, Minji! – Um par de sobrancelhas arqueadas e braços abertos, a recebe. – Eu sinto muito por sua mã-

– Não precisa sentir, está tudo bem. – Disse com um olhar torto, ignorando a recepção tão calorosa.

– Sinto sim! Eu sei como é...perder um ente tão querido e tão próximo assim. – Ele voltou a se sentar, com as mãos no peito. – E, ah! Não é a sua primeira vez passando por isso, parece que nunca vamos nos acostumar né? Como você está?

– Estou bem, eu queria falar sobre-

– Nada bem, eu imagino...

– Ei, senhor! – Elevou o seu tom, fazendo-o desviar o olhar para a garota, interrompendo o pequeno discurso.

– Hm?

– Eu estou bem, eu queria falar sobre o post que fizeram no fórum da escola.

– O que? Tem algo de errado escrito?

REMINISCÊNCIA - Jeong YunhoOnde histórias criam vida. Descubra agora