VIII - Como Dois Animais.

3.8K 218 552
                                    


...


Vou deixar vocês apreciarem o capítulo por si mesmas. Boa leitura! E me contem depois se gostaram :)


...








Era quinta-feira e já havia se passado um dia desde que dispensei Alexandre, evitando de cara, o nosso primeiro encontro real oficial.

Não admito julgamentos imediatos, afinal, só eu sabia como ele era um homem difícil.

Incoerente. Ininteligível. Desafiador à moral e os bons costumes... e muito, muito atentado.

Aquilo tudo era muita coisa pra mim, e eu não sei se era uma das decisões mais prudentes a se tomar no momento. Pelo menos, não antes da nossa primeira reunião como vendedor e compradora.

Até porque eu precisava que Alexandre me levasse a sério, e seria impossível conquistar esse feito rolando em sua cama, como se fosse uma garotinha qualquer. Porque eu também não era, deixando esclarecida essa dúvida.

Por um dia, eu parecia ser a Giovanna do Rio. Ela era confortável, careta, sabia se portar, sabia entrar e sair dos locais, sabia o que dizer. Eu sabia ser ela, e fazia isso muito bem.

Não que eu não gostasse da Giovanna da Bahia, jamais. Ela era uma versão minha fantasticamente nua e crua. Desinibida, cheia de vida, nutrida de vitalidade, uma deusa, a própria Vênus.

Ela ainda estava um pouco viva - diga-se de passagem.

Aproveitei o pós reunião e decidi sair do chalé, pouco que fosse. Como nova companhia, uma coletânea de Crônicas, da querida Hilda. O saldão no Amazon me foi bastante, bastante produtivo. Devo ter levado cerca de uns 10 exemplares da sua obra, sem sequer ter visto as temáticas.

Levava na bolsa de praia meu livro, protetor solar, canga, toalha, todas aquelas coisas necessárias para um fim de manhã aprazível. Me deitei na cadeira de praia mais próxima da água, e tirava a saída de praia negra, que naquele sol da Praia do Forte, trabalhava como um forno sob minha pele, cozinhando-a por inteiro, de tanto calor.

Observava o público do hotel. Era meu passatempo preferido ali: traçar os perfis de famílias margarinas e indicar o que cada um deveria ser, qual seu pecado, sina, desejo e maldição.

Pelo curto do óculos, variava a vista entre os hóspedes e o livro, tentando ler cada lírica tentando não me recordar do homem de noites atrás.

Impossível, aliás. Ele já tinha arruinado Hilst e Caetano para mim.

O texto, de nome Delicatessen, iniciou-se, no entanto, como um tiro certeiro na minha lógica pensada.

"Você nunca conhece realmente as pessoas. O ser humano é mesmo o mais imprevisível dos animais. Das criaturas."

Fechei o livro assustada. Olhei para os lados, notei algumas pessoas. Me sentia perseguida, e totalmente ridícula por sentir isso.

Voltei a leitura banal do texto, tinha que encarar.

Nem tudo era sobre mim.

Ao lado da coxa, o telefone vibrava.


Nero: Esse seu gelo é todo à vista ou você pode parcelar pra falar comigo?


Nero: Saudade, satanás.


Hilda concluiu seu pensamento de forma clínica: A gente nunca sabe nada sobre o outro. E aquele lá de cima, o Incognoscível, em que centésima carreira de pó cintilante sua bela narina se encontrava quando teve a idéia de criar criaturas e juntá-las?

Esotérico - Uma Doce e Bárbara Viagem.Onde histórias criam vida. Descubra agora