Estação Balham

Capítulo 1

Londres, 1948

Londres nunca foi meu lugar favorito, desde a morte do meu pai esse lugar se tornou triste, sem cor. E depois do que aconteceu com a minha mãe eu não consigo mais chamar esse lugar de casa. Me mudar para a Alemanha não vai ser uma tarefa difícil, tenho certeza que logo irei me adaptar ao país.

Com o fim da segunda guerra mundial, as cidades estão totalmente abaladas, a economia está um desastre e os médicos não são suficientes para suprir tanta gente doente. De qualquer forma, consegui meu primeiro emprego como psicóloga em uma clínica psiquiátrica em Berlim. O local está atendendo ex-soldados de guerra que com certeza estão muito traumatizados com o que aconteceu. O ser humano consegue aguentar muitas coisas, mas matar várias pessoas durante meses ou até mesmo anos abala o psicológico de qualquer um, a não ser que você seja um psicopata.

Pessoas transitam de um lado para o outro no porto de Londres. Como sempre, tudo está um caos. Médicos, freiras, enfermeiras, todas essas pessoas são facilmente identificadas subindo e descendo dos navios o tempo todo. Observo meu ticket mais uma vez, quero ter certeza que não vou perder essa viagem, apesar de saber que estou uma hora adiantada. Tento me distrair lendo o jornal do dia, porém as terríveis notícias que são divulgadas sempre me deixam mal, logo não consigo continuar a ler, mesmo que me esforce para isso.

A viagem dura mais de um dia, não é nada fácil se locomover de navio por uma distância tão grande entre duas cidades, contudo aviões estão fora de questão, visto que as passagens valem ouro e eu estou longe de ser rica. Depois de alguns minutos esperando impaciente, o embarque começa e eu finalmente posso entrar no navio. Acomodo-me em minha cabine  e espero a partida. Como sei que a viagem é longa, trouxe alguns livros para ler durante o trajeto.

Estou ansiosa com meu primeiro trabalho, ainda mais tendo uma ótima função logo de cara. O diretor do hospital conhecia meu pai e por isso decidiu me dar uma chance, e farei de tudo para não perdê-la. Não sei falar alemão fluentemente, porém disseram para não me preocupar que meu primeiro paciente sabe falar inglês. Ser psicóloga nunca foi um sonho, sempre esteve mais para uma possibilidade, mas depois que minha mãe se suicidou e eu não pude fazer nada para ajudá-la, tive certeza que quero salvar vida de mais pessoas, evitar que outros tenham o mesmo fim que minha mãe teve. Hoje sei que minha mãe entrou em uma profunda depressão com a morte do meu pai, por isso decidiu acabar com tudo de uma vez. Por muito tempo eu a julguei por não ter pensado em mim, em como eu iria me sentir se ela partisse, mas hoje em dia eu tento pensar de outro forma, mesmo sendo difícil na maioria das vezes. A verdade é que minha mãe foi egoísta.

Depois de quase dois dias de viagem, finalmente chego a Berlim. Minha aparência está destruída, agora tenho certeza que uma boa cama faz muita falta. Ao descer do navio, avisto o diretor do hospital de longe, logo me aproximo dele. O homem de cabelo loiro grisalho avança um passo à frente quando me vê na multidão.

— Senhora Reed, como é bom vê-la. — Ele estende a mão.

— É bom estar aqui, Diretor Egon. — Retribuo seu cumprimento.

— Eu espero que a senhora não tenho problema em andar, temos um longo caminho pela frente. — Ele sorri, mas a sua expressão não demonstra alegria, muito pelo contrário, ele parece abalado demais.

— Eu com certeza posso andar.

— Eu levo isso para você. — Egon pega a mala de minhas mãos.

Assim que saímos do porto, me admiro com a situação da rua. Eu pensei que o Reino Unido estava abalado até chegar aqui, a Alemanha está mil vezes pior. Imaginei que as coisas aqui não estariam boas, já que a Alemanha perdeu a guerra, contudo vendo tudo isso com os meus olhos agora não consigo acreditar. Escombros estão espalhados por vários lugares e, mesmo tendo se passado anos, as marcas da guerra ainda são totalmente visíveis. Durante todo o percurso é possível ver como o país está abalado, pessoas desabrigadas, sem alimentação ou saúde básica.