Martírio VI

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As constelações ajudam-nos a separar o céu em porções menores. Durante as noites escuras, podem ser vistas entre mil a mil e quinhentas estrelas. Sendo assim, cada estrela pertence à certa constelação.

Os astrônomos da antiguidade imaginavam que elas formavam figuras ilustrativas.

Uma.

Duas.

Três.

Estrelinhas amarelas, brilhando sobre o teto branco do quarto. Soraya estava deitada em sua cama, contando uma a uma, enquanto apontava para elas. Seu intuito era encontrar o sono, contudo ele não vinha.

Virou-se para o lado esquerdo, fitando sua parede azul-pastel.

Sentia-se tão inquieta, sua mente insistia em trabalhar pensamentos, os quais ela tentava a todo custo esquecer; Aquilo era inevitável. A cada cinco pensamentos, pelo menos três deles eram sobre Simone.

A maneira como a Diaba estava tornando-se especial para si soava estranho.

Lembrou-se dos toques de outrora, do carinho, de como foi cuidada. Não pôde evitar sorrir bobo, mesmo que contido, logo sentindo o rosto ficar morno, corado.

— Deus, será que é tão errado gostar, só um pouquinho, da Simone? — a indagação fora feita pela voz mansa, com lábios formando um bico ladino.

O monólogo com Deus era costumeiro, principalmente quando tinha insônia.

— Por que seria tão errado gostar de alguém? — o silêncio por todo recinto sobrava, e logo Soraya deparou-se sem uma resposta auditiva de Cristo. Era normal.

Rolou pela cama, ficando de bruços, enfiou o rosto no travesseiro, totalmente envergonhada.

— Deus, e se eu fosse "diferente", o Senhor iria continuar me amando?

Espero que sim.

A moeda pentecostal é um item místico de equilíbrio energético, o qual com a ajuda do barqueiro Caronte, permitia-se viajar para dentro e fora do Inferno. Como uma grande companheira de Simone, a mesma sempre está em seu bolso. Do mesmo modo, era seu bem mais precioso. Pode ser usada mais de uma vez, mas com um espaço de tempo considerável.

As luzes vermelhas contracenavam um ambiente escarnecedor, não que realmente fosse, mas a Diaba estava lá.

O blazer preto da Gucci vestiu esplendidamente bem ao corpo bem esculpido de Tebet. Esta que encontrava-se sentada no balcão de sempre.

A bartender desta vez era Abigail, e ela parecia estar verdadeiramente animada com o que fazia. O sorriso bonito que carregava deixava evidente seu bom humor.

— Você está muito contente hoje. O que aconteceu? — a expressão séria demonstrava que Simone estava em antítese ao braço direito.

— Apenas estou animada. — retrucou, à medida que seus olhos rolavam entediados para trás e suas mãos balançavam fortemente a coqueteleira de aço. — E você? Só está de mau humor ou isso é saudades da sua bonequinha? — o tom rodeado de deboche mostrava a verdadeira Abigail, esta que não evitava carregar uma feição provocativa, com riso ladino e sobrancelha erguida.

A Diaba, por sua vez, sorriu-lhe traiçoeira, de uma maneira que deixava em evidência seus devaneios maldosos.

— Sempre estou. — revidou, com uma resposta que não agradou sua amiga. Simone segurava o copo, on the rocks, dando um gole curto na bebida escura e amarga, sentindo-a percorrer sua garganta, de efeito devastador. Blavod era uma bebida fortíssima.

No Limiar do InfernoOnde histórias criam vida. Descubra agora