Capítulo 3

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Duas semanas se arrastaram desde aquele fatídico dia, e a solidão continuava a me envolver como uma sombra persistente. Essa pequena cidade no fim do mundo parecia ter sido abandonada para sempre. As ruas vazias testemunhavam meu isolamento, e o silêncio prevalecia como a trilha sonora dessa nova realidade.

Eu me refugiava em minha casa, mergulhado em pensamentos e anotações no caderninho que havia encontrado no supermercado. Era um vislumbre do passado, um elo com a humanidade que desaparecera. Cada página preenchida com palavras escritas à mão era um lembrete tangível de que eu ainda estava aqui, lutando pela sobrevivência.

No entanto, apesar de encontrar consolo nas minhas reflexões e registros, o vazio ao meu redor continuava a pesar sobre mim. A ausência de vozes, de risos e de interações humanas era um lembrete constante de que eu era o último sobrevivente nessa cidade deserta.

Passava os dias percorrendo os corredores silenciosos de minha casa, sentindo a falta da companhia dos meus pais, dos amigos, dos vizinhos. Cada cômodo ecoava com memórias agora distantes, lembranças de conversas à mesa de jantar, de risadas compartilhadas no sofá, de abraços reconfortantes.

À medida que o tempo passava, comecei a questionar minha própria existência. O propósito de continuar lutando parecia escapar por entre meus dedos. Para que eu sobrevivia? Para quem eu sobrevivia? A solidão começava a corroer minha determinação, sussurrando dúvidas e incertezas em minha mente.

Envolto em um limbo existencial, eu lutava para encontrar um motivo para continuar em frente. Os dias se arrastavam em uma rotina monótona, sem nenhum lampejo de emoção ou interações significativas. O silêncio absoluto apenas servia para amplificar a voz insistente da solidão, corroendo minha determinação aos poucos.

À noite, quando as sombras dançavam ao redor da minha casa, eu me via mergulhado em reflexões profundas. Encarava o vazio e me questionava: por que persistir? Qual o propósito de enfrentar essa solidão impiedosa que me envolvia?

A escuridão se transformava em um espelho para meus medos e incertezas. Os pensamentos tumultuados ganhavam força, ecoando em minha mente, questionando o sentido da minha existência solitária. Eu buscava respostas, ansiava por um fio de esperança, mas parecia que as paredes do meu isolamento se tornavam cada vez mais impenetráveis.

Em momentos de fraqueza, a tentação de me render ao abraço gélido da solidão era quase irresistível. Parecia mais fácil desistir, deixar-me levar pela inércia do vazio. No entanto, algo dentro de mim continuava a resistir, uma pequena chama de esperança que teimava em brilhar, mesmo nas trevas mais densas.

Eu sabia, mesmo que de forma vaga, que precisava encontrar um motivo para seguir adiante. Talvez não houvesse uma resposta clara ou um propósito pré-definido, mas havia a possibilidade de criar meu próprio sentido nessa nova realidade desolada.

Recordava-me das histórias que contavam em minha infância, dos heróis que enfrentavam adversidades aparentemente insuperáveis. Eles encontravam forças onde parecia não existir, descobriam coragem mesmo diante do desespero. Era nessas narrativas que buscava inspiração, uma centelha capaz de reacender a chama da minha determinação.

Uma foto antiga, que retratava minha infância ao lado dos meus pais, estava ali, repousando sobre minha cama naquele momento. Ao olhar para aquela imagem, as lembranças da companhia deles inundavam minha mente, destacando ainda mais a ausência que agora permeava minha vida. Tudo o que havíamos compartilhado antes daquele fatídico dia parecia ter sido apagado, sem motivo ou explicação. Aquela fotografia era a única relíquia que restava de nós, pois não havia registros posteriores, tudo estava encapsulado nos celulares.

Ao segurar a foto com cuidado, deixei que as memórias fluíssem livremente. Aqueles rostos sorridentes e aconchegantes eram um lembrete doloroso do que se perdeu. Os momentos compartilhados, as risadas, as histórias contadas ao redor da mesa de jantar... tudo isso agora parecia tão distante e intangível.

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