Desenlace

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A primavera era linda em Londres, tive bastante tempo de apreciá-la com Rachel e Grace antes de voltarmos para o hotel.

— Aqui está sua roupa — falou mamãe pondo um embrulho plástico comprido em cima da cama.

— Posso dar mais uma volta antes de irmos? Por favor? — pediu Grace.

— Não, a sessão começa às dez. — respondi — É daqui a uma hora.

Nos últimos tempos tenho mudado coisas que sempre desconsiderei variar, como a cor do meu cabelo, que agora está em um tom de mel quase puxado para loiro. O meu guarda-roupa também sofreu algumas modificações e até meu espírito se sente mais leve.

Vesti-me e Grace ajudou com a maquiagem, o carro já estava esperando na porta do hotel e eu não queria me atrasar para o compromisso.

— Vamos? — mamãe perguntou.

No caminho para a Waterstone's Piccadilly eu mal conseguia controlar meu nervosismo, será que eu conseguiria sair do carro? Pôr um pé na frente do outro? Rachel notou meu olhar preocupado e pousou a mão sobre a minha apertando-a levemente.

— Estou orgulhosa de você, seu pai com certeza está também.

Assenti com a cabeça. Chegando à biblioteca havia um grande número de pessoas do lado de fora. Quando pus os pés para fora do carro as saudações começaram, foi como música para meus ouvidos, como meu primeiro dia em Nova York, o barulho incessante de uma cidade que nunca dorme. Aqueles sorrisos em rostos desconhecidos me lembraram as luzes cintilantes das janelas dos prédios, postes e telões. O clima de acolhimento só espertou minha saudade da casa da tia Joyce e do abraço de Dean.

Fui conduzida até a parte interna da Waterstone's passando e acenando para todos. Lá dentro havia um espaço impecavelmente organizado para a sessão de autógrafos, sentei-me à mesa e me deram uma caneta. Olhei em volta para as dezenas de cópias da "The place that never sleeps" dispostas em pilhas na banca ao lado e desejei que não fosse uma ilusão o fato de ter meu nome reconhecido por contar minha história desinteressante.

Rachel e Grace ficaram em um canto privilegiado para observarem tudo sem estar no meio do tumulto de pessoas. As portas se abriram, a multidão entrou alvoraçada e foi preciso que a assistente a organizasse em uma fila. A primeira era uma garota de mais ou menos catorze anos, olhei para seus olhos amendoados através das lentes grossas de seus óculos e correspondi ao seu sorriso contagiante.

— Qual é o seu nome?

— Tassy.

— É um prazer conhecê-la, Tassy — apertei sua mão.

Ela me entregou o livro e o abri na primeira página pondo minha assinatura e uma dedicatória. Tassy se inclinou sobre a mesa e me abraçou, retribuí com a mesma intensidade e a vi indo saindo dando lugar ao próximo da fila.

Não consegui contar o número de pessoas, eu não queria que aquela fila acabasse. Depois de autografar o livro de um cara alto e de gorro na cabeça surgiu o próximo, sem ver seu rosto tomei um gole de água do copo de vidro ao meu lado e um exemplar do livro já estava sobre a mesa, a capa um pouco surrada, abri na primeira página e me preparei para escrever.

— Seu nome? — perguntei ainda sem levantar a cabeça.

— Assassino psicótico, mas pode me chamar de-

— Dean! — exclamei e saltei da cadeira em direção a ele.

O'Conner me segurou antes que eu pudesse cair por ter passado desajeitadamente por cima da mesa para chegar até ele.

— Eu não acredito — falei contra seu pescoço.

— Eu não perderia isso por nada. — ele beijou o topo da minha cabeça, alguns murmúrios e assobios soaram ao nosso redor — Eu estou orgulhoso de você.

Afastei-me um pouco para fitar aqueles olhos caramelo.

— Você estava certo, eu precisava de um recomeço.

— Ah — ele tirou algo dos bolsos, era o broche que eu havia lhe dado — Precisa disto mais do que eu.

Dean o prendeu do lado esquerdo da minha blusa.

— Agora será que pode me dar um autógrafo?

Fui para detrás da mesa novamente e o levei comigo, afinal de contas as pessoas precisavam conhecê-lo, era uma parte importante da história e de mim. Abri novamente seu livro e pus na primeira página, escrevi logo abaixo do título impresso.

Ao meu querido assassino. Obrigada por me mostrar o que realmente vale a pena, por ser mais que uma passagem neste livro. De tudo que passamos nossa maior certeza é, poder provar a quem duvidar, de que um assassino e uma problemática podem se somar.

Com amor, Aurora.

P.S.: Vamos continuar a cumprir sua lista de mil coisas.






Ao recomeço. Em memória de John e Edith Hopper.

O lugar que nunca dormeOnde histórias criam vida. Descubra agora