Quando acordei, o sol já inundava o quarto com seu brilho fraco desses dias de outono. Era quente sob os cobertores, mas eu sabia que estava mais frio do que nunca lá fora. Ao me sentar na cama, percebi que Cassie já havia ido embora. As roupas que ela usara na noite anterior estavam cuidadosamente dobradas sobre a cama feita, ao lado de um pequeno bilhete.
"Debrah mandou mensagem às 10h. Você parecia tão cansado, não tive coragem de te acordar antes de sair. Espero que tenha dormido bem com o cheiro de atleta americano. Nos vemos no jardim! – Cassie ♥"
Sorri para a caligrafia no papel – letras bastão um tanto desleixadas, mas bem charmosas – e o coraçãozinho desenhado no final. Distraído, caminhei até a escrivaninha, onde coloquei o bilhete sobre uma pilha de livros. Espera... Debrah mandou mensagem às 10h? Que horas são agora?!
-Não acredito que dormi até meio-dia. – resmunguei para Liam no jardim, que me olhava com uma cara engraçada, cheia de farelos do lanche que ele devorava.
-Qual o problema, mano? – ele me ofereceu um copo de chá da lanchonete – É sábado! E você estava só o bagaço da laranja ontem, sua rotina está uma loucura.
-Eu sei, mas tenho que ligar para casa aos sábados. – esclareci, tentando calcular que horas deviam ser na Inglaterra naquele momento, com a diferença do fuso-horário. Eram quantas horas mesmo? A mais ou a menos? Ah! Malditos números! – Minha tia vai me matar.
-Relaxa, cara. – Liam se deliciava com sua quarta barrinha de proteína – Você ligou nos outros sábados, ela vai entender.
Era verdade que minha tia não criaria grande caso pelo incomum atraso, mas eu prometera a ela que daria notícias todo sábado de manhã. Pesquei o celular no bolso interno do casaco, me pondo a discar os números. Quando ela atendeu, sua voz era de pura alegria.
-Antes tarde do que nunca, senhor Atwood! – ouvir a voz da minha tia imediatamente provocava um misto de alívio e saudade, que se acumulavam em minha garganta.
-Desculpe, tia Augustine. Eu dormi demais hoje.
-Querido, imagino como estejam sendo cansativas todas essas mudanças. – ela usou seu melhor tom compreensivo – Principalmente com aquele tal Clube de Mídia que te colocaram. Como estão as coisas?
Liam me observou enquanto eu atualizava minha tia dos acontecimentos da semana – propositalmente "esquecendo" de mencionar a parte que Cassie dormira no meu quarto noite passada. Enquanto tia Augustine tecia elogios pelas minhas habilidades de fazer amigos – de fato, nunca tive dificuldade em me enturmar – e despejava em mim uma avalanche de perguntas sobre garotas e interesses amorosos – que eu educadamente ignorei – as garotas se juntaram a nós, sentando-se em silêncio para não me atrapalhar.
-Os rapazes querem falar com você! – eu podia ouvir a voz grave de tio Saul e Oscar ao fundo, exclamando meu nome.
-Meu garoto! – ele gritou assim que pegou o telefone e eu não pude conter o sorriso, embora a saudade trouxesse um peso para o meu peito.
Depois de ouvir perguntas intermináveis sobre os esportes da faculdade – meu tio era fã de carteirinha de futebol americano – as quais eu não soube responder, finalmente meu tio devolveu o telefone para a esposa, dizendo que estava de saída para levar Oscar em um jogo qualquer da escola dele e pude ouvir os dois saindo, barulhentos como sempre. Se fechasse os olhos, poderia até vê-los como dois furacões, derrubando coisas e batendo portas, aos risos. Meu tio Saul era a única referência americana que eu tive durante a vida, e sempre me diverti com seu jeito irreverente e extravagante – que ele passara ao filho em cada detalhe.
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Três Desejos
RomanceQuando Ethan Atwood decide deixar sua pequena e pacata cidade natal no interior da Inglaterra para viver seu sonho de estudar música em uma renomada universidade dos Estados Unidos, descobre que grande parte da sua história esteve em segredo durante...