Lembrança Boa

Capitulo 36

– Já foram pra algum tipo de colheita antes? - pergunto pros meninos, enquanto ainda estávamos na rodovia

– Uai, mas é claro - Neto fala - que pergunta

– Você não conta - digo, Neto também é agrônomo

– Então perguntasse "Caio, meu amor, você já esteve em uma colheita antes?" - ele fala debochando, enquanto eu e Caio caímos na risada

– Ô Netão, não enche - falo - se começar dar azia de novo cê sai daqui é coloco você na carroceria

– O bom é que lá dá pra ir esticadão - ele fala e logo deita no banco

Alguns minutos depois finalmente chegamos na colheita, essa é uma das fazendas mais longe que temos.

Procuro a colheitadeira e logo vou indo de encontro, vou dar uma trabalhada e já devolvo pro operador. Paro a Ram perto e vejo se algum deles querem ir comigo. Neto quis ficar na camionete. Logo subi com Caio.

– Boa tarde - falo e Túlio, o encarregado e operador, responde o mesmo - tá indo tudo tranquilo?

– Tá, tudo nos eixos, vai operar? - faço que sim com a cabeça

– Trouxe um café pra vocês, leva a camionete no caminhão aí dá pra comerem lá

– Beleza - ele diz e desce as escadas

Descarrego a máquina e logo começo a colher o milho, da safra de inverno.

Durante todo tempo nós dois ficamos quietos, ninguém falava com ninguém, nem um olhava na cara do outro. E se falava era algo sobre a colheita e as respostas secas, tava um clima meio ruim entre a gente. E tudo isso, acredito que, por minha culpa.

Depois de tudo que aconteceu no passado, eu criei esse bloqueio com qualquer pessoa que se aproxime demais de mim, e que, de uma forma ou de outra, comece a fazer parte da minha vida.

Eu tenho medo das coisas se repetirem, mesmo eu sempre falando pra mim mesma que nenhum ser humano é igual ao outro, mas mesmo assim meu coração aperta e me dói não conseguir levar a relação pra frente, com aquele medo insuportável de tudo acontecer de novo, de eu reviver toda aquela ferida de novo.

Afastar quem eu começo a gostar é forma que encontrei da ferida não se abrir, mesmo que isso me custe algo que quero muito viver, e ser feliz com alguém incrível do meu lado. Eu vou preferir ficar sozinha, pra evitar que tudo aconteça novamente.

Eu não sei se vou conseguir falar disso com Caio, nem sei se essa conversa vai acontecer. Sei que depende de mim, da minha vontade. Não quero machucá-lo. Mas também não que me machucar.

Depois de tudo eu decidi me priorizar, me colocar em primeiro plano sempre, enxergar primeiro a minha felicidade e os meus sentimentos não me importar com mais ninguém. Mas a minha decisão acabou magoando várias pessoas, e eu não fico nem um pouco orgulhosa disso, porém fazer isso é necessário se eu não quiser me machucar.

Alguns minutos depois, longos minutos inclusive, o tempo lá não passava de jeito nenhum, fomos aonde estava a turma, comemos e logo em seguida partimos pra outra fazenda, onde eu ia recolher algumas amostras de milho pra checar umidade e dar início da colheita na área.

[...]

O dia foi bem tranquilo, tirando a parte que eu e Caio mal falamos um com o outro, chegamos na fazenda já era noite o Ryan e Vitor já estavam tomados banho e estavam jantando com Rosi na varanda.

– Olha nem esperam os amigos - Neto chega gritando com eles

– Chegavam nunca também - Vitor responde

– Sabe como é né Vitinho - Neto fala - tava batendo mó papo com o sogrão, já tô me incluindo na família

– Ah claro, tem que mostrar esse bom moço que cê é né

– Aí se eu abrir minha boca hein - falo

– Uai Amanda não me quer na família? - ele fala como se tivesse ficado magoado - até a Rosi já me aprovou, né Rosi?!

– Claro, você é um ótimo menino - ela diz

– Tá vendo só

– Mas tudo depende da Betina - paro do lado de Rosi

– E ela não é tão fácil de lidar né Rosi? - digo e ela afirma com a cabeça

– Fica tranquila, menina, deixa que o pai doma a fera - ele fala batendo no peito

Adoro que ele não conhece muito da Bet, não vou desiludir o menino tô adorando ver esse rola enrola de perto.

Durante a janta os meninos foram falando o que fizeram no dia e Neto só falava de seu Francisco, rasgava elogios pro meu tio. Nem é puxa saco não.

Terminamos de jantar e os meninos ficaram ajudando a Rosi com a louça, enquanto eu e os outros dois que chegamos depois fomos tomar um banho.

[...]

Tomei um banho bem quente e relaxante, fiz toda minha rotina de autocuidado calmamente, passando todos os meus produtinhos na pele e tentando desligar a mente. Coloquei uma roupa bem leve e confortável, sequei meu cabelo depois desci. Todos já estavam lá embaixo. Pra ser mais precisa eles estavam lá fora, na lareira.

Assim que cheguei, os meninos levantaram e foram saindo deixando eu e Caio sozinhos. Acho que a conversa que ele queria acaba de começar

– Tá cheirosa

– O que cê queria falar comigo?

– Cê é bem direta hein

– Só não gosto de perder tempo

– Já que é pra ser assim então, porque cê tá desse jeito comigo?

– Que jeito? Tô agindo normal, como faço com qualquer pessoa

– Não se faz de idiota e eu, pelo menos acho, que não sou qualquer pessoa pra você, pelo menos foi o que você me disse ontem

Eu não respondi nada, só respirei fundo, esperando que a coragem de poder falar tudo pra ele viesse mas não veio, então eu fiquei quieta.

– Ce não vai falar nada? - ele diz

Novamente não respondo

– Amanda, por favor não complica as coisas, tava tudo bem até ontem à tarde, o que mudou? O que eu te fiz? Eu fiz algo que você não gostou? Foi de eu ter conversado com aquela garota? Se for aquilo, não tem nada que se preocupar, eu dei um fora nela

– Não Caio, não é isso - finalmente o gato devolveu minha língua - eu fiquei um pouco puta com isso daí, mas não tem nada haver, é comigo, eu sou o problema

– Então me fala, pra eu pode te ajudar - ele diz e se agacha na minha frente - o que eu posso fazer?

– Nada Caio - ali meus olhos se enchem de água, seguro muito pra que nenhuma lágrima caia

Respiro fundo mais uma vez, e tento tomar coragem pra falar tudo que sinto, mas é como se algo na minha garganta bloqueasse as minhas cordas vocais.

– Amanda, por favor fala alguma coisa