tears

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"Para cada um que começa a chorar, em algum lugar outro para. O mesmo vale para o riso."

Marília point of view

Chegando a nossa casa, eu entrei e subi para o nosso quarto o mais rápido possível. Vi quando minha mãe se levantou do sofá e veio em nossa direção, ela disse que passaria a noite aqui. Provavelmente ela estava esperando que a gente chegasse e contasse sobre a maravilha que foi nossa noite. Pena que não foi o que realmente aconteceu.

— O que aconteceu, Marília? — ela perguntou preocupada ao me ver passar rapidamente por ela, abaixando minha cabeça, sentindo as lágrimas rolando por mais uma vez. — Maraisa?

— Aquele filho da puta do Yugnir aconteceu! — minha esposa vociferou.

— O que ele fez?

— Tentou estuprá-la.

— Aquele desgraçado vai pagar! — ouvi a voz da minha mãe antes de fechar a porta do quarto e me jogar em nossa cama, escondendo meu rosto molhado entre nossos travesseiros.

A noite que eu teria pela frente seria com certeza, uma noite recheada de pesadelos e memórias que eu gostaria de esquecer.

Minha cabeça latejando com as lembranças e com o nojo que eu sentia ao ter sido tocada por ele. Tocada por mãos impuras e traiçoeiras. Eu sinto vontade de quebrar tudo ao meu redor, mas ao mesmo tempo, algo me impede. O pingo de razão restante em mim ainda me impede de perder a cabeça, então, o que me resta é me remoer por dentro, deixando os sentimentos esmagarem meu coração ferido, partido, desapontado.

— Amor... vem você precisa de um banho. — Maraisa se aproximou de mim.

Me sentei na cama e ela começou a me despir, os hematomas pelo meu corpo ficando bem evidentes, eu podia sentir a dor em cada um deles.

Fechei os olhos, inspirei fundo e tentei – em vão – afastar as lembranças que vieram em minha mente.

Continuei lutando contra os fantasmas enquanto Maraisa tira minhas roupas, durante o banho esfreguei meu corpo com força. Eu não sei explicar o que é essa sensação no meu peito, mas é horrível.

Deixei que a água levasse toda a mágoa e dor que eu sinto nesse momento.

— Ei não faz assim. — minha esposa falou pegando a esponja da minha mão. — Eu posso te ajudar.

Assenti com a cabeça, ela me ajudou no banho e seguimos para o quarto, colocou uma camisola leve e me vestiu com uma camiseta grande.

— Desculpa ter te deixado sozinha. — Ela sussurrou, após colar sua testa na minha.

— Não é sua culpa. — acariciei o cabelo dela.

— Você vai ficar bem. Vai sim, é uma mulher incrivelmente forte e eu tenho certeza que vamos superar tudo isso juntas. — Afirmei, sentindo os olhos arderem.

Maraisa me apertou em seu abraço me fazendo gemer em protesto pelas dores em meu corpo.

— Me desculpa amor, eu não queria...

— Está tudo bem, você só está cuidando de mim.

Ouvimos batidas na porta, autorizei a entrada e vi minha mãe com um copo de água.

— Maraisa a Liz está inquieta poderia ir acalmar ela um pouco? — minha esposa me olhou. — Eu cuido dela, pode ir.

Minha mãe se aproximou, Maraisa me deu um selinho e prometeu que já voltava.

— Trouxe uns remédios pra dor e um pra te ajudar a dormir, sei que vai precisar. — eu assenti os pegando.

— Mamãe... foi... foi horrível. — solucei sentindo as lágrimas escorrendo.

— Ei meu amor, você está segura agora. — ela me abraçou com cuidado me fazendo um carinho na cabeça. — Eu estou aqui com você, eu vou fazer ele pagar por isso.

— Ele... ele quase...

— Ei não precisa falar disso, tá bom. — ela me olhou nos olhos. — Eu nunca mais vou deixar ninguém te machucar minha menina.

— Vai ficar tudo bem, não vai? — minhas mãos foram para o colchão rapidamente, assim eu tinha algo para agarrar e disfarçar o tremer delas. — Obrigada pelos remédios mamãe.

Apertei meus olhos com força numa tentativa falha de expulsar todas as lágrimas que meu organismo produziu e não chorar mais por causa disso, mas tudo o que consegui foram vários flashes da imagem que dividiu minha vida ao meio.

— Eu não sei o que eu tô fazendo, todos esses sentimentos ruins... Eu não quero mais eles, mamãe. Eu só quero esquecer.

— Tá tudo bem. Deixa eles irem embora com as suas lágrimas, tá bom? — ela sussurrou no meu ouvido e eu segui seu conselho.

Não tenho certeza de quanto tempo se passou, mas eventualmente eu tive que deixar o seu abraço e o cafuné que ela fazia na minha cabeça. Quando a encarei, de volta a minha posição, ela abriu um sorriso leve. Acabei retribuindo, mesmo não sentindo nada bom o suficiente que me custasse um sorriso por dentro.

— Melhorou?

— Mais ou menos.

Minha voz falhou. Depois de todo esse choro, eu não quero nem imaginar o estado do meu rosto.

Colocar as coisas para fora parece agora uma ideia boa. O problema é que isso me trouxe a noção do impacto de tudo o que eu passei alguns minutos atrás fazendo e isso definitivamente levará um tempo para passar.

Minha mãe fazia carinho em meus cabelos, enquanto eu estava com a cabeça em seu colo, quando a Maraisa abriu a porta e colocou sua cabeça para dentro.

— Posso interromper? — ela perguntou e no minuto em que percebemos que era ela ali, toda nossa atenção mudou de direção.

— Claro!

— Nem precisa perguntar amor!

— Entra menina!

— Eu vou pegar remédio pra você.

— Minha mãe já trouxe, só quero que você venha se deitar comigo, nossa filha está bem?

— Sim, dormindo como um anjo. — ela deu um pequeno sorriso.

— Descansem, qualquer coisa me chamem. — minha mãe falou nos dando um beijo na testa e saindo.

Maraisa apagou a luz e se ajeitou na minha cama ao meu lado, deitei minha cabeça em seu peito, ela passou a acariciar meus cabelos em um cafuné gostoso, me fazendo fechar os olhos.

Em algum momento no meio de todos os pensamentos novos e estranhos, eu finalmente apaguei. Estou exausta. Mais emocional do que fisicamente, para ser honesta. Preciso desse descanso. Especialmente porque algo me diz  que os próximos dias serão ainda mais difíceis e confusos.

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