Depois de um mês da partida de Nico para São Paulo e de Ari chorar um oceano, ela voltou para a terapia. Não conseguia mais lidar sozinha com o que sentia e, por mais que amigos e família estivessem ao seu lado, precisava de ajuda profissional. Sentia necessidade de desabafar sem medo de julgamentos, sem críticas ou conselhos clichês. Foi em uma pequena sala todas as quartas-feiras, às dezenove horas, que ela conseguiu processar o que sentia. Porém, quanto mais camadas desdobrava dentro de si, mais descobria camadas para lidar. O ódio virou raiva, que virou mágoa, que virou culpa, que virou desespero, que virou desesperança, que virou ódio, que virou luto. Nico enviou inúmeras mensagens pedindo para conversar e ela escolheu não responder. Quando a última chegou dizendo que não a incomodaria mais, Ari não sentiu o alívio que esperava. Leu a mensagem deitada em sua cama, de onde só saia para cumprir suas obrigações em modo automático. Estava a poucos meses de terminar a faculdade, não podia se dar ao luxo de ficar paralisada.
— Ari? — chamou Leti, entrando em seu quarto e vendo-a derramar mais lágrimas em silêncio. — Mais uma mensagem?
— A última — disse ela, baixinho. — Eu não sei como devo me sentir. E se me arrepender depois de não responder? E se me arrepender de responder?
Ela desligou o celular e enfiou o rosto no travesseiro, chorando mais uma vez.
— Eu não posso fazer essa escolha por você — Leti acarinhou a cabeça dela calmamente. — O Nico fez a escolha dele, pode estar arrependido agora, mas você consegue perdoá-lo e esquecer? Porque é isso, depois de perdoar não é justo ficar relembrando a história.
— Não, eu não consigo fazer isso agora — Ari virou a cabeça de lado e olhou para a irmã. — Eu não conseguiria olhar para ele sem lembrar daquelas palavras, não consigo parar de pensar que ele me descartou, me sinto tão pequena... e será que é sincero o arrependimento? Ou só está assim por sentir culpa? Ou medo de ficar sozinho?
— Ele também me decepcionou e estou bem furiosa, queria era arrancar as bolas dele e pendurar na janela como exemplo para quem pensar em fazer você sofrer no futuro — bufou Leti.
— Ah, Leti — Ari segurou a mão dela e soltou um sorriso tristonho. — O que seria de mim sem você ao meu lado?
Leti sorriu e deitou na cama abraçando a irmã mais nova. Queria poder protegê-la das dores do mundo, mas sabia que era impossível. Tudo que podia fazer era estar ao lado dela. Ari acreditava que Nico realmente tinha razão, que ela seria um empecilho em sua vida e na jornada em busca dos seus sonhos, principalmente quando pesquisava sobre a banda e via os shows marcados. Nas redes sociais pareciam levar uma vida agitada, mesmo sabendo que isso não queria dizer muita coisa. Afinal, sempre entendeu que as redes só mostravam o que há de melhor, escondendo as angústias e sofrimentos. Com o tempo se convenceu que era assim que deveria ser e que precisava seguir por outros caminhos, não queria nunca mais passar por aquela dor novamente.
Quando abria o Stargram antes de dormir e via o perfil de Nico, sentia que ele a respondia também colocando trechos de músicas na legenda das fotos. No meio de postagens de ensaio, shows, algumas se destacavam e ela não sabia se era cena ou se era real. Uma delas era de Nico de olhos fechados, passando a mão no cabelo e com o dorso da mesma machucado. Na legenda, um trecho da música Pictures of You, do The Cure, que fez o seu coração doer: If only I'd thought of the right words... I could have hold on to your heart (se ao menos eu tivesse pensado nas palavras certas, eu poderia ter me agarrado ao seu coração).
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Escute Antes de Partir [Completa!]
Romantik🏅 Finalista do Prêmio Watts 2023, let's rock! 🏅 Nico tem talento para a música e para tomar decisões ruins. A pior de todas foi terminar com Ari em Curitiba antes de ir para São Paulo com a sua banda de indie rock. Tentou reverter a situação, mas...