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~ Dois dias depois ~

Já tem dois dias que não como, não durmo e tô vivendo na base de calmante. Já procuramos em todas as delegacias, hospitais, IML 's e nada de Felipe. O celular só dá desligado, ninguém tem notícias. Não posso entrar no Salgueiro pra procurar, nem ninguém da família. Não sei mais o que fazer, me encontro totalmente perdida. Eu pedi tanto pra ele não ir, implorei pra irmos embora. A ganância mata! Eu aprendi isso da pior forma.

Acho que se não fosse minha mãe ali comigo o tempo todo, eu já teria feito alguma besteira. Ela tá sendo essencial pra mim nesse momento. Até no IML reconhecer corpo, ela já foi. Minha sogra está tentando vir para o Rio com as crianças, mas tá foda também. Agora eu tô aqui, mais um dia largada sem consegui fazer nada. Não tenho forças pra levantar, mas todos os dias tô nos hospitais e IML 's, daqui e de Niterói. Não descanso até achar! Pelo menos o corpo eu tenho que enterrar.

Big: Quer comer?-Sentou no sofá e eu neguei com a cabeça-Você tem que comer, Laiane.

Laiane: Tô sem fome-Disse, e o telefone tocou.

Big: Eu atendo-Levantou e atendeu-Alô? Oi, Tia. Tá aqui... Onde? Tá bom. Vou avisar ela. Tá... Beijo-Desligou, e sentou de novo. Eu tava deitada, mas já fiquei sentada.

Laiane: O que foi?

Big: Tua mãe ligou agora pra dizer que tem uma colega que trabalha num hospital lá em Niterói, né?-Meu coração já começou a acelerar-Ela disse que chegou um corpo lá, e aparentemente, é ele. Só que alguém tem que ir reconhecer.

Laiane: Onde?-Levantei e nem esperei ele responder, já subi correndo. Entrei pro banheiro, lavei o rosto e prendi o cabelo. Fui pro quarto, botei uma calça jeans e uma blusa qualquer. Botei um casaco e peguei minha bolsa.

Big: Calma, Laiane! Tua mãe tá vindo, ela vai com você. Espera ela chegar!

Laiane: Eu não vou esperar, Alan.

Big: Ela tá vindo, cara. Ela já tava no caminho quando ligou.

Laiane: Que horas são?

Big: 11h20-Disse olhando para o relógio, e me olhou-Espera ela chegar-Assenti, e sentei na cama. Eu tô desesperada por respostas. Sejam boas ou ruins.

Cheguei no hospital com a minha mãe, e lá fui informada que o tal que chegou não estava morto. O mesmo foi encontrado na beira da estrada, literalmente destruído, mas respirando bem fraco. Tem quase 48h que esse rapaz foi encontrado e é bem o tempo que ele tá desaparecido. O pior é que eu vim nesse hospital, e ninguém falou nada sobre.

Hoje ele se encontra em coma, com quase todos os ossos do corpo quebrados. O rosto está irreconhecível. O mesmo passou por uma cirurgia pra retirada de uma bala no peito e, segundo os médicos, é um milagre ele estar vivo. Os médicos disseram também que se for meu marido mesmo, é pra eu ir me preparando pois ele não volta a vida normal nem tão cedo. Vai ficar um bom tempo como um vegetal. Agora eu tô aqui, esperando a enfermeira pra me levar até o leito onde esse moço tá. Seja lá quem for ele, tá sendo muito forte!

Mara: Tá preparada?-Disse ao ver a enfermeira vindo, e eu assenti-Não prefere que eu vá?

Laiane: Ele tá irreconhecível, mãe. Mas se for, só eu vou saber indentificar. Mara: Não se desespera, tá?-Assenti, e fui com a enfermeira.

Na porta do quarto que ele estava, ela começou a me acalmar da forma que conseguia. Entramos e quando eu vi aquele cara totalmente destruído naquela maca, eu já comecei a tremer. Nunca vi algo parecido antes! E mesmo bem apavorada, eu tentava manter a calma.

Laiane: Pode chegar perto?-Falei baixo, e ela assentiu. Cabeça enfaixada, rosto destruído, cheio de gesso pelo corpo. Ferro nas pernas e apagado, só os aparelhos o mantinham ali. Me aproximei e fiquei procurando algum detalhe que fosse do Felipe, mas não conseguia achar um. Tava muito difícil. Levantei um pouco o lençol que o cobria, e vi a manchinha na coxa esquerda. Eu só abaixei a cabeça e comecei a chorar.

Enfermeira: É seu marido?-Assenti. Fiz um carinho na mão dele, que estava cheia de queimaduras de cigarro.

Laiane: Eu pedi tanto pra você não ir, cara. Não deixa a gente não, pretinho. Henrique e Sosô tão te esperando em casa, poxa. Acorda, Lipe. Por favor!-Falei chorando muito. Minha mãe pediu, mas acabei me desesperando. É impossível não se desesperar vendo meu marido nessa situação. Uma coisa que podia ter sido evitada.

(três semanas depois)

Conseguimos transferir Felipe pra um hospital particular! Hospital público é uma desgraça, Deus me livre.

Tia Marisa conseguiu vir com as crianças e eu chorei tanto agarrada com meu filho. Sophia toda hora diz que quer ver o pai, tadinha. Como a gente tá se revezando pra ficar no hospital, tivemos que mandar ela pra outra avó.

Nesse exato momento, eu tô aqui no hospital com ele. Seu rosto ainda está bem machucado, mas já desinchou bastante. Essa noite eu sonhei com ele, sabe? Tava com Henrique, brincando, tão bem. Como eu queria que fosse verdade. Mas vai ser! Eu tenho muita fé de que ele vai sair daqui bem. Confesso que nos primeiros dias eu tava desacreditada, e já estava me preparando pra enterra-lo a qualquer momento. Mas hoje eu tô firme, tenho muita esperança de ver ele fora daqui ainda.

No começo, os médicos disseram que as chances dele eram mínimas e que ele ia ter muitas sequelas. Porra, foi porrada pra caralho que ele ganhou. Agora ele já deu uma melhorada significativa. O médico dos médicos tá lá em cima, e eu sei que ele não vai permitir que eu passe por mais essa dor. Eu tô muito, mas muito apegada a Deus nesses últimos dias. Que eu precisava dele, eu já sabia. Eu só não imaginava que era tanto assim. Mas é aquele ditado: se não vier por amor, vem pela dor.

Laiane: Pode ir, tia. Eu vou ficar-Disse, pela milésima vez. Tia Marisa não quer sair do hospital por nada, e eu entendo. Filho único, né?

Marisa: Eu vou porque tô muito cansada, filha. Mas qualquer coisa, tu jura que vai me ligar?

Laiane: Ligo sim.

Marisa: Então, tá-Disse, e nos despedimos. Marisa saiu, e eu fiquei com meu pretin.

Fiquei atualizando minhas redes sociais, e conversando com Alan e Grazi no whatsapp por um tempo. Depois deixei o celular de lado, e fiquei pertinho do meu nego.

Laiane: Será que tu tá me ouvindo?-Falei baixinho, e peguei sua mão-Sonhei que você tava brincando com Henrique lá em em casa, preto. Melhora logo. Tá todo mundo esperando você voltar pra casa, sabia?-Senti perfeitamente Felipe apertando levemente minha mão e tomei um susto.

Ele estava chorando de olhos fechados, e eu nem sabia que isso era possível. Chorei juntinho.

LAIANEOnde histórias criam vida. Descubra agora