O que não te contam

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Engfa entrou no apartamento que dividia com Tina com um suspiro pesado, conforme era recebida por um par de olhos negros cheios de preocupação.

– P'fa! – a tailandesa se levantou no mesmo momento, indo enrolar os braços ao redor de Engfa, esfregando suas costas numa tentativa de confortá-la. – Sinto tanto...

– Eu estou bem. – Engfa garantiu, e ela realmente queria dizer isso.

Tudo estava passando como um grande borrão em sua mente, um vazio que ela escolheu acolher, ao invés de tentar escapar dele. Era melhor assim.

Ela sentiu a presença de Charlotte às suas costas no momento em que a garota entrou também, seu corpo enrijecendo com antecipação ao pensar que ela a tocaria, o calor de uma mão fantasma circundando a linha de sua coluna. No fim, não ouve toque algum. E passando por ela em silêncio, Charlotte foi até o sofá se sentar com Marima e Heidi, esta encarando as próprias mãos em concentração. Engfa quase podia ver as engrenagens se movendo dentro da cabeça da amiga, tentando prever cada problema que elas enfrentariam dali em diante, buscando soluções para evitar que aquele fosse o fim. Devia ser um peso tão grande quanto o que ela sentia por colocá-la naquela posição.

Nudee entrou pouco tempo depois, completando o que um dia foi a formação original daquele grupo de garotas tão incomuns. Deus... Quanto já havia acontecido para elas em pouco menos de quatro anos e mesmo assim, não havia ninguém além daquelas cinco garotas em quem Engfa poderia confiar mais. E por isso era tão difícil.

Vendo aqueles rostos tão familiares, ela finalmente entendeu a profundidade de seu egoísmo. O que Charlotte e ela haviam provocado...

O gerente das garotas finalmente chegou, já pronto para iniciar seu interrogatório. Porque foi exatamente o que foi.

E ainda que poucas perguntas tenham sido feitas às duas garotas - naquele momento, sentadas em cantos opostos da sala - foi o bastante para deixar Engfa desconfortável sob o olhar de suas amigas.

"O beijo realmente aconteceu?"

Sim.

"É uma ocorrência frequente?"

Sim.

"Há quanto tempo isso acontece?"

Dois meses e duas semanas desde que Engfa beijou Charlotte naquela manhã em seu quarto.

Três semanas e cinco dias desde que Charlotte se confessara a ela.

Para o gerente, apenas um 'há algum tempo' foi dito.

"Vocês pretendem levar isso adiante, ou há alguma chance de que seja... momentâneo?"

Engfa ficou em silêncio para esta, sem ter certeza do que realmente dizer a ele. Charlotte, porém, parecia ter uma resposta na ponta da língua.

– Isso é algo que nós duas devemos decidir sozinhas. – ela falou calmamente. – Sentimos muito por causar problemas, mas são as nossas vidas. Não estamos abrindo mão da privacidade das nossas escolhas.

Engfa estava tendo dificuldades para entender Charlotte, o olhar obstinado da garota não ajudando em nada sobre sua confusão, mas ela não se deixaria levar tão facilmente por palavras carregadas de confiança e olhares enganosos. Porque, diabos, Charlotte de repente a estava olhando com um fervor bastante inesperado.

– Vocês devem ter em mente que decisões como esta podem prejudicar não somente vocês duas, mas todo o grupo, e também a empresa.

O tom do gerente era neutro, não transmitindo nada do que quer que ele estivesse pensando de toda aquela situação, mas Engfa sabia que seu trabalho se resumia em somente cuidar de sua imagem, mantendo-a tão imaculada quanto fosse possível, não importando seus próprios julgamentos e opiniões.

Patos e AmassosOnde histórias criam vida. Descubra agora