Provocações

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Charlie rolava no chão de rir enquanto Abby me xingava de todos os nomes possíveis pelo telefone.

O banho de sangue na corte foi noticiado por nossos meios de comunicação internos, lá eles ovacionaram meu pai e todos os membros da corte por terem tomado uma atitude, e ainda bem, os nomes de baixas não ocupou nem meia página, sendo a outra metade da página para uma breve homenagem.

E fielmente, meia hora depois de termos recebido nossa revista em casa, como em todas as manhãs, Abby me ligou.

Estava irada porque sabia que se meu pai estava incluso, eu também estava. E desde que ela começou a gritar, eu só olhava assustada para o telefone que eu havia pousado na cama e deixado no viva voz, porque se estivesse no meu ouvido teria me deixado surda nos primeiros trinta segundos.

— Não se faz de sonsa, eu sei que ta ai! — eu podia enxergá-la andando de um lado para o outro.

— Eu... oi — disse constrangida, chegando mais perto do celular.

— OI? — ela gritou de volta e Charlie voltou a gargalhar silenciosamente.

— É ótimo saber que está feliz porque estou viva — fui irônica para tentar amansar a fera.

Abby suspirou.

— Estou tremendamente aliviada por estar bem, mas puta que pariu — um segundo de silêncio — custava ter falado?

— Custava, todos vocês iriam querer ir e...

— É CLARO QUE IRÍAMOS.

— EXATAMENTE! — rebati, respirando fundo depois — estariam na lista da segunda página e eu não conseguiria conviver com isso.

— Ridícula — Abby disse rindo e eu acabei sorrindo, me deitando ao lado do celular — e o Charlie, seus pais? Todo mundo bem?

— Sim — Charlie respondeu por mim.

— Você é maluco de enfiar a Emily nisso? — o tom dela mudou de volta e eu ri.

— Acabou de brigar comigo porque queria ir, e agora vai brigar com ele porque eu fui?

— Claro, nunca disse que seria coerente, então espere tudo menos isso — sorri de volta ao ver a cara confusa de Charlie.

Apesar dos vários dias almoçando e ficando na presença de Abby, sentia que ele não estava acostumado com ela ainda.

— Conto tudo para vocês quando as aulas voltarem — garanti.

— É o mínimo que poderia fazer — ela ainda parecia irritadinha e eu revirei os olhos com isso.

Desliguei o celular e Charlie deu uma risadinha contida.

— Eu achava que você era maluca, mas acho que Abby é pior.

— Abby é a pior de todas, sem sombra de dúvidas — eu disse séria e Charlie sorriu — depois vem Sarah, Kate e eu.

— A Sarah eu concordo, mas a Kate é tão tranquila.

Eu sabia que sim, mas me colocar como a mais normal das quatro era quase um consolo.

Virei de lado na cama e olhei Charlie de perto. Estava ansiosa por aquelas férias, ficar com meus pais e não me preocupar com a escola, mas agora o que eu mais queria era que aquele verão passasse voando para eu voltar. Sentia que lá eu ficaria mais informada dos acontecimentos do que em casa, já que meu pai não me instigaria contando tudo que sabia, se é que ficaria ciente pela corte das providências tomadas a partir daquele momento sobre o caso.

Meu pai tinha ido trabalhar há algum tempo e minha mãe também havia saído para uma reunião de professores, provavelmente para discutir o envolvimento de Nancy em tudo. Nem me preocupei em perguntar demais porque eles não me responderiam, então, com a casa vazia, havia acordado com um Charlie sem camisa me trazendo iogurte de melancia com granola, e a revista de informativos da corte.

(Sem) Medo - IIOnde histórias criam vida. Descubra agora