O fim das férias veio sem mais incidentes, ou pelo menos, Celine não percebeu nada de estranho além do excelente bom humor de Carine. Mesmo não sabendo a razão da mudança de comportamento de sua mãe, a menina, que sempre tinha seu coração ansiando por atenção e carinho, apenas aceitou.
Assim, até mesmo um passeio pelo bairro com um piquenique na praça foi possível. A energia e o ânimo dela melhoraram muito com isso, e logo que as aulas começaram, sua ansiedade pilhou-a mais ainda, pela vontade que sentia de reencontrar Lucca.
Manteve esse sentimento no mais completo segredo, fingindo nem conhecer esse nome quando a mãe tocava nele.
Já era o primeiro dia de aula após as férias, e ela havia chego cedo para logo escolher uma carteira que fosse perto da janela, onde seus pensamentos poderiam voar para fora dali. Sentou-se na mesma que era sua no semestre passado. Organizou tudo como sempre, com a mochila nas costas da cadeira, os materiais na prateleira sob a mesa, e a cadeira da mesa, empurrou para o lado.
Depois esperou. Conforme os minutos se passavam, os "colegas" iam entrando, e percebeu assim, que os mesmos rostos estavam em sua sala. Pelo menos, agora todos fingiam não vê-la, e ela assim também fazia, reinando uma estranha paz. Continuou observando-os, e antes que ela desse por conta, o sinal havia tocado.
No entanto, Lucca não apareceu na sala. Celine teve um péssimo pressentimento sobre isso, mas se manteve em silêncio onde estava.
A primeira aula era biologia, estudo de botânica, matéria que gostava muito, apesar de matar todas as plantas que tentava cultivar. Ela se focou nas palavras da professora nova, demonstrando interesse, mas se distraiu ao sentir que alguém a observava.
O período continuou com geografia, matemática e literatura. Alguns professores eram novos, o que a deixavam ainda mais animada pela possibilidade de ser escolhida para participar de algum grupo de aprofundamento. Esses grupos normalmente faziam projetos e se apresentavam em feiras de ciência fora da cidade. Celine não gostava de estudar, mas se pudesse entrar em um grupo para ficar mais tempo fora de casa, ela o faria.
E pensando tanto nessa possibilidade, divagou seus olhos pelos rostos que estavam em sua classe, notando a expressão de tédio em cada um. Foi quando encontrou quem a observava. Os olhos castanhos focavam em sua imagem de forma firme, e não desviaram dos dela quando ela o percebeu. Era Otto.
Também não desviou o olhar, pois ele parecia querer dizer algo. O rapaz fez um gesto com as mãos dando a entender que queria falar com ela depois da aula. "Mas o que ele quer falar comigo? Aquele garoto é estranho... naquele dia não terminou a conversa e só sumiu. Agora quer falar?"
Mesmo não sabendo o porquê daquilo, acenou com a cabeça, e depois voltou para a matéria. A professora tinha uma fala enfadonha, e sua voz lembrava a de um papagaio de óculos. Por isso, mesmo que tentasse muito se concentrar, seus pensamentos fugiram dali, e a levaram para aquele dia, em que ela o viu daquele jeito.
"Como não percebi isso antes?" Se perguntou olhando-o de canto. O rapaz sempre usava roupas longas, tapando os braços e as pernas, provavelmente para esconder as marcas de machucados. Ela mesma já tinha usado essa estratégia, quando menor, e mais ingênua. "De certa forma, ele é como eu..." O pensamento inconsciente ficou reverberando a procura de sua atenção. Mas a garota fingiu estar tudo bem.
A aula terminou como sempre, com os alunos procurando fugir do professor colocando os materiais na mochila o mais rápido possível. Celine estava guardando seus materiais quando percebeu ele ao seu lado. Seu rosto era indecifrável, assim como o seu. Inexpressivo. Enquanto os olhos, um poço profundo de escuridão.
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Boneca de Porcelana
Mystery / ThrillerCelina, como toda garota de 16 anos, quer poder sair, se divertir com os amigos, e quem sabe, ter um relacionamento. Todavia, seu corpo parece não colaborar, pois sempre que começa a fazer vínculos, sua saúde piora, e ela passa a ter que ficar reclu...