Capítulo 3: dias delicados

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— Certo pessoal, agora eu quero que vocês olhem essa questão aqui. Com qual fórmula eu posso resolvê-la? — Perguntou a professora de física enquanto olhava a sala, esperando que alguma boa alma respondesse a questão.

— Dá pra gente usar a fórmula do momento linear. — Respondeu alguém que estava sentado mais a frente na turma.

— Correto Fiorella, muito bem, como essa questão não tem plano inclinado, podemos usar essa fórmula sim. Mais alguém chegou à mesma conclusão? — Perguntou novamente olhando todos na turma.

Porém não obteve resposta. Haviam mais algumas pessoas na sala que poderiam responder a pergunta, mas faltava coragem para dizê-la em voz alta, e entre essas pessoas estava Celine que contemplava os seus cadarços desamarrados em seus pés. Acontece que de manhã foi tudo tão corrido, que ela não teve tempo de pedir à sua mãe para amarrá-los, e como Carine mesmo falava: "pra quê amarrar? Você não consegue andar mesmo."

Era verdade o que ela falava, mas mesmo assim, não precisava falar daquele jeito.

Enquanto olhava seus pés com os cadarços soltos, se lembrava de uma época em que não precisava usar cadeira de rodas, um tempo em que ainda tinha saúde para caminhar sozinha e brincar como uma criança qualquer. Quando tudo começou a mudar? Ela não sabia dizer ao certo, mas ao pensar nesse assunto, sempre tinha um estranhos sentimento de insegurança.

A aula chata continuou com a monotonia da sala inteira quase dormindo, enquanto ela apenas se concentrava em olhar a paisagem lá fora. O dia estava escuro, por isso conseguia ver seu reflexo no vidro da janela. Seu rosto pequeno com grandes olhos lânguidos e boca pequena, lhe davam uma aparência bela, porém com uma sensação melancólica, que não saía mesmo ao sorrir.

Tinha os cabelos loiros escuros, quase castanhos, e olhos azuis do tom do profundo mar. Suas madeixas desciam da cabeça, caindo em seu colo devido ao comprimento do corte, e eram acompanhados por uma franja em seu rosto. Para completar, sua pele era clara como a neve, em um tom que já parecia sem saúde. Não era a toa que em alguns lugares seu apelido era boneca de porcelana, pois se assemelhava a uma. Mas essa forma de se referir a ela, em nada a agradava.

Pois uma boneca não pode viver.

Porém, ao se observar, notou que outra pessoa a olhava.

No reflexo da janela, aquele mesmo jovem que havia ido a sua casa, para entregar as tarefas no dia anterior, a olhava. Não tinha notado que ela o descobrira, por isso, continuou olhando em sua direção. "Mas porque ele olha para mim?" Se perguntava ela. "Talvez não esteja olhando para mim, e sim para a janela." E para testar isso, virou o rosto, fazendo seus olhos encontrarem os dele, o que o fez corar subitamente e desviar os olhos em outra direção. Ela ficou sem entender aquilo.

Contudo, foi quando a aula terminou que ela pode perceber que realmente, era para ela que ele olhava, pois foi só o sinal tocar que o jovem foi em sua direção. Sem se importar com os diversos olhares estranhos que recebia, ele foi até sua carteira, parando ao seu lado.

— Oi, sou eu de novo. — Disse confiante, porém com a voz trêmula.

— Oi. — Respondeu Celine sem saber o que acontecia.

— Você quer ajuda para ir até o seu carro?

— Como sabe que eu vim de carro? — Perguntou desconfiada.

— Te vi quando chegou na escola.

Ela achou aquilo estranho, mas como viu que a situação era observada por diversos alunos, e inclusive a professora, resolveu dar uma de sociável e aceitou a ajuda. Não gostava muito de ser empurrada na cadeira, porque isso a fazia se sentir ainda mais como uma pessoa incapaz, mas estranhamente, aquela pessoa não a deixava se sentir assim.

Boneca de PorcelanaOnde histórias criam vida. Descubra agora