Todos os meus sonhos

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2011

Maeder-Quint-Tiberi Funeral Home 

Setembro,16 

Sexta-feira

Gwen, Natalie e Darlene (Quem decidiu se juntar a nós depois da notícia), levaram cerca de três dias pra resolver a documentação, o local, avisar familiares e contatar o advogado. Odette Cavendish faleceu de morte súbita pós uma cirurgia de revascularização do miocárdio bem sucedida, exatamente ás 21:30 do dia 9 em uma sexta-feira de setembro.

Exatamente hoje completando uma semana de sua morte estamos todos envoltos de um mar de roupas pretas, alguns conversando ao longe, outros chorando mais perto e então temos Tyler,Natalie, Gwen e seus maridos ao nosso lado observando o rosto sereno sem vida no caixão. Darlene se manteve o mais distante possível e nós demos graças a isso, ela não merece estar nem no mesmo ambiente que suas irmãs essa insensível! Muitos dos presentes eram rostos conhecidos por mim no prédio, como Joe e Jay, Kevin do terceiro andar e até mesmo Lucien Harden com quem Odette dividia muitas tardes tricotando e falando mal dos outros enquanto eu estava no trabalho.

Com dor em meu coração deixei que Tyler distraísse mamãe e o Tio Gustavi com um grupo dos Cavendish pra que eu pudesse pegar um ar, foi só quando escapei para o sol quente e senti o vento gelado em meu rosto que eu pude respirar normalmente, sortudos aqueles que estacionaram na sombra. De forma oportuna, do lado da funerária no mesmo terreno está Village Cigars, uma charutaria que me fez soltar uma risada sem graça realmente e eu realmente comecei a caminhar em direção a loja em um impulso.

— Violet? Como vai comprar isso sem sua carteira?

Virei rapidamente, fazendo o vestido preto comprido girar a minha volta, Tio Paul piscou levantando a mão pra mostrar uma nota de cinquenta. Ele me acompanhou até la dentro em silencio deixando que eu pegasse duas carteiras de cigarro e um isqueiro, pagou por tudo deixando o troco de dez dólares no pote de gorjetas para a sorridente atendente.

— Sabe, eu não fumava desde que terminei a faculdade.— Comentei distraída depois de uns tragos, o som saindo esquisito talvez por eu não ter dito nada tem um tempo ou pelo choro de ontem a noite e hoje pela manhã antes de vir.

— Eu sei, Mas não pode se agarrar a esse vício toda vez que alguma coisa ruim acontece. — Me guiou para o outro lado da funerária onde coincidentemente tem duas cadeiras de madeira livres.

— Estou de luto, posso me agarrar ao que estiver no meu alcance por um tempo indeterminado.— Brinquei tirando alguns fios de cabelo do rosto com a mão livre.

— Odette sempre estará com você, querida. — Começou suavemente, seu jeito estranhamente conspiratório tomou conta me deixando atenta. — Não só em seu coração, não só em suas memórias, ela sempre cuidará de você não importa onde estiver pelo encontro de almas. Eu disse que iria acontecer coisas das quais você não vai gostar mas tudo tem um propósito, prometo de que é só acreditar um pouquinho mais nisso.  

Desacreditada, um pouco enjoada e nervosa pensei um pouco antes de tragar mais uma vez.

— Tio, quão babaca eu seria se não ficasse para o enterro depois? Sinto que não tenho mais estomago pra mais uma situação como essa. 

— Quer que eu peça a Tyler pra te levar? Gerth e Gus podem aguentar a onda de Natalie e Gwen as deixando longe de Darlene.— Neguei jogando a bituca a nossa frente e pisando em cima.— Vou entrar, te vejo no jantar ou vai se esconder do mundo?

— Não seja melodramático, sequer posso me esconder de uma mosca e tenho certeza de que o animal é menos insistente que todos vocês.— Resmungo aproveitando do fato dele já estar um pouco mais longe.

Encostei na cadeira decidindo acender outro cigarro sem motivo aparente, um pensamento de que Odette me faria engolir o cigarro me fez sorrir de verdade para o nada. Passei mais um tempo apreciando o vento e o barulho de carros que vez ou outra saiam até que um movimento estranho atraiu meus olhos para o lado. Um senhor com vestes estranhas, um chapéu de pescador desgastado sob os cabelos grisalhos, e apesar de não ser uma pessoa analista, ele tem uma aura pesada.

— Esta precisando de algo, senhor?— Ofereci sem pensar muito.

— Apague o cigarro,Violet Denver. — Falou com dureza cruzando os braços, no susto eu apenas joguei pra cima dele e de algum jeito o meu cigarro aceso foi desviado, levantei com a sacolinha em mãos  tentando não sair correndo.

— Caralho..Eu te conheço?!— Questionei assustada tentando não gaguejar.

— Oh, não seja boca suja.— Repreendeu incrivelmente calmo. — Você já ouviu sobre mim, não se lembra mas sua família é uma das poucas gerações que acredita não só em mim como em todos os deuses.

— O que será que colocaram no cigarro? Eu me lembro da sensação de fumar maconha e não era bem assim! — Reclamei em voz alta olhando em volta pra ver se não apareceria o duende que eu juro que vi na faculdade. O senhor negou com a cabeça como se dissesse que eu estava louca e eu estava de acordo com ele. — Olha só, não é querendo ser mal educada nem nada, mas eu não faço a mínima ideia de quem você seja.

Ele sorriu e seus olhos que eram de um castanho ficaram cobertas por uma nevoa, como se fossem nuvens brancas passando rápidas.

— Hermes, Deus mensageiro e responsável por encaminhar as almas dos mortos até a margem do rio que leva ao submundo. Eu vi você antes quando busquei seu pai e estou aqui novamente pra levar sua..não sei muito sobre o papel que ela empenhava em sua vida mas foi um encontro de almas , ela se recusa a sair daqui até ter certeza de que você está em paz.— Explicou meio impaciente com seus olhos assustadores focados em mim.

— Ótimo, ela pode me levar junto pois acho que serei a próxima a infartar. Ou talvez seja o calmante que tomei antes de vir se juntando com o cigarro batizado.. ou estou completamente maluca? — Comecei a dizer sem ter certeza de onde essa loucura toda saiu então tudo ficou preto.





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